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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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ATORES, ENCENADORES (VIII)

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EVOCAÇÕES, DESLOCALIZAÇÕES

 

Faz-se hoje referência a dois aspetos distintos de uma política, digamos assim, de descentralização e deslocalização teatral: atores, encenadores, que ou fizeram a carreira fora de Lisboa, ou que foram devidamente homenageados fora de Lisboa. E tenha-se presente que esta circunstância não é despicienda, dada a secular centralidade do teatro-espetáculo em Portugal.

Referimos, nesse aspeto, em primeiro lugar, Rosa Damasceno (1849-1904). E se a cito, é porque, tal como vimos no artigo anterior com o ator e os Teatros Taborda, o prestigio de Rosa Damasceno manteve-se até muito depois da sua morte: e sobretudo, justificou, a partir de 1893, a denominação de Teatro Rosa Damasceno a um velho Teatro de Santarém, erguido em 1894 no local onde existira a Igreja de São Martinho, e onde, desde pelo menos 1810 se produziam espetáculos. E não só: há noticia de uma representação do “Frei Luis de Sousa”, em 1847, no antigo Convento de São Domingos, espetáculo de que Herculano dá notícia.

De qualquer maneira, o que agora interessa é que a carreira de Rosa Damasceno justificou a homenagem.

 Esse primeiro Teatro Rosa Damasceno deve-se a um projeto de José Luis Monteiro e  dele ficou a memória de uma sala imponente, com 800 lugares entre plateia, 60 camarotes e geral. Seria substituído em 1938, no mesmo local, por um novo Teatro Rosa Damasceno, este da autoria do Arquiteto Amílcar Pinto: “obra prima da arquitetura moderna e da art-deco em Portugal” escreveu Jorge Custódio. (in  Relatório para a CMS citado em Duarte Ivo Cruz- “Teatros de Portugal”- 2005) E só é de lamentar que tenha sido votado ao abandono durante décadas ,não obstante a notável fachada e a qualidade arquitetónica do interior.

A atriz Rosa Damasceno estreou em 1867 no Teatro da Trindade  com um dramalhão intitulado ”A Mãe dos Pobres” de Ernesto Biester.  Casada com o ator Eduardo Brazão, cumpriu uma longa carreira no Teatro D. Maria II e no Teatro D. Amélia,  com destaque para o que era, na altura, o teatro romântico e contemporâneo  português, em estreias de peças ou de adaptações, desde Garrett a Júlio Dinis, a D. João da Camara e  ao então estreante Júlio Dantas: mas também os clássicos portugueses, e ainda Shakespeare, Molière, Tolstoi, e muito repertório romântico e ultrarromântico francês, ou seja, o repertório “moderno” da época.

Avancemos algumas dezenas de anos.

Vamos então encontrar, a partir de 1953, o Teatro Experimental do Porto - TEP, fundado e dirigido, até 1961 por António Pedro (1909-1966). Tal como noutro lado escrevi, a sua marca sente-se “no combate por uma renovação do espetáculo teatral nos Companheiros  do Pátio das Comédias ou sobretudo, nos anos 50, no Teatro Experimental do Porto ou e na magnífica reflexão erguida sobre uma notável sabedoria técnica que é o Pequeno Tratado de Encenação”. (in “História do Teatro Português” - 2001).

Deveu-se-lhe sobretudo como encenador uma obra decisiva de renovação da cena portuguesa, escreveu Luis Francisco rebello (in “100 Anos de Teatro Português – 1880-1980” – 1984). Mas António Pedro é também um dramaturgo de qualidade, sobretudo em linhas de conciliação do sentido técnico-dramático com uma modernização de estilos e técnicas de espetáculo, patentes tanto nas encenações como na próprias peças de sua autoria:  “Teatro – Comédia em um Ato”,  “Desimaginação”,”Andam Ladrões cá em Casa”  “Antígona”,  “Reginaldo” e “O Lorpa”.

Mas sobretudo, António Pedro foi um grande homem de teatro, no sentido mais abrangente. Contribuiu, como diz Luciana Stegagno Picchio, para dar “um cunho especial” ao teatro português. (in”História do Teatro Português” – 1962).

E basta recordar os autores que encenou no TEP,  entre 1953 e 1961, de acordo com um rigorosa levantamento feito por Carlos Porto (in “O TEP e o Teatro em Portugal” – história e imagens” – 1997):

Léon Chancerel, Egito Gonçalves, Anton Tchekhov, Arthur Miller, Jean Cocteau, Victor Ruiz Iriarte, Shakespeare, Sófocles, António José da Silva, J. M. Synge, Guilherme  Figueiredo, Romeu Correia, John Steinbeck, Bernardo Santareno, Eugene ONeill, António Pedro, Oscar Wilde, Miguel Torga, Camilo, Ben Jonson, William Faulkner, Molière, Armando Martins Janeiro, Ugo Betti, Bernardo Santaremo, Pedro Bloch, Raul Brandão, Ionesco, Ibsen, Francisco Ventura…

Assisti a muitos desses espetáculos,  ouvi e  falei com António Pedro: e tudo isto é inolvidável.

 

DUARTE IVO CRUZ