Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!
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O debate orçamental tem os seus Orwellian moments, mas sagra o Chancellor of the Exchequer como o Tory Crown Prince. Com a atenção da City desviada para as crises em Greece e China, e ainda protestos anti austeridade em Westminster Square a par de uma fresca chuva para arrefecer ânimos mais exaltados, July 8 fica no calendário da House of Commons como o Osborne's big day. Tal qual em Brussels July 12 datará uma capitulação helénica que repisa um Treaty of Brest-Litovsk em 1918 imposto aos bolcheviques.
A Eurozone exige a Athens €50b em ativos estatais num offshore trust para privatização. — Chérie, parfois le remedè est pire que le mal! A disciplina alemã envolve Athens após 17 horas de tensas negociações num Euro Summit que adia a Grexit, com Berlin e Paris nos papéis de bad cop/good cop. — Hmm. A good word costs no more than a bad one. Em Wimbledon, é outro clássico trio: Mr Andy Murray perde para Mr Roger Federer que perde para Mr Novak Djokovic. Srebrenica revive o massacre de 8,000 muçulmanos numa Bosnia ainda dividida 20 anos depois. The Queen prepara o seu 90th anniversary com um piquenique para 10,000 pessoas vindas de todo o reino, agendado para 2016 June 12.
Fantastic sunny days at London, with spells of rain among fresh and cooler North winds. Wimbledon e o Palace of Buckingham atraem fotos e olhares dos fervilhantes turistas em volta. E quão excitantes são estes dias. Nos relvados do All England Club é o Roger and Murray out nas meias finais até aos triunfos de Mr Novak Djokovic e Ms Serena Williams no Grand Slam. A tranquilidade é também polvilhada pelo som de gloriosas máquinas voadoras em St James. Passam 75 anos sobre o início da Battle of Britain e da glória de quantos Sir Winston Churchill aponta à posteridade como obviando a invasão nazi ao garantir a supremacia nos céus face à temível Luftwaffe. A Queen e os Princes Philip, William e Edward saúdam o voo de Spitfires e Hurricanes, mas sobretudo homageiam o espírito britânico e agradecem a bravura dos the last of The Few — veteranos como o squadron leader Tony Pickering, o wing commander Paul Farnes ou o flying officer Ken Wilkinson. As Armed Forces recebem até boas notícias: o UK cumpre com a meta orçamental da NATO de afetar 2% do GDP à segurança e defesa.
Neste ambiente de traditional & happy cosmopolitism se ergue RH George Gideon Osborne como futuro candidato à Premiership pelos conservadores. O Chancellor prometera a bold Summer Budget e cumpre com radical proposta. Anuncia “a compulsory national living wage of £9 an hour by 2020” e retira das mãos do rival Labour a bandeira do “minimum wage” que antes criticara para por instantes levar o seu partido ao rubro. “Fantastic,” grita o habitualmente reservado Work & Pensions Secretary, RH Ian Duncan Smith, em acesa sessão nos Commons. O dá-e-tira exige muitas contas, porém, pois é diferenciado no tempo. Para já congelam-se ou extinguem-se benefícios sociais enquanto os aumentos salariais são progressivos na legislatura. No insuspeito The Times escreve Mr David Aaronovitch fina bissetriz: "Blessed are the rich, for they shall inherit more. The limit on child tax credit penalises the poor at the same time as inheritance tax changes benefit the wealthy." Já o insuspeitíssimo Institute of Fiscal Studies nota pela análise de Mr Paul Johnson que “benefit freeze to hit 13m families.” Isto é: os “big losers” das novas políticas do blue collar conservatism são os pobres que trabalham.
Ainda no No. 11 de Downing St. regressa à poker face que o carateriza o antigo speechwriter de RH William Hague quando Conservative Party Leader. A aura de The Next Prime Minister aguarda sólida prova nas medidas do Exchequer inscritas na Finance Bill 2015, lei de July 15th que pavimenta os debates nas Houses of Parliament a par da Charter for Budget Responsibility. No entretanto avultam os devil details do “Greece Deal” que assombrará a Europen Union por muito tempo. O Spielgel chama-lhe “Der katalog der grausamkeiten”: o catálogo de crueldade! O estado da matéria revela maior grandeza líquida noutras altitudes. A Nasa’s New Horizons aproxima-se de Pluto na first scientific observation de um quase-planeta descoberto em 1930 e do qual tanto se especula quanto pouco sabemos, ora finalmente passível de real escrutínio numa missão que soma nove anos de vida e 4.67 mil milhões de milhas de viagem interestelar. Na gasosa eternidade voga já Mr Michel Demitri Shalhoub aka Omar Sharif, um bridge player que parte aos 83 anos legando-nos no cinema um inesquecível Doctor Zhivago (1965) e uma fantástica parceria anglo-árabe com Mr Peter O'Toole em Lawrence of Arabia (1962). — Well! Handsome is as handsome does.
