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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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A FORÇA DO ATO CRIADOR

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Christopher Alexander e o sistema de vizinhança. 
 

‘People need an identifiable spatial unit to belong to.’, Christopher Alexander, 1977
 

Como aproximar o Homem à cidade?

A ideia de sistema de vizinhança traz o Homem à sua comunidade - fá-lo identificar-se com o espaço em que vive. De acordo com Chritopher Alexander (1936), em ‘A Pattern Languange’  (1977) o conceito de vizinhança varia de povoação para povoação, de cidade para cidade, de pessoa para pessoa. Porém, um sistema de vizinhança consistente está protegido em relação à totalidade da cidade – tem tamanho reduzido [em área e em população (cerca de 400 a 500 habitantes)] e é constituído, essencialmente por vias de acesso local (‘A neighborhood can only have a strong identity if it is protected from heavy traffic.’, Alexander, 1977)]. O limite da vizinhança é necessário para tornar o lugar identificável, singular, único.

A existência de um lugar não depende somente das suas condições reais, mas acima de tudo varia de acordo com a atribuição humana de significados e interpretações. O Homem cria o lugar, ocupa-o. É determinante, reforçar que não é uma superfície física forte que forma a fronteira, que divide o interior do exterior. O que de facto formaliza a fronteira de uma vizinhança é a coerência do seu conteúdo. Uma vizinhança é uma subcultura em dimensões reduzidas – as funções introduzidas não se relacionam com a resposta a grandes necessidades de consumo e de trabalho (estas necessidades maiores associam-se ao espaço que envolve estes lugares). Uma vizinhança, com menos de 500 habitantes, necessita somente de cumprir necessidades básicas – este factor também ajuda a determinar uma fronteira, uma parte distinta da cidade.

Uma vizinhança deve, assim ser uma parte distinta da cidade com fronteira capaz de manter o carácter do lugar morfológico – poucos arruamentos circundantes devem ligar-se à sua grelha.

É possível formalizar o lugar identificável, a proximidade, a vizinhança e a comunidade?

Segundo Christopher Alexander, a formalização é actualizada através de determinadas condições urbanas. E para que se constituam Sistemas de Vizinhança é necessário cumprir os seguintes factores:

a) Nós de actividade: os caminhos principais das vizinhanças devem convergir para centros de actividades, i.e., manchas vitais para a vivência de uma comunidade. Estas actividades, quando colocadas numa comunidade, têm de estar associadas aos seus caminhos mais importantes. O objectivo é criar concentração de pessoas através do agrupamento denso de funções que se combinam em torno de um espaço público reduzido. É essencial criar nós de actividade nas extremidades dos caminhos mais relevantes (os caminhos pedestres devem convergir para estes nós) e permitir o contraste entre actividade e residência numa escala reduzida. As vias pedonais mais importantes devem concretizar diferentes hierarquias de espaço público – na proximidade dos nós, mais largas; nas extremidades mais residenciais, mais estreitas.

b) Hierarquia Privado/Público: cada vizinhança contempla três locais ideais para habitação:

  • Próxima de nós de actividade – ao longo de caminhos ao longo de serviços, bem abertos e receptivos a actividades variadas e a multidões, que encorajam actividades e tráfego apressado e em quantidade.
  • Entre nós de actividade – ao longo de caminhos de ligação entre os nós mais calmos e os mais centrais e activos.
  • Isolada – ao longo de caminhos separados dos serviços, estreitos e tortuosos para evitar movimento automóvel.

c) Fronteira: existe pela coerência do conteúdo de um sistema, pelos acessos restritos e por entradas marcadas. A existência de fronteira protege, fortalece e realiza as funções que a envolvem. A mais importante característica da fronteira de uma vizinhança é o seu acesso restrito – vizinhanças claramente definidas só são servidas por determinados caminhos e vias – é importante a presença do limite (este pode ser entendido, planimetricamente através do desenho dos arruamentos em T). Se o acesso, à vizinhança é restrito, os pontos de acesso tornam-se importantes – estes pontos são designados por gateways e marcam a passagem para a vizinhança. As gateways permitem identificar mais claramente a vizinhança, sobretudo as suas fronteiras/limites. As fronteiras não só identificam, protegem, mas unem vários sistemas de vizinhança da cidade. A fronteira pode estar associada a espaços de encontro e a funções comuns a variados sistemas de vizinhança (parques de estacionamento, serviços, equipamentos, espaços verdes, ruas comerciais).;

d) Ligação entre Edifícios: a ligação física entre edifícios cria automaticamente espaços vazios positivos. Edifícios isolados contribuem para uma sociedade fragmentada – espaço livre entre edifícios pode contribuir para a formação de espaços sem utilização e sem relevância;

e) Fachadas do Edificado: permitem o desenho de alinhamentos, de contenções, de convergências. A disposição dos edifícios ao longo do espaço público faz com que participem desse espaço (ao contrariar o alinhamento do edificado a definição do espaço público como espaço social pode perder-se);

f) Relação de Edificado com o Espaço Exterior: através da introdução de aberturas estratégicas no edificado – por exemplo através das arcadas permite-se a introdução de caminhos no edificado, protegidos, contínuos que garantem a ligação entre edifícios, a interacção entre pessoa e edifício, entre espaço público e privado. Esta aproximação é maior e mais bem conseguida sempre que o edificado não excede os quatro pisos;

g) Espaço Vazio Positivo: a existência de espaço comum permite a concretização de um sistema social. Atenta-se, aqui, ao espaço que se estende do privado para o público, ligado à rede comunitária por excelência. O espaço comum garante zonas de encontro entre as variadas actividades. A percentagem ideal de espaço comum é de 25% para 75% de área privada. Em geral, o espaço deliberadamente sobrante entre edifícios não é utilizado. Existem dois tipos de espaço sobrante – o positivo e o negativo. O espaço é negativo sempre que é informal (sem forma, sem controlo), provoca espaço residual deixado entre edifícios, meramente colocados no território. O espaço é positivo sempre que se apresenta formal, isto é, sempre que a sua forma é tão importante quanto a forma dos objectos que o desenham. Se o espaço é negativo/sobrante, os edifícios identificam-se como objectos. O espaço positivo apresenta dois conjuntos formais – o espaço construído e o espaço não construído. O espaço positivo e negativo também se define através do grau de convexidade e contenção dos objectos existentes. Os espaços positivos são, parcialmente contidos e a sua área é definida por fronteiras, mas também por espaços de convergência – é espaço convexo, tendencialmente utilizado. O espaço negativo não é determinado por fronteiras, apresenta uma extensão não formalmente limitada – é espaço não convexo, tendencialmente não utilizado. O ideal é garantir ligação entre espaços positivos e evitar encerramento total.

h) Pequenos Espaços de Encontro: Os pequenos espaços de encontro representam numa vizinhança os nós de actividade. A tendência para a existência de praças com grandes dimensões provoca, na verdade espaços sem vida – o ideal dimensional é de 20m de largura. Os pequenos espaços de encontro têm de ser claramente perceptíveis pela própria disposição dos objectos construídos e devem estar incluídos numa hierarquia de espaços públicos.

i) Espaço Canal: é necessário considerar a rua como local de acesso, de movimento e de encontro. A rua é determinada pelo processo do andar – processo directo ou sinuoso que liga sucessivos e concretos objectivos. É espaço de encontro, de permanência e não espaço de passagem. Para promoverem a permanência, a forma da rua tem de se apresentar ligeiramente convexa.


Ana Ruepp