OS MAIS ANTIGOS TEATROS DE LISBOA - VII
O ODÉON
Desde logo se coloca aqui uma questão prévia - o Odéon foi concebido, criado e construído como cinema: o que não impediu que desde a origem fosse dotado de uma estrutura cénica adequada no espaço e no equipamento, e não tivesse funcionado como teatro musicado ou declamado, ainda que algo esporadicamente.
Em qualquer caso, o Odéon é ainda um teatro, com a característica arquitetónica, urbana e cultural de ter sobrevivido até hoje a mais de 10 anos de encerramento e incúria e a sucessivos projetos contrastantes de qualificação, recuperação e adaptação de fachada e interior, para funcionalidade comerciais diversas. A última, anunciada há menos de 1 ano, garantia a recuperação de alguns elementos estruturantes da sala, designadamente o teto e a boca de cena.
Há que dizer entretanto que o valor patrimonial do Odéon subsiste no exterior e no interior: trata-se com efeito de uma das raras expressões de arquitetura e decoração art deco em teatros, cinemas e cineteatros que ainda restam em Portugal com poucas e irrelevantes alterações – exceto, claro está, as decorrentes destes anos de abandono arquitetónico e funcional.
A vocação cinematográfica do Odéon vem da origem, foi projetado como cinema, por iniciativa de um grupo de empresários de Lisboa: e como cinema abriu portas em 1927 e durante anos foi, repita-se, a sua atividade dominante.
M: Félix Ribeiro recorda a inauguração, ocorrida em 19 de setembro de 1927: “O filme de estreia selecionado para a circunstância ajustava-se á importância do acontecimento – a Viúva Alegre, de Eric von Sroheim , com Mae Marray e John Gilbert nos protagonistas e que René Bohet, o excelente diretor da orquestra privativa sublinhou musicalmente com a segurança e o brilho a que viria a habituar o público”.. (in “Os Mais Antigos Cinemas de Lisboa” 1979 pag.135).
Em certa fase, já nos anos 50/60, “especializou-se” em filmes espanhóis e mexicanos, que estavam meses em exibição.
Nessa época, como bem recordamos, o eixo Restauradores-Avenida e imediações constituía o centro cinematográfico de Lisboa, com o Condes ao lado, o Olimpia em frente, o Politeama, o próprio Coliseu que também fazia cinema, e no eixo Restauradores- Rossio, o Éden, o Cinema Restauradores na cave do Éden e o insólito Animatógrafo do Rossio, que ainda hoje mantem a notabilíssima fachada arte nova. Iremos aqui recordar algumas destas salas.
Mas precisamente – o Odéon representa a expressão mais conseguida e consagrada da arquitetura de espetáculos dos anos 20. Diz-nos José Manuel Fernandes: “O interior é notável pela sua grande cobertura em madeira escura, pelo palco de frontão Art Deco, pelos bojudos volumes dos camarotes, pelo lustre central, irradiando néons” (in “Cinemas de Portugal”1995 pag.44).
O Odéon foi predominantemente cinema, mas a cena permitia por vezes intervenções teatrais ou musicais, estas por vezes na estreia dos filmes. Mas recordo há dezenas de anos o Professor Eurico Lisboa, que já aqui evocamos a propósito do Conservatório, a declamar em cena um texto dramático, não sei se de sua autoria…
DUARTE IVO CRUZ