A leitura de «Diário da Abuxarda – 2007-2014» de Marcello Duarte Mathias (D. Quixote, 2015), o volume quinto das Memórias «No Devagar Depressa dos Tempos», confirma plenamente o que conhecíamos, mas talvez sintamos agora mais a liberdade de espírito, que sempre o caracterizou.
UM EXÍMIO MEMORIALISTA Marcello Duarte Mathias é um exímio memorialista de longo curso. Os seus diários permitem-nos seguir uma análise tantas vezes inesperada ou até desconcertante do mundo, do tempo e das pessoas, para além da epiderme dos acontecimentos. Perante os sinais evidentes de uma crise perturbadora, Marcello aponta-nos sinais de uma sociedade frágil e por vezes incapaz de perceber os erros e as armadilhas que a afetam e tolhem. Apesar de dizer o contrário, a verdade é que o autor convive bem com a realidade de todos os dias. Pode ser que sinta assim, mas nós, os seus leitores, facilmente percebemos que a sua capacidade imaginativa permite a lucidez de olhar a história expurgada da força da ilusão. Afinal, a imaginação permite vermos as pessoas e os acontecimentos na sua justa expressão, sem grandiloquências nem efeitos da usura do elogio. «Já perdi a conta das vezes em que troquei a identidade e voltei a nascer, bem como daquelas em que morri por caminhos desviados! – nem sempre heroicamente, diga-se de passagem. (…) Somos dois afinal, eu e a minha imaginação, andamos sempre de braço dado, lado a lado. Reencontramo-nos a qualquer hora do dia ou da semana e a conversa nunca esmorece». E quando o memorialista assim procede facilmente somos confrontados com a apreciação da realidade e com a invocação de comentários e aforismos que nos permitem perceber melhor os factos para além das aparências. Cioran é lembrado: « Ce ne sont pas les pessimistes, ce sont les déçus qui écrivent bien»… E Teolinda Gersão : «Somos um país inventado pela televisão».
O QUE NÃO DEVE SER ESQUECIDO A obra lê-se com prazer e nela encontramos justíssimas lembranças de quem não deve ser esquecido. Sentimos, com emoção, a lembrança de Ana Vicente, a propósito do seu livro «Memórias e outras histórias». A fé religiosa e a coerência moral nas atitudes, levam-nos a compreender que «a nossa salvação – essa espécie de lealdade para connosco, que deverás ser a primeira de todas elas! – é uma conquista de todos os dias». Na doença, como sempre na vida, a Ana foi exemplar. Também encontramos António Tabucchi, «um homem cuja bondade vivia em permanência ferida pelos males e horrores do mundo, com os quais não de conformava. Com os quais nunca verdadeiramente se conformou. Homem bom como aquele que, não sendo um ideólogo, tem dentro de si um eterno ideal de justiça, e que a essa aspiração, a esse código de honra, a essa dimensão moral se mantém fiel contra ventos e marés». Sobre Vasco Graça Moura, diz que «era uma grandiosa biblioteca que, de tão vasta e antiga, ninguém sabia ao certo a data da fundação. Nascera com ele? Ou precedera-o de alguns séculos?». Se remava contra a maré, acreditava que «a cultura é o outro nome da liberdade». Que melhor compreensão para o poeta e ensaísta que tão bem pôde entender Dante ou Camões… Quantos outros exemplos? Sobre António Pinto da França: «discorria com igual facilidade sobre o passado e o presente sem verdadeiramente os distinguir, como se correspondessem a uma mesma unidade de tempo». De Augusto de Athayde é lembrada a menina de seus olhos, o Jardim José do Canto em S. Miguel, «a pátria essencial das minhas raízes» (como dizia) – sendo o patriotismo «inerente à sua pessoa, onde entrava uma dose de misticismo e de nobreza de alma, e também de respeito pelo imaginário coletivo…». Mas fica-nos ainda na memória a invocação de Pedro Moura e Sá (1908-1959), autor de «Vida e Literatura», uma das obras de referência de Marcello. Praticamente desconhecido hoje, a obra singular que nos deixou é obrigatória. Leitor de Moravia, privou com Ortega y Gasset, Gabriel Marcel, Nemésio e Giraudoux. «Havia nele uma irradiação espiritual que corresponde ao melhor da tradição intelectual que corresponde ao melhor da tradição intelectual europeia. “Abria-se e, por isso, recebia” dirá de Carlos Queirós, companheiro de sempre. O mesmo se lhe aplica com igual equidade».
