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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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A VIDA DOS LIVROS


de 31 de Outubro a 6 de Novembro 2011

 

«365 Dias com histórias da História de Portugal» de Luís Almeida Martins (Esfera dos Livros, 2011) é um livro de grande utilidade para todas as idades, uma vez que, num registo muito acessível, mas com grande rigor em relação aos factos históricos, procede à apresentação de múltiplos episódios da História portuguesa, desmistificando alguns, esclarecendo outros e informando sobre todos, em termos que permitem preencher lacunas que tantas vezes encontramos, da parte de muitos dos que têm a responsabilidade de conhecer os factos e os elementos mais importantes da nossa historiografia. Longe da simplificação, encontramos uma genuína preocupação de informação e de conhecimento. A obra é assim um auxiliar precioso, que deve estar à mão de todos, para esclarecer muitas dúvidas e erros tantas vezes ditados por uma injustificada ignorância.


A Primeira tarde portuguesa (24 de junho de 1128), por Acácio Lino.

 

FACTOS DISTANTES E DESCONHECIDOS
O método proposto pela editora ao autor foi o de percorrer todos os dias do ano, escolhendo para cada um deles um facto histórico, analisado sucintamente, com base nos dados conhecidos da historiografia coeva, sem cedências ao efeito fácil, às referências fantasiosas ou a qualquer tipo de sectarismo. De um modo aleatório, escolhemos vinte cinco exemplos, para demonstrar o procedimento de Luís Almeida Martins, jornalista experimentado, que nesta obra demonstra as suas qualidades de probidade e isenção. As histórias seguem uma classificação temática: Factos & Episódios; Figuras & Figurões; Guerras & Batalhas; Revoluções & Conspirações; Amores, Traições & Infidelidades; Mitos, Lendas & Mistérios e Artes & Letras – o que nos ajuda na tarefa de identificar os problemas suscitados, que propositadamente, são tratados de um modo simplificado – o que se justifica a fim de ir ao encontro daqueles que são menos versados nas matérias. Afinal, não se trata de uma enciclopédia, mas de uma obra exigente de divulgação. Comecemos pela figura de Viriato, sobre a qual há muitas lendas, mas há pouco conhecimento histórico. Não existem provas seguras da sua ligação a Viseu e à Serra da Estrela, os Montes Hermínios. Permanece uma figura misteriosa, e, como afirmou Alexandre Herculano, é difícil estabelecê-lo como nosso antepassado, ligando diretamente a Lusitânia a Portugal, como desejaram os nossos renascentistas. Por outro lado, dando um salto no tempo, o Conde D. Henrique, nobre cruzado vindo de Borgonha, dificilmente terá pensado tornar o Condado Portucalense independente do Reino de Leão. No entanto, as circunstâncias levariam nesse sentido, até pelo seu efetivo contributo. E D. Teresa, sua mulher e mãe do nosso primeiro Rei? O certo é que a Batalha de S. Mamede (24.6.1128), primeira tarde portuguesa, tem causas complexas ligadas à política galega e à influência dos Peres de Trava junto da viúva de D. Henrique, e está longe da verdade o conflito freudiano entre mãe e filho. Aliás, o próprio D. Afonso Henriques ainda é um grande desconhecido – devendo, por exemplo dizer-se que a lendária batalha de Ourique (cujo milagre foi contestado por Herculano) inspirou-se na batalha da Ponte Mílvio entre Constantino e Maxêncio (313).

 

O PREÇO DA CELEBRIDADE
Fernando Martins de Bulhões formou-se na Escola de Santa Cruz de Coimbra, na ordem dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, terminaria os seus dias chamado para a Ordem dos frades menores, por S. Francisco de Assis, pelos seus conhecimentos teológicos onde ganhou popularidade excecional, pelo carisma e fama de taumaturgo, no entanto é sobretudo conhecido como Santo António de Pádua. O preço da celebridade é o de ser conhecido não pelo país de onde era originário, mas pela cidade onde morreu. Com D. Afonso III consumou-se a reconquista cristã do Algarve, mas o reconhecimento desse feito por Afonso X de Leão e Castela foi difícil. O milagre das rosas da nossa Rainha Santa Isabel não foi um episódio passado com ela, mas sim com uma sua antepassada, a Rainha Isabel da Hungria, casada com Luís da Turíngia. A batalha de Aljubarrota, de 14 de Agosto de 1385, foi decisiva para a causa do Mestre de Avis, e no entanto apenas durou cerca de uma hora. D. Pedro, filho de D. João I, dito das Sete Partidas, foi precursor do turismo moderno, tendo trazido para a corte portuguesa o Livro de Marco Polo e o mapa de Fra Mauro, que abriram novos mundos ao mundo. João XXI, Pedro Hispano, filósofo e médico, foi o Papa de origem portuguesa que costuma ser referido (1276-77), no entanto Dâmaso I (366-384) foi também Sumo Pontífice (366-384), sendo natural de Guimarães ou de Castelo Branco. D. Afonso V aspirou à coroa de Castela, por isso se feriu a Batalha de Toro, na qual foi derrotado; no entanto, se o resultado da batalha tivesse sido outro a história peninsular teria sido bem diferente. Os arquipélagos da Madeira e dos Açores há muito que eram conhecidos pelos navegadores do Mediterrâneo antes do seu povoamento, tudo levando a querer que as ilhas dos Açores devem essa designação ao facto de serem conhecidas dos genoveses como Azzurri, ou seja, azuis. Não foi Pedro Álvares Cabral o descobridor efetivo do Brasil, mas sim ou João Coelho (1492) ou Duarte Pacheco Pereira, o grande negociador de Tordesilhas. Há poucas certezas sobre quem foi Cristóvão Colombo, no entanto o mistério persistirá, sem do certo que foi genro de Bartolomeu Perestrelo e com ele ganho experiência como navegador. Arnold Toynbee, o historiador britânico, afirmou com muita clareza ter sido Vasco da Gama o iniciador do que hoje designamos como Era contemporânea da globalização.

 

ESTRANHOS E CURIOSOS PARADOXOS
Ironicamente, dá-se o cognome de Vitorioso ao mais derrotado rei da nossa História, D. Afonso VI, em virtude da morosa e difícil guerra da Restauração. Vinda da culta corte portuguesa de D. João IV, D. Catarina de Bragança, mulher de Carlos II, tornou-se em Inglaterra responsável decisiva por esse país se ter tornado uma potência civilizada. A introdução do chá é uma boa metáfora… De 1511 a 1641, Malaca foi a cidade que se tornou a placa giratória do comércio da Ásia, graças à presença portuguesa e ao impulso de Afonso de Albuquerque. O poema épico «Caramuru» conta como Diogo Álvares, de Viana do Castelo, se tornou um ídolo dos índios, a ponto de virar um verdadeiro mito de toda a história brasileira. Regressando ao lado de cá do Atlântico, o terramoto de 1 de novembro de 1755 deve considerar que houve dois fenómenos que se adicionaram um ao outro: o terramoto propriamente dito e o terramoto político, traduzido na ação de Sebastião José de Carvalho e Melo, o futuro Marquês de Pombal – o País foi reconstruído e o dinheiro do Brasil ajudou. Anos depois da queda do governante, o povo de Lisboa dizia: «mal por mal, antes Pombal». Na prática, Napoleão Bonaparte criou o Brasil, uma vez que a corte no Rio de Janeiro abriu a porta da independência. D. Leonor de Almeida Portugal, a marquesa de Alorna, Alcipe, foi no seu tempo um exemplo de protagonismo feminino e de atenção à modernidade. Afinal, nesse período rico e agitado da vida portuguesa lançaram-se, para o bem e para o mal, as bases do Portugal liberal moderno – entre o despotismo esclarecido e as ideias emancipadoras dos estrangeirados.


