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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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ATORES, ENCENADORES - LIII

 

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EVOCAÇÃO DE EMILE DOUX

 

O romantismo teatral, por razões estéticas e culturais mas também por influencias pessoais, absorve e reflete uma forte expressão organizacional vinda de França. Razões variadas, insista-se, mas que convergem, tanto no plano do espetáculo como no plano da própria dramaturgia, sobretudo a partir da grande afirmação romântica e ultrarromântica que Garrett iniciou e que os dramaturgos contemporâneos e sequentes desenvolveram, e isto, tanto na dramaturgia propriamente dita, ato criacional fundador, como na organização do profissionalismo de espetáculo – atores, encenadores - apesar de na época se chamassem ensaiadores - e os próprios dramaturgos.

Nesse aspeto, é pertinente recordar a longa estadia do francês Emile Doux em Portugal e no Brasil, e a influência que teve na formação do espetáculo profissional nos dois países. Mas quem se lembra hoje dele?...

Diz-nos Sousa Bastos na “Carteira do Artista” (1898): Emile Doux estreara-se em 1835, no velho Teatro da Rua dos Condes, integrado numa companhia francesa de que era figura principal o ator Paul. Por aqui ficaram ambos, tendo Paul assumido funções docentes na Escola de Arte Dramática do Conservatório, por sua vez criado, no que respeita ao teatro, pela reforma garrettiana de 15 de Novembro de 1836, assinada por Passos Manoel e referendada por D. Maria II. Vale a pena lembrar que o então chamado Conservatório Geral de Arte Dramática englobou o Conservatório de Música dirigido por João Domingos Bontempo no ano anterior.

O ensino do teatro compreendia, na reforma de Garrett, três áreas: declamação, música e dança e mimica, com destaque para a disciplina de “reta pronúncia” o que, tal como recordo na “História do Teatro Português” “valeu a Garrett, durante algum tempo, a alcunha irritante (até porque bastante certeira) de reta pronúncia”, o que muito o arreliava… (ed. Verbo pág. 152).

Em qualquer caso, Garrett esteve também na origem da criação de um companhia de teatro declamado que se instalou no velho Teatro da Rua dos Condes. Luís Francisco Rebello refere com desenvolvimento a organização e o elenco. Dela faziam parte os melhores atores da época: Catarina Talassi, Carlota Talassi, Florinda Toledo, Tasso, Epifânio, João Anastácio Rosa, Delfina, Emília das Neves… E quem a dirigia era precisamente Emile Doux (“o seu guia” diz Lucciana Segagno Pichio na “História do Teatro Português”) e o ator Paul, que aliás viria a ser designado Diretor da Escola. (cfr. Rebello in “O Teatro Romântico – 1838-1969”- 1980).

Mas não fica por aqui a história. Dirigiu espetáculos nos Teatros do Salitre, Ginásio, D. Fernando…E é novamente Sousa Bastos quem recorda, agora no ”Diccionário do Theatro Portugês” (1908): “Emile Doux, apesar dos importantes serviços que prestou, sofreu a maior guerra por parte da imprensa e até de muitos artistas, o que o levou a partir para o Rio de Janeiro, onde prestou ainda bastantes serviços ao teatro, e onde morreu em 1876”.

Ora bem: fazemos uma longa transcrição de Afrânio Coutinho, em “A Literatura no Brasil” (vol.6 – Rio de Janeiro 1971):

“Nesse período de transição entre o Romantismo e o Naturalismo, um casa de espetáculos – o Ginásio Dramático – congrega todas as forças renovadoras, agrupando à sua volta encenadores como Emílio Doux, que nos vinha de França depois de uma longa permanência em Portugal, e interpretes como Joaquim Augusto, rival mais moço de João Caetano, e Furtado Coelho, ator português expoente do novo credo.”

E transcreve um enorme elogio de Machado de Assis a Furtado Coelho: “O que se nota neste artista, e mais que em qualquer outro, é a naturalidade, o estudo mais completo da verdade artística. Ora, isto importa uma revolução: e estou sempre ao lado das reformas”…

É Machado de Assis quem o escreve!

 

DUARTE IVO CRUZ