OLHAR EM VOLTA O desenho das memórias permite-nos descobrir o que o escritor encontrou à sua volta. A propósito de Leonor Xavier, invoca o livro extraordinário «As Casas Contadas» e o seu lado tocante: «a dívida de gratidão ainda emocionada de quem não se esquece das seduções em tempos vividas. Todo o livro de memórias é uma ponta lançada entre várias margens». De Mia Couto, «a magia da escrita lembra o melhor da prosa brasileira: fácil, coleante, inventiva». Leitor incansável, o memorialista, a cada passo, regista o que de melhor encontra. De António Alçada Batista, diz que «a aventura eram os amigos, e a amizade um longo convívio permanentemente renovado, tão grande como a vida ou maior do que ela. Andou de início por Paris, como tantos da sua geração, e acabou por redescobrir Portugal ao descobrir… Cabo Verde e o Brasil». De Eduardo Lourenço, refere «uma saudável irreverência, uma ironia contundente e alegre, uma frescura de alma, se assim me posso exprimir, que pouco ou nada transparece naquilo que publica. E é pena. Eis um homem que ganha em ser conhecido!». Sem caráter sistemático, estes diversos exemplos permitem-nos perceber como a leitura deste «Diário da Abuxarda» nos revela a lembrança, paredes meias com a imaginação… Ao recordar diversos episódios de encontros inesperados de figuras marcantes, sente-se um especial prazer na lembrança do caso de Camus, autor da predileção de Marcello D. Mathias: «De passagem por Paris, em 1952, Hannah Arendt escreve ao marido: “Estive ontem com Camus: ele é, indiscutivelmente, o melhor homem (the best man) de França, no momento atual. Muito acima de qualquer intelectual”». Como e onde se encontraram? Poderia ser tema de um romance. Santo Agostinho era mestre de ambos, e possuíam «uma mesma autonomia mental». Já Stefan Zweig é-nos apresentado como um velho conhecido: «tenho a impressão de ter pessoalmente convivido com ele em sua casa, em Kapuzinerberg, nos arredores da sua cidade de Salzburgo…». É como se tivessem conversado, designadamente sobre «O Mundo de Ontem», em virtude de os mundos do memorialista serem todos de ontem… A propósito de Tony Judt, há a acusação da miopia dos intelectuais europeus depois de 1945, que passaram ao lado da Ideia Europeia, a «grande revolução ideológica desse tempo», com a exceção de Denis de Rougemont, que tinha a boa desculpa de ser suíço… O livro é um conjunto de preciosas recordações e considerações do escritor atento e do cidadão inquieto, num tempo de muitas incertezas e resgates. Fica uma última nota. Marcello refere-me como tendo-lhe eu apresentado pessoalmente Claudio Magris, o que até é verdade, mas há muitos anos foi M. D. M. que, no Aeroporto de Lisboa, me sugeriu a leitura urgente de «Danúbio». Aí se deu a autêntica apresentação, mas em sentido inverso… Fiquei-lhe eternamente grato!
Venho passando mal estes últimos dias, voltam a assediar-me maleitas e fantasmas... Serão incómodos, muito incómodos por vezes, não me afligem nunca mortalmente. Logo aos meus oito anos, quando fui apanhado, com meu pai, numa tempestade de neve, com vento doido que nos levava o carro, perto de Burgos, por estradas de Espanha ainda feridas da guerra, aprendi a reconhecer a morte como inevitável companheira de qualquer dia... Não me assusta já, interroga-me ainda. Morrer é sair do tempo e do espaço, e estes foram inventados por nós, para nossa referência e sossego. Antropólogos defendem que o ser religioso nasce com o humano consciente de que é mortal. E não será isso, Princesa, o que nos diz a narrativa de nos descobrirmos nus no momento da expulsão do paraíso? Encontramo-nos no espaço e no tempo em que estamos, percebemos que eles nos fogem, e vamos procurar-nos sendo eternos no infinito. Desde que comecei a sentir "o peso dos anos" na dificuldade crescente em recuperar de esforços e de falhas físicas, fui ganhando serenidade perante uma morte sempre evidentemente mais próxima. Tornei-me muito mais crítico da minha vida passada, simultaneamente mais lúcido e mais tolerante com os outros e comigo. Sem ter sido um revoltado, nunca fui acomodatício, menos ainda resignado; ainda hoje as minhas irritações são sobretudo "filosóficas", nascem do meu inconforto com o adquirido, horroriza-me a ausência ou desistência de interrogações, a presunção da posse de certezas totais e definitivas. E talvez por esse "mau feitio" eu seja, afinal, profundamente religioso: o sonho da minha vida é ver a Deus. Não consigo defini-lo, Deus é imenso; como não posso confundir a alegria do evangelho, a boa nova, com o código do direito canónico. Chegado a esta minha idade, olho para a morte como uma porta que se vai abrir à minha