A AURA DOS BRAVOS DO MINDELO
A cidade do Porto ganhou na Guerra Civil que opôs D. Miguel a D. Pedro (1828-1834) a designação de invicta, pelo êxito dos liberais ante o cerco dos absolutistas – daí também as referências épicas na toponímia portuense: Rua do Heroísmo, General Torres, Praça da Liberdade… Anos depois, na guerra civil da Patuleia (de «pata ao léu» dos pés frescos), que se segue ao levantamento da Maria da Fonte (1846-1847), o Porto volta a assumir (com José da Silva Passos, irmão de Passos Manuel) um papel decisivo no sentido romântico e liberal, antecipando os movimentos revolucionários europeus que ficaram designados como «Primavera dos Povos» (1848). Por fim, neste rápido sobrevoo, urge lembrar a proclamação da República em 5 de outubro de 1910, que ocorreu na varanda dos Paços do Concelho de Lisboa, uma vez que aí havia uma vereação integralmente republicana eleita legitimamente em 1908. Logo aí, Machado Santos, o herói da Rotunda, não perdoaria ao diretório do Partido Republicano o facto de os seus membros não terem esperado por ele para a proclamação solene do novo regime. Por outro lado, Basílio Teles, um histórico do movimento, declinou o convite para sobraçar a pasta das Finanças, por considerar que não poderia fazer as reformas que almejava, sem ter poderes excecionais que limitassem as liberdades cívicas e políticas.

 

Guilherme d'Oliveira Martins

A VIDA DOS LIVROS


de 24 a 30 de Outubro 2011

 

«Crónica de uma Travessia – A Época de Ai-Dik-Funam» de Luís Cardoso (Dom Quixote, 1997) e «A Nona de Pinto Brás (Novela Timorense)» de Luís Filipe Thomaz (Fundação D. Manuel II, 2010) são duas obras que estiveram nas nossas mãos na recente peregrinação a Timor-Leste. Foram elementos da maior utilidade. Como veremos na crónica que se segue, a terceira sobre a nossa viagem, as duas escritas são marcantes e merecem leitura atenta.

 


Paisagem em Timor

 

DA ILHA DAS FLORES…
Partimos da Ilha das Flores depois de um banho de mar às seis da manhã, sob o sol que despontava. Havia uma leve neblina. Sentimo-nos muito bem perante a simpatia de quem nos acolhia nesta ilha que tanto nos diz. Passamos por Kupang, em Timor Ocidental, e daí vamos para Dili. Na aproximação aérea, Luís Filipe Thomaz vai identificando cada ponto da costa, recordando com humor as suas vivências imaginosas. Chegados com bom tempo, sentimo-nos como que regressados a casa. Continuamos a ser tratados com esmero e depois de um almoço com iguarias portuguesas no «Boca Doce» - desde o bacalhau à carne assada – vamos ao Cemitério de Santa Cruz, onde a 12 de Novembro de 1991 tudo mudou na defesa da independência timorense. As imagens do massacre, salvas graças à inteligência e ao heroísmo de Max Stahl, correram o mundo e permitiram uma onda de solidariedade em torno de uma causa justa. Paramos simbolicamente no lugar onde os filmes foram escondidos. Com o sol a declinar, fizemos o percurso de há vinte anos, até à campa de Sebastião Gomes, o jovem morto na vigília em Motael, que levou as pessoas nesse dia a Santa Cruz. Naquele momento, lembrei-me de Teresa Santa Clara Gomes, grande entusiasta e amiga do povo timorense, que bem gostaríamos pudesse estar connosco. Ruy Cinatti diz-nos: «Quando passo a horas mortas / (passava – de que vale o tempo?...) / ali, à beira das campas, / ouço dizer: Vem, amigo! / O espaço de nada vale! / Ganharás centos por cento! / Vem-nos fazer companhia!».

 

CRÓNICA DE UMA TRAVESSIA
Ao voltar a Timor-Leste, lembramos a sua literatura – e em especial a «Crónica de uma Travessia – A Época de Ai-Dik-Funam» de Luís Cardoso (Dom Quixote, 1997). Se temos falado da «Peregrinação», esta «Travessia» é o caminho da memória de um povo, com uma vida carregada de vicissitudes e incertezas. Quem tem por Timor um especial afeto sabe que, sem ilusões, tem de haver uma forte solidariedade capaz de permitir compreender os erros e as fraquezas e de tirar as lições certas para o futuro. E não podemos esquecer o que Luís Cardoso diz, com especial empenho: «o estudo era a tarefa prioritária para desmistificar a dita maldita de um célebre prelado que dizia que a Timor mais valia picareta que caneta». E aqui estudo é educação e desenvolvimento, é sabedoria a transmitir, é cultura de paz. E recordamos os tempos imemoriais do ciclo agrícola, quando lemos, de Luís Filipe Thomaz, «A Nona de Pinto Brás (Novela Timorense)»: «Quando a chuva cessava e o capim se tornava amarelo nas faldas das montanhas, segava-se o milho e o arroz; quando as noites se tornavam mornas, a anunciar o recomeçar das chuvas, queimava-se a terra para preparar a sementeira, e punha-se em torno da horta um pagar, para evitar que os animais à solta roessem os rebentos. Depois, quando a chuva começava a cair regularmente das duas às quatro da tarde em cada dia, levavam-se os búfalos a pisar a várzea e lançava-se à terra o néli – até que finalmente a chuva voltava a cessar, as faldas da montanha trocavam o seu verde de esmeralda por uma tonalidade fulva ou violácea, e se podia, uma vez mais, segar o milho e o arroz».

