Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!
Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!
Terra de ouriços, diz a antiga tradição sobre a origem da designação da vila. Discute-se, porém, se se trata de um ouriço-cacheiro (erinaceus europaeus) ou de um ouriço-do-mar (echinoidea). Não vamos discutir o tema, ainda que todos se inclinem hoje para o primeiro caso.
A povoação foi fundada pelos fenícios há dois mil anos, tornando-se uma das mais importantes da costa ocidental portuguesa. O primeiro foral é de 1229 e foi outorgado pelo Grão-Mestre da Ordem Militar de Avis, Frei Fernão Rodrigues Monteiro. Afonso IV (1369) e D. Manuel (1513) renovaram cartas de foral, e D. António, Prior do Crato, foi donatário da Vila, tendo planeado um desembarque gorado por ocasião da questão dinástica de 1580. A resistência das gentes da Ericeira manifestou-se antes da Restauração de 1640, tendo aqui tido lugar um dos episódios do sebastianismo, com Mateus Álvares, ermitão da capela de S. Julião, que seria condenado ao enforcamento a 13 de Junho de 1585, por não aceitar Filipe I… Temos também na retina as imagens da partida de D. Manuel II para o exílio…
A Ericeira é um lugar de memórias, que no século XIX se tornou lugar de veraneio, estação termal em Santa Marta e porto de pesca – o mais importante da Estremadura. Por isso, recordamos aqui as armas da Vila, com o famoso Ouriço e a aludimos à 4ª Alfândega do Reino, a seguir a Lisboa, ao Porto e a Setúbal.
E importa não esquecer que foram os pescadores da Ericeira que ensinaram a pesca no sul do Brasil, onde ainda hoje se lembra a mestria do mais célebre dos homens da Ericeira, o Ti Cachafana, Victorino Dias (1833-1907), símbolo de altruísmo, de sabedoria e de solidariedade! No Jogo-da-Bola ainda persiste a memória do Tio Victorino!
A crítica ao Modernismo – a introdução ao Pós-Modernismo
Será o Pós-Modernismo uma nova face do Modernismo?
O final de sessenta apresenta condições revolucionárias paradoxais, ao desejar erradicar a ideia de progresso, surgem fenómenos que voltam a olhar para o passado, para a tradição e até por vezes negando o processo de industrialização crescente. O termo pós-modernismo estabelece-se através de uma visão optimista. O prefixo ‘pós’ anuncia uma espécie de libertação, um vir ‘a seguir’.
Será que a tentativa de ultrapassar as falhas do Movimento Moderno gera já por si uma atitude pós-modernista? Existem autores que afirmam o Pós-Modernismo como sendo uma nova face do Modernismo, isto é, que o aceitam como um processo inacabado – ‘Postmodernism, as I see it, is not a new name for a new ‘reality’, or a ‘mental structure’, or ‘world view’, but a perspective from which one can ask certain questions about modernity in its several incarnations’ (Calinescu, Matei In ‘Five Faces of Modernity – Modernism, Avant-Garde, Decadence, Kitsch, Postmodernism’, Duke University Press, Durham, 2003). Ao questionarem-se os dogmas e as premissas irrefutáveis do modernismo constrói-se um novo processo que se concretiza num lugar real, que faz parte de uma determinada comunidade, que se individualiza pertencendo a alguém específico e que se abre à vida.
O Pós-Modernismo pode ser assumido como uma nova face do Modernismo através da introdução, substituição e cruzamento dos seguintes fatores:
Quebram-se os dogmas e os modelos absolutos racionais são criticados e substituídos por modelos em que a incoerência e a ambiguidade aparecem como virtudes. Decide-se pela lógica da renovação e não pela lógica da radical inovação – o pós-modernismo estabelece-se assim através de uma abertura ao antigo e ao passado (‘Quando olhamos para Gropius ou Le Corbusier o espírito moderno era a negação da história. Para os que vêm a seguir é a negação dessa negação. A história é uma grande lição. As pessoas são iguais mas também diferentes.’ (Manuel Tainha, 2008). A constante destruição do passado proposto pelo Modernismo conduz ao silêncio, às formas inócuas e puras e ao ser revisitado traz uma nova espessura e densidade aos objetos produzidos (muitas vezes irónica e corrompida).