frente, para eu entrar na visão da luz. Espera-me a misericórdia última, aquela de que o menino que fui, aos oito anos, em noite terrível de tempestade, esperava que o salvasse desta. O Bernardo Soares, esse Fernando Pessoa disfarçado em empregado de comércio, "homem que aparentava trinta anos, magro, mais alto que baixo, curvado exageradamente quando sentado, mas menos quando de pé, vestido com um certo desleixo não inteiramente desleixado..." Esse tal, em cuja "face pálida e sem interesse de feições um ar de sofrimento não acrescentava interesse, e era difícil definir que espécie de sofrimento esse ar indicava - parecia indicar vários, privações, angústias, e aquele sofrimento que nasce da indiferença que provém de ter sofrido muito" escreveu no seu Livro do Desassossego: Somos morte. Isto, que consideramos vida, é o sono da vida real, a morte do que verdadeiramente somos. Os mortos nascem, não morrem. Estão trocados, para nós, os mundos. Quando julgamos que vivemos, estamos mortos; vamos viver quando estamos moribundos. Dmitri Shostakovich compôs, diz-se, a sua 14ª sinfonia, por 1969, seis anos antes de morrer, durante um dos períodos em que esteve internado para tratamento cardíaco. Ouço-a agora, no registo de 2005, da Orquestra da Rádio da Baviera, dirigida por Mariss Jansons. De Lorca a Rilke, passando por Apollinaire e um poema de Küchelbecker, ela percorre meditações sobre a morte. Toda essa sinfonia é o percurso musical de um compositor por poemas em que se sente vivo sentindo-se moribundo. É verdade que, por ocasião de uma récita da mesma, em 21 de Junho de 1969, Shostakovich declarava que a morte nos espera a todos, e não vejo nada de bom em tal fim das nossas vidas, e é isso mesmo que quero transmitir nesta obra... Mas também sabia o que eram mundos trocados, quando, julgando viver, estamos mortos: padeceu décadas de estalinismo, tivera já, em Dezembro de 1926, de passar o exame obrigatório de ideologia marxista, para poder continuar a estudar no Conservatório de Leninegrado. Passei esta tarde, Princesa talvez estranha à contemplação do que é invisível, a perseguir a morte enquanto existência ignota, fantasma permanente da vida, mistério que também esse compositor "soviético" (ateu? agnóstico?) pressentia nos poemas que, vertidos para a sua língua russa, o conduziam pela tecitura dos passos da angústia e da agonia. Abre a sinfonia com o De profundis do Lorca, que é uma paisagem da morte, dessa que nos esconde debaixo da terra: Los cien enamorados / duermen para siempre / bajo la tierra seca. / Andalucia tiene / largos caminos rojos. / Córdoba, olivos verdes / donde poner cien cruces, / que los recuerden. / Los cien enamorados / duermen para siempre. A morte enterra-nos e encerra-nos. Do outro lado da vida apenas cruzes nos recordam no remanso dos olivais a que levam os caminhos percorridos... Estão elas postas do lado por onde, antes de nos levar, a morte nos perseguia: La muerte / entra e sale / de la taberna. / Passan caballos negros / y gente siniestra / por los hondos caminos / de la guitarra. / Y hay un olor a sal / y a sangre de hembra, / en los nardos febriles / de la marina. / La muerte / entra y sale, / y sale y entra / la muerte de la taberna. Este segundo tema da sinfonia - não já pelo baixo que canta o primeiro, mas pela soprano - intitula-se Malagueña, e vem também de El Canto Jondo do poeta andaluz. Shostakovich passa de Lorca a Apollinaire, ao qual vai buscar seis dos poemas dos onze movimentos da 14ª. O primeiro, aliás, inspira-se em Clemens Brentano, poeta alemão que, no início do sec. XIX, em passeio pelo Reno, com seu amigo e futuro cunhado Achim von Arnim, recolhe memórias de canções populares entoadas pelos tripulantes do barco, para as coligir no Des Knaben Wunderhorn, cujas letras serão musicadas, mais tarde, por Gustav Mahler.A Loreley, sereia do Reno, na versão de Guillaume Apollinaire traduzida em russo, é uma história de feitiço, de amor bruxo (À Bacharach il y avait une sorcière blonde / qui laissait mourir d´amour tous les hommes à la ronde...), que termina com a morte da própria feiticeira, quando esta, iludindo-se com o que toma por presença do seu perdido amor nas águas do rio, nelas se precipita. Mas como se a perseguição do amor, que tanta gente mata, fosse humanamente narcísica: ellesepenche alors et tombe dans le Rhin, / pour avoir vu dans l´eau la belle Loreley, / ses yeux couleur du Rhin, ses cheveux de soleil... Os outros cinco poemas de Apollinaire reflectem, afinal, a inevitabilidade absurda da morte, o beco sem saída, como prisão desesperada: seja suicídio, guerra ou cadeia. Curiosamente, é o poema da 9ª canção (ou