 

ATÉ BAUCAU…
No dia seguinte, com estes ecos na lembrança, vivemos uma longa jornada por estrada de Dili a Baucau. Foi uma aventurosa viagem em jeeps, com vários sobressaltos. Primeiro, a paisagem xistosa, depois, a calcaria; primeiro, o verde e depois, o amarelo, até Manatuto a pequena propriedade e o regadio, depois a estepe seca. E lá está o Ili Manu, onde velam as almas dos antepassados. O mar tornou-se azul, com o esplendor do sol. É Timor-Leste na sua pujança: acolhedor e agreste, intenso e doce. Até os mangais conseguem o milagre de medrarem em água salgada, com apenas umas parcas horas de água-doce. Chegamos a Baucau uma hora depois do previsto. D. Basílio do Nascimento espera-nos com hospitalidade e a afabilidade, que tão bem conhecemos. Um coro feminino de jovens na Catedral diz-nos que somos bem-vindos. O seu português é doce e pouco inseguro, servido por olhares transparentes e simpatia tocante. No almoço esboçam-se ideias e projetos, e não há sombra de dúvidas quanto estarmos em ambiente familiar e bem português. No entanto, foi tudo muito rápido em Timor-Leste. E rememoramos o conto de Sophia sobre o «Anjo de Timor» - «Há muitos, muitos anos, em Timor, vivia um liurai muito poderoso e muito bom. Na sua juventude resolveu ir correr mundo, para se tornar mais sábio». A construção desta jovem nação obriga a muito trabalho, a muita determinação e a superar tentações temperamentais e fragmentárias. A generosidade tem de se tornar democrática e permanente. Partimos de manhã bem cedo para as Molucas do Sul, a fim de ver com os nossos próprios olhos um dos cenários mais importantes da presença portuguesa a Oriente do Oriente. Apesar dos pequenos atrasos inevitáveis, sobretudo tratando-se de um voo fretado, chegamos à baía de Amboino ao fim da manhã e embrenhamo-nos de imediato na cidade equatorial situada numa pequena ilha densamente povoada de floresta. A presença de um tão alargado grupo de portugueses causa surpresa. As autoridades locais não se poupam a esforços para nos serem simpáticas.

 

A RECORDAÇÃO HISTÓRICA
Luís Filipe Thomaz recorda-nos em pormenor a presença portuguesa, de 1512 a 1605. Aqui chegou a armada de António Abreu, vinda de Malaca a caminho de Banda. Francisco Serrão, depois de naufragar, foi daqui chamado pelos sultões de Ternate e Tidore. Amboino era pouco frequentada por mercadores, por não produzir as especiarias que os portugueses aqui introduziram, depois de 1564. Começaram então a ser construídas fortalezas, primeiro em madeira e depois em pedra, na atual cidade – estando a de Nossa Senhora da Anunciada pronta entre 1592-93. Foi significativo o papel do capitão Sancho de Vasconcelos e da Companhia de Jesus, tendo S. Francisco Xavier lançado as bases de uma missão na cidade, nos anos quarenta do século XVI. A insurreição de Ternate de 1570 e a subsequente fim da presença portuguesa levaram a que Amboino se tenha tornado, no fim do século, o bastião da presença portuguesa na área das ilhas de Maluco. E lembramos tudo isto com Monsenhor Andreas Peter Cornelius Sol, M.S.C., bispo católico, de nacionalidade holandesa, com 95 anos, grande estudioso e entusiasta da presença portuguesa na ilha. Reuniu, a suas expensas, um pequeno centro de documentação com variados elementos, livros, mapas, crónicas, revistas, que nos permitem conhecer o que os portugueses aqui fizeram, devendo-se-lhes essencialmente o desenvolvimento de Amboino. Via-se no seu olhar o entusiamo de nos acolher e o genuíno sentimento da saudade. Este foi sem dúvida o momento alto da nossa passagem nesta cidade, onde, apesar de toda a boa vontade do Governador, não obtivemos a autorização militar, que nos foi prometida, para entrar no Forte da Anunciada. Ficámo-nos pelo exterior e por uma longa espera na praça de armas…

 

Guilherme d’Oliveira Martins

 


Foto: Helena Serra, CNC

A VIDA DOS LIVROS


de 17 a 23 de Outubro 2011


Em «O Essencial sobre Eduardo Lourenço» (INCM, 2003) de Miguel Real, o autor lembra que «do ponto de vista de Portugal, a mola real da lusofonia residirá sempre na suprema constatação de que não só “os outros não a sonharão como nós”, como ser espaço de língua não significa ser espaço de cultura una». Por outro lado, «está a acontecer hoje à Europa o que acontecera a Portugal há quatrocentos anos – a auto-imagem da Europa é superior relativamente ao que ela verdadeiramente é».

 

 



Eduardo Lourenço por Leonel Moura


 

PORTUGAL COMO DESTINO
Na sua análise de Portugal como Destino, Eduardo Lourenço afirma que Garrett e Herculano refundaram a pátria porque, «pela primeira vez e de uma maneira mais radical do que acontecera nas raras mas fortes crises que pontuaram a nossa história de nação independente, o país esteve em sérios riscos de perecer». E a verdade é que aparte a revolução liberal de 1834 não houve outra em Portugal. «Inconscientemente» levámos séculos a afastar-nos da “fatalidade” europeia e do seu jogo de forças, mas tivemos de assumir-nos na balança da Europa. De facto, «o tráfico africano, o comércio do Oriente, o açúcar e depois, miraculosamente, o ouro do Brasil» permitiram-nos ter o nosso caminho, enquanto a Espanha esteve a braços com os seus “deveres de potência europeia”. Precisámos, porém, da Europa (França e Inglaterra) para preservar a independência, mas pudemos separar as águas. No entanto, foram faltando as riquezas perenes. Não por acaso, Lourenço fala de fanatismo, e da sua presença entre nós. Recorda a expulsão dos judeus, a sua conversão forçada e a longa presença da Inquisição – contudo acrescenta: «o povo português não é o único a merecer o ápodo de ‘fanático’, se essas generalizações são aceitáveis. Como o bom senso cartesiano, o fanatismo é a coisa mais bem partilhada do mundo». Todavia, não é certo que uma religião se possa definir pela intolerância e pela exclusão, até porque, em todo o caso, «não é essa a essência do cristianismo. Religião, por excelência da não etnicidade, exclui por definição, toda a incitação ao fanatismo». Alimentámos, contudo, no nosso interior dois Portugais – o Portugal velho e o Portugal novo -, numa divisão menos dramática do que a das duas Espanhas. Na busca de uma síntese, Eduardo Lourenço não esquece que fomos, durante muitos séculos, nação-cruzada, mas, apesar disso mesmo, pudemos sabiamente ter uma vivência religiosa flexível, que Oliveira Martins liga ao «imanente paganismo» e Jaime Cortesão ao naturalismo, bem evidente na plasticidade franciscana.

 