Assiste-se à emergência da memória. A nova máxima a adoptar é a de que o criador é um colecionador de memórias e nunca trabalha a partir do zero. Cada sujeito pode aplicar diferentes modalidades de representação e de explicação da história – abre-se assim uma multiplicidade de caminhos, de pontos de vista e um enorme legado do qual o próprio modernismo faz parte.
A paródia e o absurdo são introduzidos como meio de expressão, como possibilidade face à exaustão da integridade do modernismo – a via do humor é uma herança surrealista e é muitas vezes a via mais imediata para chegar ao entendimento. Humor representa ambiguidade, escape, descontextualização, alteração de sentido, falsidade, superioridade, libertação de uma tensão, instinto, incongruência, distorção e paradoxo. (Calinescu, 2003)
Estabelece-se uma multiplicidade de linguagens, de normas estilísticas, de expressões e de autorias. O sujeito pode produzir objetos totalmente subjetivados – expondo experiências de vida interior e exterior. E o sujeito pode produzir objetos a partir de uma transmutação de personalidade –o sujeito pode tornar-se outro (muitas vezes explorando temas sociais e políticos). O fim do modernismo traz a emergência de um pensamento débil – que se deixa dominar, que não se impõe e é individual, temporal, local, tolerante e contraditória. A pureza das formas modernistas é substituída pelas formas quotidianas, banais, híbridas, pelo kitsch, pela degradação, pela destruição e pela decadência.
No final dos anos sessenta, autores como John Cage, Susan Sontag e Robert Venturi iniciam uma visão que desperta para a ‘verdadeira vida que vivemos’. Isto significa eliminar as fronteiras entre o modernismo e as restantes atividades humanas. Encorajam-se produções e atividades interdisciplinares, que podem criar formas mais ricas e polivalentes.
Ajudando a desfazer as certezas do Modernismo, Michel Foucault revelou a relatividade da moral e dos sistemas do conhecimento. Foucault admite a complexidade, a diferença e a incerteza. O ideal modernista de uma ordenada e autónoma obra de arte percepcionada por um espectador independente é refutado. Uma nova forma de subjetividade assenta na noção fenomenológica, onde o eu se revela através de um consciente liberto de preconceitos. Merleau-Ponty ao escrever o livro ‘Fenomenologia da Percepção’ em 1945 (e que teve um grande impacto na década de sessenta) revela que as relações entre o consciente e o mundo coincidem com as relações entre o corpo e a natureza e a percepção só existe assim que o eu e o mundo se ligam. Merleau-Ponty afirma a importância da interação física entre o fruidor e a obra para que haja verdadeiro entendimento. (Christov-Bakargiev, 1999)
Ao rejeitar as formas racionais e abstratas, o pragmatismo de John Dewey influenciou as novas gerações de artistas da década de sessenta. Dewey posicionou o ato criativo e a forma aberta do saber através da importância da experiência do mundo através da experiência inicial, espontânea e empírica. Em constante relação com as coisas vivas, o artista descobre-se a si próprio – o seu corpo, as suas memórias e os seus movimentos. Segundo Dewey, pode dar-se a experiência do sentido da vida e da natureza através da sensação, do sensacional, do sensível, da sensibilidade, do sentimental e do sensual. (Christov-Bakargiev, 1999)
O binómio Arte-Técnica (anunciado por Gropius no programa da Bauhaus) mantém-se como importante na produção da arquitetura da década de sessenta. Mas aponta antes na direção do reconhecimento da arte sem vanguarda, da valorização do trabalho anónimo (não autoral).
Na arquitetura renova-se o interesse pela tradição. A tradição é introduzida no sentido de que representa formas intemporais, o saber ancestral e o arquétipo. Tudo é passível de ser entendido como cultura. Por exemplo Heidegger afirma que a construção é habitar segundo o espírito da casa camponesa da Floresta Negra – só quando se pode habitar é que se pode construir. O que erigiu a casa não foi a máquina, mas sim a persistência do local, de um poder do habitar (permanecer em paz) e do ser, que situa a casa na encosta da montanha, ao abrigo do vento, voltada para sul, com sistemas adequados para as cargas de neve e os quartos virados para os lugares do nascimento. ‘Habitar’ para Heidegger revela-se segundo uma ocupação muito simples e que no entanto quando aplicada segundo uma verdade dá acesso ao ‘ser autêntico’. (Choay, 2005)