movimento), do menos famoso Küchelbecker, A Delvig, que foge ao fatalismo impotente, fustiga os maléficos e grita o estremecimento do poder dos tiranos e proclama: A imortalidade é o apanágio de inspirados feitos temerários, como de doces cantares! Assim livre, alegre e briosa, não morra nunca a nossa união! Favorita das eternas musas, mantenha-se ela firme na felicidade e na mágoa! Talvez a imortalidade fosse, para Shostakovich, a resistência da arte ao estalinismo. A dele. Não há ali outra transcendência. Os dois últimos poemas escolhidos são de Rilke, autor de elegias e de três requiem. Em Der Tod des Dichters, a morte do poeta é também a da paisagem do mundo que o habitava, a ele, fino fruto votado à putrefacção... E a conclusão da sinfonia, o Schlusstück de Rainer Maria, resume-a toda: A morte é toda poderosa / e até nas horas felizes / nos vigia. / No auge da vida, ela sofre em nós, / habita-nos e tem saudades nossas, / connosco chora. Bem sei que é lusitana e livre a minha tradução. Mas, no fundo, morte há só uma, igual para todos, por muito diferentes que sejam os nossos olhares para ela, ou os modos de a dizermos. Mas o velho que sou, quietamente posto no limiar de uma porta que irá abrir-se, espera que então lhe apareça o Jesus que, no Suave Milagre, de Eça de Queiroz - leu-mo meu Pai quando eu era menino - também a mim me disse: Aqui estou...
A nova vanguarda que se deseja definir por estes anos, busca referências no surrealismo, mais propriamente no dadaísmo através da figura de Marcel Duchamp. Duchamp ainda exerce uma considerável influência sobre a geração de artistas dos anos sessenta. Em 1966 terminou a sua última obra ‘Étant donnés’, vindo a morrer dois anos mais tarde.
Retirar o valor da arte era pretensão dos dadaístas. Os dadaístas propunham produzir objectos que se desviassem da representação e que se concentrassem no sujeito. Dada significa nada, recusa de significado. Dada nasce de uma contestação absoluta de todos os valores, da realidade e da arte. Picabia lançou a ideia de uma arte ‘amorfa’, que não representa, como também não é nada, apenas um gesto.
‘É uma arte que quer deslocar a atenção do objecto para concentrá-la sobre o sujeito: do produto para o produtor. Uma arte que é sempre diferente de si mesma.’ (Argan: 1992)
Indiferença em relação à arte. As obras de arte não se situam na descoberta do que é bonito e do que é feio, evidenciam o que não se distingue. Sem programa determina-se uma arte sem preconceitos, destituída de qualquer tipo de lógica e de racionalidade. A rejeição, a fragmentação e a destruição de todas as formas de arte constituem uma pretensão que advém de uma necessidade de absoluta liberdade intelectual e espiritual. Eliminar todas as obras de museu. Os dadaístas lutam contra a produção de objectos, pretendem alterar a razão social da arte porque numa sociedade burguesa o objecto é mercadoria, a mercadoria é riqueza, a riqueza é autoridade e poder.
O que é que a absoluta liberdade, reclamada pelos dadaístas e utilizada pela nova geração de artistas do final da década de sessenta, pode gerar?
Uma nova arte (estruturada geométrica) tem de considerar o nada nas acções da vida;
Ser artista já não significa ter talento, ou ter experiência técnica;
É preciso considerar as oposições: Ordem = Desordem; Sujeito = Não Sujeito; Afirmação = Negação.
Ao deixar de ter valor a arte passa a ser nonsense, determina-se segundo as leis do acaso e pode valer-se de qualquer instrumento e de qualquer material. (Argan: 1992)
O ready made nasce como um objecto descontextualizado e não programado para ser obra de arte – dotado de valor a que geralmente não se atribui qualquer relevância. A acção consiste na alteração do juízo para destruir algo considerado valioso ou para construir algo que não tem valor. Assim, o que determina valor estético já não é um procedimento técnico, um trabalho mas um puro acto mental. Duchamp com o secador de garrafa e com a fonte demonstra que fora do seu contexto as peças do quotidiano podem ter valor – provocação ou paródia – são elementos-chave para enriquecer o real com o imaginário.
A acção do artista é independente, não planeada e variada – deixa de fazer sentido a separação entre as intervenções plásticas e as poéticas, teatrais, gráficas ou verbais. A colagem muitas vezes utilizada por dadaístas, como Schwitters, permite que a obra seja lugar onde se integram as coisas mais heterogéneas, encontradas ao acaso e acrescidas a outras, dia após dia. As colagens de Schwitters, tal como a dos Nouveau Réalistes, são compostas de tudo o que por acaso está ao alcance da mão, sendo crónicas de uma experiência quotidiana.
