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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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OS 150 ANOS DO TRINDADE (III) – UM LIVRO DE EVOCAÇÃO E CELEBRAÇÃO

 

 

Este é o terceiro texto que, nesta série, dedico ao 150º aniversário do Teatro da Trindade, inaugurado em 1867. Outros textos se seguirão, pois não é demais, penso, referir, evocar e novamente analisar o que é hoje e o que tem sido, neste período, a exemplar estrutura e prática de cultura teatral e musical do Trindade: e isto, a partir da qualidade arquitetónica de origem (projeto do arquiteto Miguel Evaristo) e consagrada nas sucessivas alterações que, ao longo de século e meio, têm sido efetuadas, sem de modo algum desvirtuar o edifício, a sua funcionalidade e o património cultural-teatral inerente.  

 

Nesse sentido, tive o gosto de participar, em 2014 num ciclo de conferências organizado pela Fundação INATEL, proprietária do Teatro da Trindade. E foi agora editado pela Fundação um volume, “Conferências do Trindade” que reúne intervenções e textos diversos de Inês de Medeiros, Joaquim Paulo Nogueira, Isabel Pires de Lima, Luís Soares Carneiro, José Sarmento de Matos, Guilherme d’Oliveira Martins, Nuno Domingues e José Carlos Barros e da minha, no ciclo acima citado. (cfr. “Conferências do Trindade – História Cultural e Artística do Teatro da Trindade” ed. Fundação INATEL 2017).

 

Os textos introdutórios - “Um Palco de Todos Para Todos” de Inês de Medeiros – Vice Presidente do INATEL e diretora do Trindade – e “Fazer do Teatro da Trindade um Acontecimento Cultural” de Joaquim Paulo Nogueira, realçam precisamente a oportunidade do ciclo evocativo.

 

Pois, tal como refere Inês de Medeiros, “o que ressalta das leituras destes textos é uma certa continuidade na evolução, mesmo quando atribulada, deste Teatro, o qual sempre foi pensado como uma sala de espetáculos popular, com uma programação variada – tanto de teatro como musical – distinta e mais acessível do que a programação dos dois grandes teatros nacionais vizinhos: o D. Maria II e o São Carlos”. (cfr. “Um palco de Todos para Todos” cit., pág. 10).  

 

Teve-se então em vista, no ciclo e agora no livro citado, uma análise historicamente evocativa mas sobretudo culturalmente bem atual da atividade do Trindade na política teatral-musical dos anos decorridos desse a sua fundação (1867), inserindo-a aliás na dupla perspetiva de antecedentes históricos e de projeção para anos vindouros: e isto porque o Teatro da Trindade, ao longo deste tão variado século e meio de existência, soube alternar intervenções históricas e projeções de modernidade, numa ação constante de divulgação da cultura nas suas expressões de música, ópera e teatro.

 

Basta recordar, nessa perspetiva abrangente, o que significou, numa ação de política de cultura, por exemplo a Companhia Portuguesa de Ópera-CPO, dirigida por Serra Formigal, que viabilizou o profissionalismo do espetáculo lírico português, até aí residual no contexto das temporadas e das atividades profissionais e artísticas inerentes da tradicional ópera do Teatro Nacional de São Carlos, mesmo quando esses espetáculos se repetiam no Coliseu. Sem questionar obviamente a qualidade, tenha-se presente que não havia, antes da CPO do Trindade, viabilização de carreiras de cantores portugueses e acessibilidade mais alargada de público.

 

Mas tal como recorda Nuno Domingues, no ciclo de conferências citado e agora publicado, “a Companhia Portuguesa de Ópera não foi a primeira a atuar no Trindade. Em 1908, o empresário Afonso Taveira organizou uma Companhia Portuguesa de Ópera, que durou um ano”. (cfr. “O Trindade e a Ópera” in ob. cit. pág.159).  

 

No que se refere ao teatro declamado, é interessante recordar, com aliás fiz na conferência agora publicada, e que intitulei precisamente “O Trindade e o Romantismo”, a inauguração do Teatro, em 10 de Maio de 1867, com um espetáculo de declamação com intervenções de Bulhão Pato e Júlio de Castilho, nada menos.

 

E ainda, como referi na conferência, “a 30 de Novembro é inaugurado o conjunto Teatro da Trindade com duas peças: «A Mãe dos Pobres» de Ernesto Biester e «O Xerez das Viscondessa» que foi adaptado pelo grande empresário e diretor do Trindade até morrer em 1899 Francisco Palha”.

 

Descrevi então a importância assumida pelo Trindade na expressão pujante do teatro romântico em Portugal, bem como os elencos das companhias que, no Trindade, em dezenas de anos, recriaram o espetáculo teatral. E pude recordar que a música e a ópera alternavam, desde o inicio da atividade, com o teatro declamado: e neste, ganhava expressão o temário romântico na sua expressão sentimental, mas também, note-se, na sua expressão político-social. (cfr. “O Trindade e o Romantismo” in ob. cit. págs. 21 e segs.).

 

Mas há que insistir na constante atualidade que, em termos globais, o Trindade sempre soube manter. Certamente porque, ao longo do seculo e meio, e não obstante períodos intercalados se bem que breves de exceção ou apagamento, o Trindade marcou as épocas sucessivas da sua atividade. Ou como disse na conferência deste ciclo Guilherme d´Oliveira Martins, “As humanidades correspondem ao entendimento do género humano. As Humanidades são a compreensão de que, no «Auto da Lusitânia», não sabemos se «Todo o – Mundo e Ninguém» são os gémeos que Almada desenhou na fachada da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa ou se são diferentes como Gil Vicente os representou”… (cfr. “Pode a Economia Viver sem as Humanidades?” in ob. cit. pág. 147).

 

Ora bem: nos 150 anos decorridos, o Trindade não parou. E por isso, também apraz recordar, num plano de atualidade, o papel do Trindade numa modernização/renovação do teatro declamado português, e na atividade de espetáculo inerente, em períodos complicados da vida teatral portuguesa.

 

Em próximo artigo, evocarei alguns dos grandes espetáculos do Trindade: por exemplo, o que foi “À Espera de Godot” de Samuel Beckett!...

 

E referirei então os textos dos outros colaboradores deste livro evocativo das Conferências do Trindade.

 

DUARTE IVO CRUZ