SOB O SIGNO DA LIBERDADE
Se fizemos tudo «coletivamente» até aos Descobrimentos, a verdade é que o Romantismo pôs a tónica no indivíduo – e daí também o sentido refundador de Garrett e Herculano. Se João de Barros, Camões ou Vieira inscreveram Portugal numa esfera de conteúdo transcendente, Herculano pôs a ênfase na liberdade - «um Portugal que, de armas na mão, se conquistou com liberdade. E é o passado dessa liberdade – quando na sua perspetiva mereceu esse nome – que ele exuma e exalta». E assim o historiador compreendeu o elo entre os dois Portugais, procurando conciliar liberalismo com cristianismo. E fê-lo «não por oportunismo, como a cultura oficial do constitucionalismo o fará, mas porque tal era a sua visão da história e a exigência do seu individualismo ético». E Garrett completa esta perspetiva ao pôr Camões no centro da «nova mitologia pátria, pátria de feitos, sem dúvida, mas pátria de canto, de cultura, sem as quais a memória deles não existe». Mas não há «qualquer profecia com garantia providencial», o que existe, sim, é vontade e capacidade de regressar ao passado como se fosse presente, relendo os acontecimentos de glórias e viajando na nossa terra, de modo a projetar o futuro. Em vez de D. Sebastião, surge Camões, com os seus sentidos lírico e épico. Em «Frei Luís de Sousa», o sebastianismo torna-se camoniano. «A saudade é gosto amargo do bem passado, “delicioso pungir de acerbo espinho”, mas igualmente penhor de ressurreição do que, por excesso de vida, não pode morrer». É, assim, o corpo e a sombra da alma portuguesa, ligada à liberdade e à vontade, não fado sem horizonte – sendo a nossa primeira «mitologia sem transcendência», que exige um tempo de descoberta das «coisas nossas», para usar a expressão de Régio. E se os românticos iniciais deram esse impulso, Camilo e Júlio Dinis retratam um Portugal inquieto, mas segundo o que é e como está. Mais importante do que um desígnio ou do que um destino, procura compreender-se quem somos – de Simão Botelho a Teresa, do Conselheiro Manuel Bernardo ao Joãozinho das Perdizes… Mas esta visão momentânea, consequência de um encontro inédito de realidades diferentes que coexistiam, culminará numa grande rutura – a da Geração de 70, numa singularíssima encruzilhada emancipadora, capaz de sair, ao menos em imaginação, «do pequeno Portugal com a ideia de lhe abrir o espaço confinado e o desprovincializar». Antero de Quental e os seus companheiros serão a primeira expressão de uma intelectualidade pensante, assim assumida, na esteira da «primavera dos povos» e antecipando o «caso Dreyfus», que pega no tema da decadência, não apenas na perspetiva portuguesa, mas peninsular e universal.

 

PERANTE A IDEIA DE DECADÊNCIA
A tomada de consciência da decadência deve-se ao facto, detetado por Eduardo Lourenço, melhor do que ninguém , de: «em todos os domínios, o regresso à casa lusitana, o confronto connosco próprios, que só por mediação alheia íamos tendo, era vivido sem meio-termo, com deceção ou regeneradora descoberta do nacional, do castiço. Decididamente, a Europa do último quartel do século, essa Europa de onde esperávamos o messias, em vez de nos estimular, melancolizava-nos ou humilhava-nos simbolicamente. O pior de tudo é que isto nada tinha que ver, em geral, com a Europa efetiva, no positivo e no negativo dela, mas com o psicodrama puramente onírico que nós vivíamos a sós connosco e que a dita Europa nem imaginava». Ora, a Geração de 70 personificou dramaticamente este desafio, e fê-lo com sentido profético como Quental assumiu na conferência de 1871 sobre «As Causas da Decadência», sabendo interpretar os ecos que condicionaram Nietzsche, como nosso primeiro pensador não nacionalista, falando em termos europeus e universais. Eduardo Lourenço deixa-se fascinar por essa aura, como aconteceu com Unamuno, que colocou Antero entre as catorze grandes referências sobre o «sentimento trágico da vida». Pioneiro da reflexão sobre a «morte de Deus», buscando aí os mistérios mais fundos do sentido da existência, «Antero foi o primeiro e, até hoje inultrapassável encenador de um drama que antes dele só por intermitência filtrava do fluir tranquilo da nossa cultura (Camões, Garrett) e desde então passou a haver, como Pascoais e Pessoa diversamente o mostraram». Deste modo, o ensaísta de «O Labirinto da Saudade», parte da herança de Herculano e de Garrett, centrando-se na exigência emancipatória da Geração de 70, vista não como um qualquer «vencidismo», mas como o culto determinado da crítica enquanto fator de liberdade e progresso. Daí a necessidade de compreensão dos mitos – que permitem ir da vontade à evolução. E não se diga que o Eça de «A Ilustre Casa» é o símbolo de uma desistência melancólica. Não se confunda com a realidade a «desleitura» ou um «adoçamento» injusto e ilegítimo dessa obra e desse tempo. De facto, para Eduardo Lourenço, a Geração de 70 demarcou-se da religiosidade tradicional, e buscou um sentimento universal, notado em Fradique Mendes e depois na galáxia Fernando Pessoa e no modernismo. E é nesta ligação que Eduardo Lourenço assume uma grande originalidade, ao articular as Conferências Democráticas e o Orpheu, os séculos XIX e XX. «A história e o destino de Portugal nunca foram trágicos fora da tragédia adiada que a vida é. Também não o são agora. Pela primeira vez, o nosso país vive-se a si mesmo e começa até a ser visto pelos outros, como um povo insolentemente feliz». Estava-se em 1998, tempo de otimismo. Lourenço falava de «maravilhosa imperfeição». Mas de que contentamento falava? Ou era desconcerto? E hoje perante as nuvens negras da crise? Volta a ciclotimia antiga. Mas o tema de Portugal como Destino está de pé. É só dele que se fala, apesar da míngua de respostas. Voltam a ser urgentes liberdade e vontade!

 

Guilherme d'Oliveira Martins

PADRE LUÍS ARCHER, S.J. (1926-2011)

Por Guilherme d’Oliveira Martins

 

O diálogo entre a ciência e a fé é apaixonante. É verdade que muitas vezes se torna difícil e pleno de perplexidades, mas revela-se fecundo, sobretudo quando estamos perante espíritos livres e abertos, disponíveis para usar a razão como chave para aprofundar as descobertas do espírito. Lembramo-nos de Pascal, personalidade fascinante, para quem fé e ciência eram naturalmente complementares, salvaguardadas as diferenças de domínio de ação. E poderemos dar o exemplo de Leibniz, para quem a criação é sempre complexa, envolvendo Deus, a natureza e a humanidade. E hoje, quando o Padre Joaquim Carreira das Neves lê Stephen Hawking, fá-lo com rigor e serenidade, sem pôr em causa os conhecimentos do cientista e o seu caminho fundamental, mas interrogando os limites. Quando soube da notícia da morte do Padre Luís Archer estava a ler o último livro de José Tolentino Mendonça, e senti que havia algo nesse texto que tinha a ver com o que aprendi com o jesuíta, que conheci na direção da «Brotéria», e que é um exemplo de compreensão do mundo moderno – como o foi também o Padre João Resina Rodrigues que também há pouco nos deixou. Cito o que li, a dado passo, em «Pai Nosso que estais na Terra» (Paulinas, 2011): «O poeta Rainer Maria Rilke ajuda-nos na procura de um sentido. Diz ele: “As coisas estão longe de ser todas tão tangíveis e dizíveis quanto se nos pretenderia fazer crer; a maior parte dos acontecimentos é inexprimível e ocorre num espaço em que nenhuma palavra nunca pisou”. A biografia da nossa oração tem um desenho assim. Mantém o seu quê de inexprimível. Mesmo se explicitada, continua um filamento secreto, uma história em aberto. Quem reza percebe melhor do que ninguém as dúvidas, as dificuldades, os hiatos que podem rodear o caminho da oração pois esta é uma aprendizagem nunca terminada» (pp. 19-20). Afinal, a ligação entre a ciência e a fé permite a procura do inexprimível e a nunca terminada aprendizagem. Foi assim a vida cheia de Luís Archer.

