Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

A FORÇA DO ATO CRIADOR

 

William Scott e os objetos simples (parte II)

 

'My experience in America gave me a determination to re-paint much that I left unfinished in terms of the symbolic still life. With the example of Ben Nicholson, whom I much admired, there was no reason for me to be devoted solely to abstraction and I embarked on a process of re-discovery.',

William Scott

 

Em 1953, ao regressar de uma breve estadia em Nova Iorque, William Scott veio com a certeza de continuar a fazer dos objetos simples um veículo para a abstração, mesmo a mais gestual. 

 

No livro da série British Artists 'William Scott' de Sarah Whitfield, lê-se que, a partir de meados dos anos cinquenta, William Scott pinta utilizando a memória não só das coisas simples do dia a dia mas também das pinturas de Courbet e de Bonnard.

 

Bonnard passou a ser uma referência. Bonnard desejava que cada quadro não tivesse um elemento central e preponderante e que fosse o espectador a construir a sua própria narrativa. As naturezas mortas de Scott também assim o anseiam - sobre a mesas descentradas dispõe-se pratos, tigelas, tachos e frigideiras, todos com o mesmo grau de importância. À volta da mesa adivinha-se por vezes uma figura que se confunde com os outros objetos, ou com a própria mesa. 

 

Scott mostra ter interesse por simples divisões geométricas - as divisões horizontais são retas, as mesas estão inclinadas para a frente e ocupam todo o espaço da tela, as tigelas e os tachos alinham-se junto às margens, existem espaços vazios cheios de sentido, estabelece-se um perfeito equilíbrio entre os objetos sólidos e a ausência desses mesmos. Scott deseja mostrar tudo, sem dar importância a nada. E sobretudo anseia criar uma imagem dupla e ambígua que pode ao mesmo tempo ser natureza morta e paisagem (ver Large Still Life, 1957).

 

No final dos anos cinquenta, Scott reagia em parte também contra a geometria hard-edge. E Whitfield escreve: 'His belief 'in the beauty of the thing badly done' is expressed in the way that he piles up layer after layer of different textures: for glossy paint, thin paint, paint scraped back almost to bare canvas, lines scrawled and scratched into the surface next to lines made by squeezing paint straight from the tube.'

 

Scott deixou-se impressionar pelas pinturas rupestres de Lascaux. A partir do início dos anos sessenta, as suas pinturas (ver 'White, Sand and Ochre', 1960-1) parecem ser feitas sobre uma pedra branca ou ocre - as marcas e as formas sobre a superfície assemelham-se cada vez com os signos enigmáticos da pré-história. Estes trabalhos deixam prever a perda de identidade dos objetos, que se irá fazer notar em grande medida nos trabalhos de toda a década seguinte.

 

Ana Ruepp