A crítica às instituições, nomeadamente aos museus foi acentuada por Marcel Broodthaers (1924-1976), já em meados de sessenta. Broodthaers alimenta o seu trabalho a partir da figura de Duchamp e a partir da célebre frase de Magritte ‘Ceci n’est pas une pipe’. Desde 1964, dedica-se à arte, experiência completamente nova, já que anteriormente se dedicava à poesia. A sua atitude é muito crítica em relação à arte produzida segundo aspectos meramente comerciais ou institucionais. A Pop Art é alvo de reapreciação. O museu é declarado como sendo a instituição que torna o fenómeno artístico aborrecido, ao impor a valorização e a produção de juízos sobre as obras de arte. O trabalho mais característico de Broodthaers, decorreu entre 1968 e 1972 e consistiu na construção de diferentes secções de um museu fictício que expõem a arbitrariedade entre objectos e o seu significado (sobretudo ao evocar Magritte e ao etiquetar os objectos com ‘This is not a work of Art’). A secção mais elabora deste museu foi o ‘Departement des Aigles’, mostrado na Kunsthalle de Düsseldorf, em 1972, e que consistia na disposição de diversas vitrinas cheias de diversas representações da Águia (símbolo de liberdade, mas também de imperialismo). (Hopkins: 2000)
P.S. A velocidade à qual, nas nossas sociedades, o número de mortos por ano vai superando o de recém nascidos, os casamentos se desfazem ou nem sequer se fazem, o sexo é propagandeado apenas e exclusivamente como ocasião de prazer (e concomitante fonte de receita para quem vende estimulantes), e até o aborto (não penso aqui nos casos em que uma gravidez levante questões sérias de razão clínica ou sanitária, ou psíquica, ou de consideração de violência coerciva e violação de direitos elementares, mas falo do que é decidido sem ponderação da responsabilidade pelos actos, e só por critérios de conveniência) já custa aos contribuintes, anualmente, somas que também são retiradas a pobres e desvalidos - tudo isto nos obriga a um caminho espiritual de regresso à compreensão do amor e da responsabilidade. Ser necessariamente em relação, nenhuma pessoa humana pode agir inconsequentemente, como se aquilo que faz a si só diga respeito. Além de que somos também uma construção da memória, e a nossa densidade humana se cimenta pela lembrança, cuja expressão moral é o compromisso assumido. Há por aí muitos dramas atribuíveis à permissividade com que fomos consentindo o "amor líquido", como lhe chama Zygmunt Bauman... O matrimónio e a família são noções e instituições variáveis na história e na geografia, e os vários tipos definidos conheceram evoluções e crises, conformes às evoluções das mentalidades e das sociedades, às culturas circunstantes. Também surgiram desvios na ordem moral, muitas vezes pela confrontação entre sentimentos, deveres e interesses, como se vê nas cenas de escárnio do casamento "burguês" (de aristocratas decadentes com novas-ricas) da série Marriage à la Mode, do pintor inglês William Hogarth. Mas os próprios acidentes de percurso foram servindo um caminho de libertação e recusa de considerações outras que não fossem o amor e o livre compromisso entre os esposos. Ora parece que é precisamente isto que, nos tempos hodiernos, se vai desfazendo. Penso, todavia, que não se trata de uma questão essencialmente moral, mas, mais profunda e dolorosamente, de uma desorientação existencial, à qual, aliás, não será estranha a solidão crescente - e concomitante dessolidarização - das pessoas pela materialização dos prazeres oferecidos (onde está a alegria íntima? o convívio?) e pela virtualização da comunicação entre elas. Mas não pretendo analgar aqui essas questões. Este soneto é tosco, é de amor mordido pelo alheamento, que é a forma mais desumana da alienação.
Vou a caminho de Bogotá, e de novo por falta de tempo, deixei por ir a dois locais que me trariam tréplica às perguntas. Num deles o tal pôr-do-sol acompanhado pelos ventos alísios no Baluarte de Santo Domingo, e que, levanta, diz-se, lembranças púrpuras, pormenores de heras silvestres entrelaçadas pelo furor dos tempos. Sem medos. O outro, mais exposto à decifração, ensina a evitar ocasiões, limita-as a uma aparência e parágrafo. Mas é do primeiro lugar que te quero falar depois de ter tido uma breve conversa com o Zé-Miguel sob as árvores do Jardim das Amoreiras.
