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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

A FORÇA DO ATO CRIADOR

 

 

A cidade como expressão do controlo hegemónico do Estado – o Plano de Étienne de Gröer.

 

 “... a tudo o que o Homem realiza para organizar o seu espaço, resultam dois aspectos fundamentais: em primeiro lugar a importância de que as formas se revestem na vida dos homens e em segundo lugar, e como consequência, a responsabilidade que assume cada homem ao organizar o espaço que o cerca. E tal responsabilidade surge exactamente pelo facto de o homem saber que a organização do espaço, tendo de satisfazer e atender à circunstância, não é por esta ‘fatalmente determinada’...”
Fernando Távora, 1962

 

Para compreensão total do actual panorama da cidade de Lisboa, constitui-se importante a política de obras públicas implementada durante o Estado Novo. Esta abordagem refere-se, com entusiasmo, à satisfação de uma vontade em assumir a cidade como entidade representante de um regime promotor da iniciativa pública – a forma urbana sobrepôs-se à sua circunstância e à sua condição. Determinante era referir a cidade como forma de poder e de propaganda. Pretende-se, deste modo ‘...urbanizar o território através de um método apriorístico e uniformizador, onde as cidades fossem a expressão da acção e do controlo hegemónico do Estado sobre o espaço social.’ (Nuno Grande, 2002)

 

O Programa das Obras Públicas foi um instrumento de política activa de despesas públicas tendentes à criação de empregos, materializando o combate às carências habitacionais, com estabelecimento de um parque habitacional para arrendamento a preços módicos. Convém referir que o Estado Novo conseguia garantir construção de obras públicas através do mecanismo de expropriação.

 

De 1934 a 1944, Duarte Pacheco desencadeia o processo de elaboração de planos de ordenamento territorial, procurando criar os mecanismos e condições favoráveis ao seu desenvolvimento. Se o Plano Geral de Urbanização e de Expansão de Lisboa foi lançado no final de 1938, o certo é que a sua concretização fez-se ao longo dos anos quarenta, mas sobretudo depois de 1945 e nos anos cinquenta. Lisboa exigia uma maior atenção. Havia que lhe impor uma ordem urbanística. Já em 1926, a Câmara Municipal tinha nomeado uma Comissão para estudar um Plano de Conjunto, mas só a partir de 1938, surge o conceito de Plano Director, que se concluirá em 1948. Trata-se de uma mudança radical. O propósito do duplo centenário despoletou a execução de obras urgentes na capital. Foi a partir deste ano que a urbanização e a expansão da cidade passam a ser da exclusiva competência da Câmara Municipal. Esta elabora estudos e projectos e executa, cabendo-lhe excepcionalmente as aquisições e expropriações de terrenos - até 1951 deram ao município a posse de 35% da superfície total e a possibilidade de comercializar 135ha para os bairros programados, numa operação rentável. Diga-se que isto só foi possível graças ao peso político de Duarte Pacheco junto de Oliveira Salazar e ao facto de se viver sob um regime autoritário. A Câmara tem forte intervenção e os particulares vêm-se na qualidade de colaboradores da Administração, construindo em lotes dispostos pelo Município.

 

Lisboa constituiu o centro das atenções, a partir de 38, pois foi aqui que se realizou a Exposição do Mundo Português.

 

O Plano de 1938 foi definido pelo urbanista de origem russa Étienne de Gröer, como projecto ordenador, que seria corrigido e melhorado durante os anos quarenta. As linhas de força do chamado Plano de Gröer são:

 

  • Organização das densidades populacionais (decrescendo do centro para a periferia);

 

  • Criação de grandes vias circulares – pela introdução de uma série de radiais entroncadas nos grandes arruamentos citadinos; traça-se a Auto-estrada a caminho do Estoril, efectivamente até ao Estádio Nacional; pela beira-rio partem vias por Xabregas até aos Olivais; por Belém até Algés; nasce a Estrada Marginal Lisboa-Estoril; e dá-se o prolongamento da via radiocêntrica constituída a partir do eixo da Avenida António Augusto Aguiar, até à estrada Lisboa-Porto. Estas circulações são determinantes no desenvolvimento de novos bairros e arruamentos.

 

  • Planeamento do Parque Florestal em Monsanto (com cerca de 900ha) e de uma cintura verde em torno da cidade (Monsanto – Várzea de Loures – Tejo);

 

  • Construção de um Aeroporto na zona norte da cidade;

 

  • Traçado de uma ponte sobre o Tejo, ligando Poço do Bispo ao Montijo;

 

  • Introdução de uma zona industrial associada ao porto, na zona oriental;

 

  • Desenvolvimento de bairros residenciais nas periferias como Encarnação e  Alvalade (ver). Desta época são também os bairros do Alvito, Alto da Ajuda, Caselas, Belém e Madredeus- todos visavam a ruralização da população, implantavam-se em zonas isoladas (havia estímulo ao apego à casa, à família, ao Estado, à Igreja), copiando o modelo da aldeia portuguesa;

 

  • Concepção de uma Cidade Universitária.

 


Através deste plano, entende-se a vontade de Duarte Pacheco em dar expressão à urbe – ao valorizar o desenho do espaço colectivo, no controlo selectivo dos seus traçados estruturantes, dos efeitos visuais e dos focos monumentais.

 

Ana Ruepp