 

Nasceu no Porto em 1926, formou-se em Ciências Biológicas na Faculdade de Ciências da Universidade da sua cidade natal. Também sentiu uma vocação musical e estudou piano, tendo depois entrado na Companhia de Jesus, na qual foi ordenado presbítero na Alemanha, no final dos anos cinquenta. Sempre atento ao que o cercava, tornou-se um estudioso compulsivo, com um rara capacidade de compreensão dos limites dos diferentes saberes humanos: Bioquímica e Genética, nos Estados Unidos, em Georgetown, Genética Molecular, mas também Filosofia e Teologia. Lançou a investigação em Genética Molecular na Faculdade de Ciências da Universidade do Porto e dirigiu o Laboratório da sua especialidade no Instituto Gulbenkian de Ciência (1971-1989). São dele estas palavras: «Formei-me em Biologia e depois entrei para a Companhia de Jesus e fui ordenado padre. Em seguida fui trabalhar para o mundo da ciência, porque os jesuítas acharam que era importante ter gente nessa área. Mas não senti incompatibilidade entre os objetivos da ciência e da fé. Isso, não. A minha formação em Filosofia há muito que tinha destruído esses mitos; já tinha entendido que a Evolução foi o caminho que Deus seguiu para dar origem a este ser estranho que é o homem. O que não retira em nada o sagrado da vida» (entrevista a Isabel Stilwell, DN, Novembro de 2006). Julgo que aqui está dito o essencial. E todos nos lembramos dos ensinamentos de Teilhard de Chardin, que seguiu os caminhos da ciência, para fazer luz sobre o conhecimento e a compreensão de Deus, da natureza e da humanidade. E, num tempo em que a bioética assume uma importância indiscutível, exigindo um diálogo fecundo entre pessoas e saberes, o Padre Luís Archer foi uma voz respeitada pela comunidade científica, em especial quando presidiu ao Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida (1996-2001). Com ele o diálogo da ciência com a fé tornava-se natural e fácil… De facto, as coisas estão longe de ser todas tão tangíveis e dizíveis quanto se pretende fazer crer…

A VIDA DOS LIVROS


de 10 a 16 de Outubro 2011

 

A última edição da «Peregrinação» é um precioso instrumento de trabalho e uma riquíssima fonte de informações – «Fernão Mendes Pinto and the Peregrinação: studies, restored portuguese text, notes and indexes», edição de Jorge Santos Alves e Carla Alferes Pinto, tradução de Kevin Rose e Richard Trewinnard, 4 volumes, Imprensa Nacional – Casa da Moeda e Fundação Oriente, 2010. Trata-se, no seu título completo, da «Peregrinaçam de Fernam Mendez Pinto em que da conta de muytas e muyto estranhas cousas que vio & ouvio no reyno da China, no da Tartaria, no de Sornau, que vulgarmente se chama de Sião, no de Calaminhan, no do Pegù, no de Martauão, & em outros muytos reynos & senhorios das partes Orientais, de que nestas nossas do Occidente ha muyto pouca ou nenhua noticia. E também da conta de muytos casos particulares que acontecerão assi a elle como a outras muytas pessoas. E no fim della trata brevemente de alguas cousas, & da morte do Santo Padre Francisco Xavier, unica luz & resplandor daquellas partes do Oriente, & reitor nellas universal da Companhia de Iesus». O relato é multifacetado e nele pode compreender-se a experiência da presença portuguesa no Oriente, protagonizada por alguém que viveu o que os portugueses foram e fizeram nessas longínquas paragens. Fernão Mendes foi, assim, ou pelo menos descreve-nos tudo o que poderia ter sido: criado de fidalgo, soldado, escravo, agente de negócios, pirata dos mares da China, mercador, médico ocasional do rei do Bongo, vagabundo e embaixador. E assim temos nesta obra desde o exemplo da literatura picaresca, como em Lazarilho de Tormes, até ao romance, à crónica imaginosa (complementar de Diogo do Couto ou João de Barros), à reunião de indicações úteis, mas sobretudo um extraordinário monumento de humanidade.

 


arrozais em Bali

 

RECORDAR O EMBAIXADOR DO REI DOS BATAS
Os ecos de Malaca continuam bem presentes. Toda a presença dos portugueses no Índico é marcada pela opção de Afonso de Albuquerque por essa placa giratória fundamental, bem evidente quando lemos a «Peregrinação», de Fernão Mendes Pinto. Veja-se o episódio da vinda do Embaixador do Rei dos Batas. Pero de Faria fê-lo «agasalhar o mais honradamente que então foi possível». E assim «o despediu bem despachado, e satisfeito do que viera buscar, porque lhe deu ainda algumas cousas além das que lhas pedira, como foram cem panelas de pólvora, e rocas, e bombas de fogo, com que se partiu tão contente desta fortaleza, que chorando de prazer, um dia perante todos os que estavam no tabuleiro da igreja, virando-se para a porta principal dela, com as mãos levantadas, como quem falava com Deus, disse publicamente. Prometo em nome de meu Rei a ti Senhor poderoso, que com descanso e grande alegria vives assentado no tesouro das tuas riquezas que são os espíritos formados da tua vontade, que se te praz dar-nos vitória contra este tirano de Achem (…). E assim te prometo e juro com toda a firmeza de bom e leal, que meu Rei não tenha nunca outro Rei se não este grande Português, que agora é senhor de Malaca» (cap. XIV). Não pode haver dúvidas sobre a importância desse lugar – e as deambulações e os bons sinais de mercadores e missionários contribuíram decisivamente para tornar a zona próspera. Por isso, depois do século XVII, aquando da conquista holandesa, muitos portugueses da Malásia se espalharam pelo Índico a cultivar e a comerciar. Desde o início, a rivalidade comercial entre muçulmanos e hindus favoreceu o rápido domínio a partir de Malaca, além de que as embarcações do Índico eram menos adaptadas à guerra marítima do que a uma rápida circulação. E não se esqueça que, logo a partir de 1511, a instabilidade político-militar no Médio Oriente e a perda de influência das Repúblicas italianas incentivou a importância da rota do Cabo da Boa Esperança. No entanto, a nobreza procurou resolver o seu problema económico, dominando politicamente, impedindo o desenvolvimento de uma burguesia comercial, com as consequências bem conhecidas…

 

