INFLUENCIA INICIÁTICA DE ALMADA NO TEATRO DE FERNANDO AMADO
Remetemos esta análise para diversas citações de extrema relevância. Personalidades distintas, obras e pensamento diversificado, os autores das citações coincidem na identificação de uma presença iniciática e de uma influência clara de Almada Negreiros na dramaturgia e no pensamento teórico de Fernando Amado. Aliás, é bem conhecida a amizade que os uniu e a colaboração que mantiveram, em especial na produção teatral.
Assim, em 1963, António Dias de Magalhães remete para Almada a influência futurista na primeira peça de Fernando Amado: “A sua atividade de escritor começou pelos 17 anos. O encontro do movimento do Orfeu, particularmente de Almada Negreiros, inspirou-lhe uma peça futurista, O Homem Metal ”. (In Enciclopédia Verbo, vol. I).
E Luis Francisco Rebello confirma: “tendo acompanhado, ainda muito novo, o movimento do Orpheu, e sob a influência mais direta de Almada Negreiros, F. Amado inicia aos 17 anos a sua obra teatral com uma peça futurista, - O Homem Meta l - que não chegaria a ser publicada nem representada” (in “Dicionário do Teatro Português” s. d.), A análise é retomada ao longo da vasta obra historiográfica de Rebello e designadamente em “Três Espelhos - Uma Visão Panorâmica do Teatro Português do Liberalismo ã Ditadura 1820-1926” (ed. INCM 2010)
Eu próprio, em 1972, aludo à peça, remetendo para António Dias de Magalhães: “a primeira peça escrita por Fernando Amado teria sido O Homem Metal, de expressa influencia futurista, recebida através de Almada Negreiros e do movimento do Orpheu, o que nos permite situar a respetiva data antes dos anos 20”, (in “Fernando Amado Homem de Teatro” ed. Cadernos Gil Vicente 1972). E em 2002 referi novamente a peça perdida, realçando a plausível influência do “futurismo” de Almada: “O teatro de Fernando Amado, ao menos na sua dimensão mais inovadora, está ligado à lição, ao modelo à amizade pessoal e cumplicidade artística de Almada” (in “História do Teatro Português” ed. Verbo 2001).
Finalmente: Augusto Sobral cita a peça precisamente em função do seu plausível cariz iniciático e modernista, frisando entretanto o contraste com a restante dramaturgia do autor: “ Claro que Fernando Amado não é um futurista apesar da sua tentativa de escrita de uma peça desaparecida - O Homem Metal - cujo título tem uma ressonância evidente, da admiração pelos homens do Orfeu e da amizade que conservou ao longo da vida com Almada Negreiros, de quem tinha uma escassa diferença de sete anos” (in “Fernando Amado - Peças de Teatro” INCM 2002).
O que seria “O Homem Metal”? E onde e como se manifestou, nessa peça iniciática, a influência de Almada Negreiros?
Perguntas sem resposta. Mas a análise, que iremos fazendo, da dramaturgia de ambos os autores e as referências recíprocas, testemunho de uma amizade e de uma colaboração criadora que duraria até à morte (Amado morre em 1968, Almada sobreviveu dois anos) permitem-nos imaginar o sopro de modernidade desta peça perdida.
E acrescente-se que o teatro de Fernando Amado, mesmo em peças de menor ambição renovadora, foi e é sempre de uma exemplar modernidade.
E o mesmo, obviamente se diga e dirá do teatro de Almada Negreiros…
DUARTE IVO CRUZ