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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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A FORÇA DO ATO CRIADOR

Rothko e o acto de pintar


Rothko e o ato de pintar.


‘Je souscris à la réalité concrète du monde et à de la substance des choses.’
Rothko, 1945

 

Mark Rothko em ‘Écrits sur l’art, 1934-1969’ (2007) escreve que a satisfação do impulso criador é uma necessidade biológica de base, essencial para o homem. O homem absorve e naturalmente exprime. Os sentidos do homem coleccionam e acumulam emoções, o pensamento transforma e ordena, e por intermediário da arte, essas emoções são emitidas de modo a fazer parte de um novo fluxo da vida – e que por sua vez, irão estimular a acção de outros homens. E a arte não é somente expressiva, ela é igualmente comunicável, e esta comunicabilidade determina a sua função social.

Rothko defende uma visão inata e natural no acto de pintar: uma linguagem tão natural como a da palavra ou do canto. Ao aplicar a palavra para contar histórias, narrar eventos o homem não o faz depender do conhecimento da gramática, da sintaxe ou das regras da retórica – fá-lo naturalmente, simplesmente fala. Da mesma maneira, o homem canta melodias e improvisa refrões muitas vezes sem conhecer nem a colocação correcta da voz e nem a harmonia. E por isso afirma que a pintura também deve ser uma linguagem tão natural como o canto e a palavra. É um processo que existe para registar uma experiência, visual ou imaginária, enriquecida com sentimentos e reacções humanas. E Rothko relembra que já as crianças assim o fazem – ‘...regardez ces enfants travailler et vous les verrez assembler des formes, des figures et des vues en arrangements picturaux, en employant par necessite la plupart des lois de la perspective optique et de la géométrie, mais sans le savoir. Ils agissent ainsi de la même façon qu’ils parlent, sans avoir conscience d’utiliser les règles grammaticales.’ Para Rothko, as crianças por necessidade interior de um enunciado que deve imediatamente ser realizado, produzem as representações mais instintivas por meio de símbolos muito expressivos e primitivos.

Rothko explica por isso, que no decorrer do seu trabalho desenvolve-se uma necessidade de evocar mitos da Antiguidade, que por serem, a seu ver, símbolos intemporais podem assim exprimir ideias psicológicas básicas – ‘Ils sont les symboles des peurs et des motivations primitives de l’homme, peu importent le pays ou l’époque.’ Carl Gustav Jung inclui o conceito de mito no conceito de arquétipo. Segundo Jung, o arquétipo é uma imagem padrão primordial, original, património comum a toda a humanidade e portanto universal. É uma forma onde todas as qualidades humanas podem tomar lugar. É um conjunto de ideias elementares, presentes no inconsciente. O arquétipo não depende de influências exteriores. Em toda a psique existem formas que inconscientemente são activas – pré-formam e continuamente influenciam pensamentos, sentimentos e acções. O arquétipo é determinado segundo a forma e não o conteúdo - conteúdo é aqui entendido como experiência consciente. A forma corresponde ao instinto. O arquétipo é uma representação não herdada, é dada a priori. Carl Jung propôs o termo, arquétipo, para ser um sistema de prontidão para a acção e, ao mesmo tempo, para imagens e emoções. É herdado junto com a estrutura cerebral. Por isso no acto de pintar, Rothko ao recorrer ao mito procura pelas raízes primordiais (inconsciente/instinto) e fá-lo sempre de maneira a incluir a sua própria experiência (consciente).

 

Ana Ruepp