IMERSÃO TOTAL NA CULTURA HINDU EM BALI
Chegados a Bali, vivemos uma imersão total na cultura hindu, caldeada pelo animismo, vivido pelas populações mais antigas da ilha. Nos templos que visitamos encontramos sempre os três mundos da cultura da Índia – o domínio dos espíritos que importa aquietar e que está bem presente na construção das habitações e dos templos sobre estacas, mas também nas cerimónias de purificação, como a ancestral luta de galos, antes da entrada nos templos; o território das pessoas humanas; e a invocação dos deuses e dos antepassados. No templo de Batukaru, assistimos às cerimónias matutinas. Luís Filipe Thomaz cita S. Boaventura ao presenciar o intenso ambiente de oração, com todos nós a envergar o tradicional Saron, preto e branco: «o mundo é um livro onde se lê a trindade criadora». Ressalvadas as distancias, a afirmação faz sentido também num templo hindu. E não disse o Padre Francisco Álvares um dia na Etiópia, que a Deus agrada ser louvado por muitas e diversas formas? No caminho que seguimos até às montanhas, a nossa vista alonga-se nos magníficos terraços verdejantes dos arrozais a perder de vista. Mas também encontramos as plantações de banana, cacau, papaia e manga. A cada passo vemos as representações da complexa mitologia do hinduísmo. Mas, já que os muçulmanos festejam o final do Ramadão, passamos por diversos ajuntamentos festivos, plenos de cor e alegria. Culminamos com a ascensão ao vulcão Batur, onde almoçamos perante uma paisagem deslumbrante, na qual até o sol timidamente aparece. Um lago amplo ocupa parte da cratera e o lugar corresponde a um ponto de encontro natural entre o sagrado e o humano. No templo da Primavera Sagrada (Pura Tirtha Empul), podemos presenciar uma intensa vivência religiosa, ora nos ritos de purificação nos amplos tanques alimentados por abundantes nascentes, ora em pequenos grupos familiares de oração. Sente-se um diálogo com a Natureza acolhedora, com a qual há uma procura de equilíbrio. Verifica-se um grande movimento de fiéis e de turistas, contrastando com o silêncio e o recato que encontrámos de manhã em Batukaru. Já com a tarde a declinar, mas numa altura mais propícia quanto à temperatura ambiente, visitamos o templo de Gunung Kawi, de difícil acesso, pelas seis centenas de degraus a vencer, com os seus monumentos funerários escavados na rocha, de modo deslumbrante. Em Bali o hinduísmo encontrou um território propício de afirmação e desenvolvimento, sentindo-se a cada passo uma adesão peculiar, na qual o animismo não desaparece, antes se integrando de modo original no sincretismo hindu.

 

NA ILHA DO CABO DAS FLORES
Após uma madrugada, em que estas peregrinações são férteis, partimos para a Ilha do Cabo das Flores, ou apenas das Flores, com o nosso guia de Bali, o Julian, inconsolável por ficarmos tão pouco tempo. O voo da Batavia Air para Maumere tem trânsito em Kupang (Timor Ocidental). Com dois atrasos, em Bali e em Kupang, chegámos às Flores a tempo de um almoço retemperador, de modo a podermos visitar o tesouro de Sikka, à guarda da família real dos Ximenes da Silva. É com especial emoção que vemos um capacete português em ouro maciço, feito em Malaca em 1607, colares, pulseiras e armas votivas. Verificamos, porém, ser necessário, e o Encarregado de Negócios de Portugal, Dr. Pedro Coelho, concorda inteiramente, criar condições de maior segurança deste património que invoca o acordo firmado pelos portugueses com os liurais da Ilha e vigente até 1851, até que um governador português fez cessar esse entendimento. Ao folhear o livro de honra, encontramos as assinaturas de Helena e Alberto Vaz da Silva, quando o Centro Nacional de Cultura fez a primeira embaixada cultural, no reatamento das relações de amizade com a Indonésia. A Ilha das Flores nunca foi conquistada pelos portugueses, foram os seus chefes locais que fizeram acordos com a nossa administração, os missionários e os mercadores. Estes vinham às Flores buscar o sândalo. Os frades dominicanos, com papel decisivo, fixaram-se na ilha do Solor, vindos de Malaca, em 1562, tendo depois ido para Larantuka na parte ocidental das Flores. O resultado dessa evangelização de portugueses, fruto de um inteligente apoio aos liurais, está à vista não só pela presença forte do cristianismo (bem evidente nas cerimónias da Semana Santa), mas também pela presença da língua, já que o bahasa indonésio regista aqui pelo menos dois mil vocábulos de origem portuguesa (como: grande, semana, franja, domingo, sábado, sapato, fogo, sentido e tia…). Mas se dúvida pudesse haver, em Sikka, somos levados pelo cicerone Senhor Pereira, a visitar o que ainda nos faltava do tesouro dos Ximenes da Silva – o Menino Jesus Salvador do Mundo, vestido a preceito como se estivesse numa festa de qualquer recanto português…

 

Guilherme d'Oliveira Martins

Nobel da Literatura 2011. Por Teresa Vieira

 

 

O Nobel da Literatura Tomas Transtromer é considerado um dos maiores poetas vivos do nosso tempo, sendo-lhe sempre atribuída uma nova forma de aceder à realidade e de assim a partilhar connosco: através da palavra mais coada que só a poesia tem.

 

Trata-se de um poeta traduzido em inúmeras línguas não o tendo esquecido a Veja editora quando em 1981 o incluiu na colectânea «21 poetas suecos».

 

Um mundo de metáforas concentradas conforme as palavras da academia e, acrescento, cujo suco tantos anos levaram a chegar ao mundo de o conhecer em Portugal.

Um dia Ruy Belo referiu-se a ele dizendo que em Portugal o cerco de se não falar de quem não tem registo público continuado, impede a maçã de se mostrar parte inequívoca da árvore.

 

O facto de Transtromer ter escrito, nomeadamente sobre Lisboa e de a ele termos tido acesso pela tradução de Vasco Graça Moura, não impede o continuarmos a ser solidários com a expressão de Ruy Belo.

Na verdade este poeta de 80 anos não nos é familiar tanto quanto a sua intensa obra o merecia.

 

Infelizmente muitos escritores se encontram sob vários géneros de silêncios que de um jeito ou outro nos fazem perder o muito que a humanidade é capaz.

Creio que a necessidade de clarificarmos os conceitos, quantas vezes reclusos na própria poesia, o favorecer o contacto com a leitura da poesia de poetas ainda para nós “longínquos”, seria o fantástico passo para conjugar o verbo contido na universal vida da palavra.

 

 

 

LUC FERRY

 

 

 

Viver sem medos é talvez o princípio da precaução para que possamos proteger o desconhecido por razões desconhecidas.

 

Quando li A Nova Ordem Ecológica do filósofo Luc Ferry julguei ter entendido que Ferry propunha uma realização diferente a todos nós, mas não contida num ideal, antes uma realização numa espécie de domicílio ainda por dizer, mas sugerido já por essas páginas com impacto na vida concreta.

 

Passou Ferry a fazer parte das minhas aulas desde então.

 

Depois com o livro Aprender a Viver (agraciado com o Aujourd’hui 2006) julguei entrar numa proposta instalada mais perto de cada ser, na sua própria vida quotidiana, diria. Vi neste livro o desafio claro do ser humano a uma convicção do quanto a Filosofia harmoniza as diferentes forças da vida ao mesmo tempo que leva o homem a reflectir sobre a sua finalidade.

 

Levei aos alunos até onde fui capaz uma história das ideias do fim e do não-fim com um impacto na vida concreta.

 

Disse-lhes e digo-lhes o quanto, um dia, a minha docência no seu clarificar, me tinha sido nata no não confundir profundidade com obscuridade, e o quanto, mal ousamos e desde logo em nós se inicia a revolução. A Filosofia.

 

No caminho das palavras de Luc Ferry temos medo de tudo: dos aquecimentos globais, do sexo, da velhice, dos organismos geneticamente modificados, da mundialização, diria, enfim, de tudo o que compõe o mundo ocidental no que respeita à proliferação dos medos.