Na verdade, Inês, aprendem-se palavras que denominam coisas escondidas, bastando para tal que deixemos uma corrente de música por mar primordial e deste modo soube
Que nem a Beatriz, nem o Zé-Miguel se tinham dado conta do que acontecera a ambos naquela passagem fulgurante do se conhecerem em navegações e périplos bem diferentes. Como sabes, há muito, que nem um, nem outro eram jovens, assim, o tempo das dúvidas do cativados ou cativos também já se fora, e no entanto, querida Inês, no “no entanto”, cabia tudo: os múltiplos matizados da atracção e da ternura, da volúpia e do desejo, da amizade e do amor, o centro dos prodígios da lealdade, o bosque afinal vivo, a música fresca, tudo formava frases inacabadas entre os dois, por força da mimese que os unia. Disse-me o Zé-Miguel que chegou a afeiçoar a corda do arco que por horas tinha tido na mão, à sua Beatriz, mas também me disse que ponderou a era do mundo em que estavam ambos, e que aquele limbo de tão raro, de tão frémito e sem qualquer plano, o surpreendera, mesmo depois de liberto da tensão.
Entretanto, a Beatriz rumou a Colónia para umas semanas de trabalho, não antes de me deixar uma nota por baixo da porta da minha casa, local onde passara todos os silêncios do que a Bia comungara com os sentires pelo o Zé-Miguel. Dizia na referida nota
«Isadora, reajusto o espírito vindo de tudo o que senti. Também me surpreendi pois neste tempo que o tempo me deu, entendi que, ele me propunha, ter sido tigre, e fui. Estranho não me sentir nas culpas do que não poderia, mas Isa, no limite deve-se ser fiel às boas vindas da alma antes de a vida nos levar. Não quero esquecer, minimizar ou dinamizar o belo que se passou, o nada que houve em tudo. Quero do Zé-Miguel o requinte da rota na minha memória para sempre.
Voltarás ao Quénia, em Julho, não é? Sei que Keekorok Mara Loge te acolherá de novo – confesso que receio que um dia fiques tempo demais -, e gostava de te pedir que deixasses por lá este pedacito de fio de lã, tecido pela nitidez da escrita de um lápis. Eu e o Zé-Miguel aninhámo-nos por aí. Bia»
Inês, não repouses a vida. A vida assusta enquanto sopra. Repara na Bia, ou em mim, no meu marido que me revela e se me apaixona rasante. Pode haver momentos – quem sabe? – em que cada um de nós, dentro de si, tenha de decidir algo desajustado do que deseja , e é um pouco dessa realidade, dessa visão, que te envio, dentro desta caixinha, uma semente madrepérola. Aceita-a para o caso de um dia a tanta força que julgámos ter, não nos vencer.
Sossega, dorme com a palma da mão sobre a anca do teu marido. Tu sabes, que tudo permanecerá no caminho, a centímetros das grandes distâncias.
Desconheço se te ajudei ou se te poderei ajudar. Contudo creio que todas as coisas expostas à luz e ao ar deveriam ser felizes a quem lhes chega.
O Alberto deixou-nos. Era uma personalidade fascinante. Uma conversa com ele era um motivo de luminosidade e de sabedoria. Conheci-o desde sempre, primeiro como jovem advogado brilhante que colaborou com o meu Avô, mas depois, e com uma intensidade crescente, como um cultor da melhor amizade, como da melhor literatura e da melhor arte. Ao lado de João Bénard da Costa, de Pedro Tamen, de Nuno Bragança e de António Alçada Baptista foi um dos grandes protagonistas de «O Tempo e o Modo». Como foi, mais tarde, de «Raiz e Utopia». Na crítica literária tornou-se uma referência de critério e de qualidade. Não é possível compreender a importância de Agustina Bessa Luís ou de Sophia de Mello Breyner sem ler o que Alberto escreveu. E, para tanto, teve de romper com conformismos, dos vários lados do espetro político. Ao lado de Helena Vaz da Silva, foi uma peça-chave nos diversos projetos em que esteve envolvida. Admirava profundamente a inteligência de sua mulher, sabendo na antecâmara articular a imaginação e a racionalidade, a audácia e o senso comum. Um dia disse que usava as palavras que estavam na sua alma. E José Tolentino Mendonça, há pouco, no Expresso comparou-o com Cristina Campo, a propósito de «Os Imperdoáveis». «Isto é, aqueles que possuem e definem um estilo, os habituados por uma força profunda, por um caráter próprio, por uma sabedoria irremovível, aqueles que desenham com as suas vidas um mapa de tal modo original que se torna necessário à viagem dos outros». E assim citava a frase de Saint-Martin: «Houve certos seres através dos quais Deus nos amou». Era assim a sua fé, feita de afeto e espontaneidade. O seu conhecimento enciclopédico permitia-lhe fazer compreender tudo para além do imediato e do simples. A poesia, a literatura, as artes, o diálogo das culturas e das civilizações – tudo se somava à paixão pela astronomia e à experiência da grafologia. Psicólogo experimentado, conseguia na decifração da escrita entender a complexidade das personalidades humanas. E assim cultivou a psicologia das profundidades. Roseline Crepy abriu-lhe os horizontes. A sua generosidade permitiu-lhe, entretanto, dedicar-se àquilo que lhe dava verdadeiro prazer: a descoberta da diversidade e a procura da luz. Oiçamo-lo sempre: «É com sorridente beatitude e uma ponta de inveja que hoje lemos os livros de viagens que foram moda no final do século passado. Já no século XVIII fazia parte da educação de qualquer jovem bem nascido correr mundo, isto é, percorrer longamente a Itália num Grand Tour que, depois de completado, lhe permitiria estabelecer-se com segurança no lugar que a Providência lhe designara». Ah! O Alberto continua a despertar o gosto pela vida!
