ALMADA NEGREIROS E FERNANDO AMADO NAS ORIGENS DA RENOVAÇÃO DO TEATRO EM PORTUGAL
Temos referido o caracter inovador e globalizante, perdoe-se a ênfase dos termos mas são justos e adequados, da colaboração de Almada Negreiros e de Fernando Amado nas actividades teatrais, sejam de criação dramatúrgica, sejam de espectáculo. Diga-se agora que foi sobretudo neste plano que ambos mais directamente colaboraram, designadamente no Centro Nacional de Cultura ou na Casa da Comédia, nos anos 50/70. Mas o relacionamento pessoal vinha muito de trás e cruzou-se logo nos anos 20, nas primícias do modernismo teatral.
Luis Francisco Rebello recorda no Teatro Estúdio do Salitre ( 1946) “a presença de Almada Negreiros, Fernando Amado, Branquinho da Fonseca e João Pedro de Andrade, todos já então com uma considerável e relevante bagagem dramatúrgica mas ainda virgem da experiencia do palco” (in Teatro Estúdio do Salitre - Anos 60” ed. SAP e Publicações D. Quixote -1996). Assim é, mas a colaboração, repita-se, era muito mais antiga e assentava num relacionamento pessoal-familiar que se cruzaria por exemplo nos bailados da Condessa de Castelo Melhor, verdadeira iniciação do modernismo .
Nesse sentido, importa ter presente que tanto Almada como Amado são dramaturgos de grande relevo no plano da inovação estética - mas também, um e outro, na própria abundancia de produção. Almada já foi referido e iremos continuando a recordar e analisar, em próximos artigos, a sua dramaturgia.
No caso de Fernando Amado, temos notícia de algo como 28 peças, das quais cerca de 5 se terão perdido. As restantes estão publicadas e percorrem uma variedade considerável de registos estéticos e de vocação de espectáculo, digamos assim. Também as iremos analisar em próximos artigos.
Mas aqui, importa recordar sobretudo que Amado encenou em 1949 o “Antes de Começar” de Almada e revelou, em 1963, na Casa da Comédia, o “Deseja-se Mulher”.
A colaboração entre ambos durou décadas e assumiu com um plano teórico, estético e doutrinário, que urge recuperar. Não obstante, em 1999 é publicado um elucidativo “Diálogo entre Almada Negreiros e Fernando Amado” que contém uma notável elaboração acerca do fenómeno teatral (cfr. “À Boca de Cena - Fernando Amado” dir. Vitor Silva Tavares ed. ETC 1999).
E David Mourão Ferreira caracteriza o teatro de Amado como uma “dramaturgia poética e abrupta, simbólica e desconcertante, seduzida pelo mistério que paira sobre certas situações “ (in “Dicionário do Teatro Português”). O que até se poderia aplicar a algumas das peças de Almada…
Repita-se: a dramaturgia de Almada Negreiros e de Fernando Amado exige uma mais detalhada evocação critica, que iremos fazendo em termos da colaboração reciproca ou das obras autónomas respetivas. São numerosas as peças de um e de outro. E se Almada é mais recordado que Fernando Amado, importa então lembrar não só o teatro deste como a globalidade de abordagem de um e de outro;. E a respetiva colaboração!
DUARTE IVO CRUZ