 

Por aqui melhor entendi o quanto Platão, Epicuro, Montaigne, Nietzsche e a cada ano, Kundera é relido por Luc.

 

A Filosofia, sabe-se, não deve encorajar o medo, mas ajudar-nos a ultrapassá-lo e a vivermos o nosso presente, acima de tudo impedindo outros tempos de minarem as interpretações de sossegos ou desvarios, mas ainda assim, eles e as suas circunstâncias poderem ter a liberdade de se exporem e nunca a serem ultrapassados por outros tempos que lhes pertencem nas afinidades e não nos núcleos.

 

Viver sem medos depois desta leitura da Revolução do Amor de Luc Ferry em pleno sec. XXI é, em muito, ensinar o homem a viver bem, a viver com a mão das escolas gregas da Antiguidade: é o amor a dar sentido.

 

Afinal podemos morrer por aqueles que amamos.

 

Afinal teremos nascido para uma nova espiritualidade que já mudou o nosso olhar sobre o mundo e nós sem nos darmos conta?

 

Poderemos dizer que as pátrias mudaram os motivos e os locais no nosso coração?

 

Hoje, século XXI, qual o sentido da vida? Residirá no conforto, no sucesso, em qual? No do prestígio ou no do silêncio? No que olha ou no que nos olha?

 

Luc Ferry, pensador francês, defende um Humanismo Secular, através do qual, bem-estar é realização pessoal. Viver, constitui um harmonizar das diferentes forças da vida e perceber? bom, perceber é toda uma capacidade criativa. É toda uma obra de vida rara, um inovar do que desejaríamos vivenciar.

 

Coloca Luc Ferry neste seu trabalho, A Revolução do Amor, ao serviço de uma espiritualidade laica, ao serviço de um reaprender a viver renovando-se os discípulos e soltando-se as escolas gregas.

 

Toda esta leitura a sinto também num alertar para o quanto o tédio de consumir não é um medo enquanto a catástrofe vender melhor do que as boas-novas.

 

O espírito crítico desenvolve-se nas democracias e nas sociedades humanistas mas acreditando que nenhum perigo existe no questionar. Esse lapso interpretativo, um espaço de enorme tragédia para uma só vida. Digo.

 

A imprensa desliza e não desdiz o que com deficiente expressão não restaura, pois que a geometria onde habita, é a dos condenados da terra colonizados e infelizes no formidável paradoxo que estamos longe de resolver: refiro-me ao recolhimento na diferença, na revolução, no amor, mundos de que afinal são prisioneiros e fiéis guardas os arautos das liberdades expressivas.

 

Afinal só os inversos são verdadeiros se ressingularizarmos os modos de vida, se os rediferenciarmos contra todas as uinidimensionalidades do mundo moderno.

De outros jeitos já encontrei no livro de Ferry, A Nova Ordem Ecológica, uma siderante passagem da revolução à contra-revolução, quando o objectivo não era então, chegar a um consenso acerca dos problemas em análise, mas pelo contrário, provocar o aprofundamento das posições particulares dissonantes.

Ponta e mola nesta Revolução do Amor é um elaborar a Odisseia de Homero quando toda a história recomeça no caos e o sentido da viagem é o da harmonia da vida e seu sentido.

 

A guerra, a guerra não é local de ordem cósmica, não é sequer a paz um caminho para chegar a uma imortalidade, já que viver feliz é algo que supera a desassossegada imortalidade.

 

Recordo Heidegger na sua desconstrução da metafísica e sinto Luc a seu lado a soletrar uma energia limpa, tão sugestivamente limpa que nunca aconteça pois Tristão ou Don Juan em todos os verões se relacionarão no sentir de Ferry como uns apaixonados da razão por conta do compromisso.

 

Ferry é defensor do Humanismo Secular, contrapõe à religião, o uso de uma razão crítica, que leve aos homens uma paz na intrigante violência da morte, ou da felicidade ou do amor incondicional nas condições de cada ser.

 

Afinal A Revolução do Amor é também um alerta: nenhuma vida humana é boa se não aceitarmos a morte.

 

O sábio aceita-a para assim vencer o medo. E todos poderemos na luz de Luc reconciliar a ordem cósmica com o universo harmonioso que nos rodeia num fragmento, muito fragmento de eternidade, e ainda assim numa estética de vida que no seu alfa e ómega a não procure.

 

Afinal o ponto de partida e a finalidade última poderá ser o conhecimento do amor, se a nossa vida for uma pergunta, algo que tenha a medida de uma interrogação que aos olhos de Schopenhauer seja apropriada para vencer medos, seguir caminhos pouco frequentados, reconhecer as limitações profundas da autocritica, e que o sentido absoluto da absurdidade da vida seja um lugar de onde se parta.

 

Afinal e talvez o perigo resida naqueles que se contentam com as tiradas vagas e fáceis, do género, a vida não tem sentido e só nos resta a arte, e afinal são tão terrivelmente curtos os que a reconhecem com a modéstia de conseguir  que até os estóicos lhes sorriem.

 

Os conhecidos momentos de champanhe duram um certo período, mas nunca ninguém saltará de alegria pela partida de um amado, o que gera também um medo, mas não é um medo da felicidade, no limite, dizê-lo é uma indecência.

 

Será antes uma insuportável fórmula que nos é companheira por excesso, ou não será a prova do quanto o amor dá o sentido como diz Luc, não às nossas existências, mas nas nossa existências.

 

De facto não é a perseguição cega das realidades conhecidas por interesses que poderão salvar o mundo, mas a lógica da fraternidade e da entreajuda, do prazer de dar mais do que receber. Estou convencido de que os Europeus começam a compreendê-lo e a converter-se a isso, muito lentamente sem dúvida, mas de forma bem irreversível.

 

Estas as palavras de Luc Ferry no seu livro de que tanto, mas tanto gostei, A Revolução do Amor – Para uma espiritualidade laica.

 

Estas mesmas palavras, as faço minhas, num contributo ao cessar da indiferença. Numa formidável salva de palmas a quem do pensar faz palácio onde habita.

 

21 de Setembro, mais um dia de vindimas em Portugal no ano 2011. Rougemont não se recordou. Contudo Albertine não escapa ao Douro sedutor.

 

Teresa Vieira

A VIDA DOS LIVROS


de 3 a 9 de Outubro 2011

 


«Liberdade e Política Pública de Educação – Ensaio sobre um novo compromisso social pela Educação» de Joaquim Azevedo (Fundação Manuel Leão, 2011) é um conjunto de reflexões sobre a educação e a aprendizagem de alguém que conhece bem esse mundo e que nos propõe, com seriedade, pistas de ação, para além dos lugares comuns e das simplificações que tantas vezes são ouvidas quando se trata destes temas.

 

 

DIGNIDADE E AUTORIA
Começo por referir um amigo comum, que nos deixou não há muito e que Joaquim Azevedo cita no início deste seu livro – falo de Joaquim Pinto Machado, cidadão exemplar, homem bom, que ao longo da vida nunca se poupou na tarefa de pôr a dignidade e a liberdade no primeiro lugar das preocupações da sociedade portuguesa. Disse ele, um dia, «a dignidade do ser humano é ser autor». Esta referência é fundamental e está ligada à ideia de «autoridade moral», já que etimologicamente vem da autoria, da criatividade, da responsabilidade, da afirmação prática da dignidade. Ao longo da vida, ouvi sempre Joaquim Pinto Machado a falar dos valores éticos enraizados na vida, ligados ao facto de a pessoa humana ter de ser colocada no centro da história e da sociedade. E quando falamos de educação é essa centralidade que tem de ser afirmada (como no-lo ensinou, por exemplo, Henri Marrou). Tenho encontrado, porém, uma grande dificuldade em debater seriamente os temas da educação, há demasiados preconceitos e grandes resistências a pôr na mesa o que realmente está em causa. Há muitas pessoas convencidas de que têm soluções, mas assentam em pressupostos tantas vezes errados que prejudicam seriamente a apresentação de pistas viáveis no sentido de melhorar a educação e a aprendizagem e de as tornar um fator de exigência e de qualidade. Este livro de Joaquim Azevedo é um contributo sereno para o debate. Contém uma análise correta, fundamentada e recusa a demagogia simplificadora.

 

UM CAMINHO DE PROGRESSOS
Ao falarmos de Educação temos de começar por dizer, como faz o autor desta obra, que vivemos em Portugal nos últimos quarenta anos um caminho longo de progressos, mas também de perplexidades, de avanços e recuos. Em 1974, havia vinte cinco por cento de analfabetos, que era a taxa mais elevada da Europa, a grande distância dos demais Estados. Apesar dos esforços efetivos, sobretudo depois do final dos anos sessenta, em razão da internacionalização e do fim da autarcia, a democratização ocorreu como consequência direta da nova ordem constitucional iniciada em 1974, consolidada a partir de 1976 e 1982, e que deu lugar à Lei de Bases do Sistema Educativo de 1986. No entanto, houve desde o início hesitações e erros com consequências irreversíveis, em especial a prevalência de uma via única no ensino secundário, ao invés da diversidade prevista na reforma não concretizada de Veiga Simão. E importa reconhecer que desde muito cedo o autor deste livro teve a exata compreensão do papel crucial que o ensino secundário desempenha – como resultou da sua ação no âmbito das escolas profissionais, experiência fundamental para romper a velha inércia da indiferenciação de vias. De facto, como nos diz Joaquim Azevedo: «não podemos oferecer o mesmo tipo de formação a todos, pensando que estamos a oferecer o melhor percurso a cada um» (p.55). E o certo é que «o sistema escolar continua muito ineficaz e ineficiente, sobretudo nas transições entre ciclos de estudo e no ensino secundário» (id.). Impõe-se, assim, inscrever a educação no espaço público. Se o «santuário ruiu» (porque o saber deixou de ser administrado isoladamente do mundo, acessível a poucos, passando a apontar-se para uma escola de qualidade para todos) é fundamental empenharmo-nos em superar os bloqueamentos perante os quais estamos: a educação não é um problema técnico, mas político e de cidadania; exige o apoio às famílias; a diferenciação das aprendizagens; a mobilização dos professores para as tarefas que lhes cabem; o estabelecimento de um clima de confiança com as escolas, de modo a favorecer a autonomia; o primado da responsabilização; a superação da dicotomia Estado / mercado; e a recusa do populismo, do cinismo e da demagogia. Em vez da desconfiança e da irresponsabilidade, do que se trata é de pôr a autonomia como ideia e prática no centro do funcionamento das escolas.

 

LEMBRAR CELESTIANO…
O velho Celestiano, de Mia Couto, acusa a facilidade quando diz «onde é sempre meio-dia, tudo é noturno». De facto, a facilidade na escola, a festa e a tentação de deixar tudo pela rama, tem consequências dramáticas. O que distingue o progresso do atraso é a capacidade de aprender. Não basta investir em Educação, importa traduzir as apostas em qualidade, exigência, avaliação e prestação de contas (no sentido da responsabilidade cidadã). E quando se discute se o objetivo da educação é a preparação para o mercado trabalho – temos de contrapor, com coragem e determinação, que formamos pessoas, que queremos criar cidadãos livres e responsáveis – os bons profissionais virão por acréscimo. Daí que a autonomia seja pedagogicamente ativa – exerce-se em nome da cidadania responsável, por contraponto à irresponsabilidade. Por isso a autonomia assenta: na pessoa humana, no centro da escola, na solidariedade como método de entreajuda e cooperação e na subsidiariedade, resolvendo os problemas o mais próximo possível das pessoas. Mas exercer a autonomia, tornando a escola central e não periférica, obriga ao gradualismo, ao aperfeiçoamento permanente, e ao exercício das tarefas cometidas a cada um. O triângulo escola / família / comunidade tem de ser levado a sério. Os pais devem participar na escola, mas não confundir o seu papel com o dos professores - têm de interagir com a escola. Infelizmente, ou chegam tarde demais ou invadem territórios dos profissionais. O equilíbrio é fundamental – nem tarde demais nem para além do desejável.

 

O SERVIÇO PÚBLICO DE EDUCAÇÃO
Como defendi com Eduardo Marçal Grilo, o serviço público de educação não pode resumir-se à iniciativa estatal. Estamos perante a necessária complementaridade de iniciativas, uma rede de escolas com estatutos diferentes, exercendo cada vez mais a sua autonomia, com um objetivo comum. E a verdade é que as escolas devem ser mais autónomas e ativas, como lugares de trabalho, de liberdade e de democracia. Eis por que razão concordo com Joaquim Azevedo sobre a necessidade de uma visão antimonopolística, policêntrica, com uma autêntica regulação responsabilizadora nas escolas. Assim, a interação entre a pessoa e a comunidade, a vivência da laicidade (por contraponto ao laicismo), a sociedade providência e a solidariedade voluntária (ou a importância crescente da responsabilidade social) tornam a rede escolar como ponto de encontro de diversas iniciativas, que tem de valorizar a aprendizagem. A ideia de compromisso surge, assim, com naturalidade: a partir do empenhamento pessoal e cívico (engagement), do exercício da autonomia, do acordo e da cooperação em nome do bem comum e de uma auto-avaliação praticada por escolas que aprendem. «Escolham o que escolherem fazer com a vossa vida, garanto-vos que não será possível a não ser que estudem» (Obama). Trabalho, disciplina, profissionalismo – eis o que tem de estar presente quando falamos de educação de qualidade para todos. E em nome da esperança e do aperfeiçoamento gradual, melhor educação terá de significar: ensinar a pensar, favorecer a responsabilidade pública, ter amor à aprendizagem e ao sentido crítico, garantir oportunidades para todos, incentivar a qualidade, a confiança, a inclusão e a cooperação. No fundo, «a educação é essa “arte” de promover o desenvolvimento humano de cada pessoa, que só se des-envolve verdadeiramente na medida em que é acolhida pelo outro, que lhe dá em si um lugar; o outro des-oculta-me solidariamente, convocando toda a comunidade indizível que me habita» (p.124). Jorge de Sena diria: «uma pequena luz bruxuleante / brilhando incerta mas brilhando».

Guilherme d'Oliveira Martins