A revista “De Teatro”, publicada em Lisboa de setembro de 1922 a agosto de 1927, num total de 54 números, constituiu na época um repositório extremamente atualizado e qualificado de notícias, mas também de textos dramáticos, no sentido mais abrangente da literatura ligada à arte teatral. Dirigida desde a fundação por Mário Duarte, com efémero prolongamento em 1928 com novo título (“Teatro-Magazin”) em 4 edições, o certo é que constituiu na época um poderoso divulgador da atividade e da cultura teatral: e hoje representa uma fonte histórica extremamente relevante não só das artes do espetáculo em si, como da sociedade que sustentava, melhor ou pior, tanto a publicação como o espetáculo subjacente.
De há muito que consulto a revista “De Teatro” como fonte importante do teatro da época e não só. A coleção integral da revista, conjunto de 7 volumes constituem, repito, uma fonte vastíssima da História do teatro no início do seculo XX – mas não só: os estudos e evocações a partir dos espetáculos e das edições, abrangiam muitas vezes épocas, autores e atores de outros tempos.
Basta constar que cada número inclui o texto integral de uma peça, quase sempre portuguesa e muitas vezes inédita de autores então em plena atividade produtiva: André Brun, Vasco Mendonça Alves, Ramada Curto, Carlos Selvagem, Fernanda de Castro, Henrique Lopes de Mendonça, e tantos mais, com destaque periódico para “o grande escritor e dramaturgo português” Julio Dantas “conhecido em todo o mundo civilizado”, nada menos!
E como colaboradores, encontramos muito elogiado, Almada (ilustrado com um autorretrato e com um desenho da atriz Vera Sergime), outra vez Julio Dantas (e isto, 7 anos depois da publicação do célebre “Manifesto Anti Dantas e por Extenso” de Almada), Jorge de Faria, Matos Sequeira, António Ferro, Aquilino Ribeiro…
E são referidos atores de grande destaque na época, como Amarelhe, Maria Matos (que aliás escreve um curioso artigo sobre o teatro na Madeira e nos Açores), Augusto Rosa, Alves da Cunha, Clemente Pinto, os então jovens Palmira Bastos, Samwel Dinis ou Erico Braga, e ainda Joaquim de Oliveira, Augusto de Melo, Chaby Pinheiro, Aura Abranches, ”o glorioso ator Taborda”, José Carlos Santos conhecido como Santos Pitorra “o grande iniciador da moderna arte de representar em Portugal” ou António Pinheiro.
Este último, designadamente esteve ligado ao Teatro Livre, iniciativa de renovação cénica e dramatúrgica que marcou as primeiras atualizações do teatro na época. E também é destacada a estreia do Teatro Novo, com transcrições e comentários de Leitão de Barros e com referências a peças de Jules Romans ou Pirandello, então pouco conhecidos em Portugal. Mas são também publicados artigos sobre História do Teatro Português, aqui com destaque para os estudos de Gustavo de Matos Sequeira.
E também é publicada, com grande destaque, toda a planificação da encenação da “Farça de Inês Pereira” por Joaquim Oliveira, com maquete de cenário de Raul Campos
A música é analisada a partir de espetáculos de ópera no São Carlos e operetas e revistas com música de Wenceslau Pinto, ou de referências a grandes intérpretes da época, como Guilhermina Suggia.
Logo no primeiro número “De Teatro” publica a peça “O Salon de Madame Xavier” de Vitoriano Braga (1888-1940) estreada no Teatro Nacional de D. Maria II. Importa lembrar a projeção, na época e hoje, do autor, com nove peças publicadas, quase todas representadas, e que marcou a transição do teatro português para uma modernidade, não por ele completamente assumida, mas suficientemente relevante para merecer elogios de Fernando Pessoa, que considerou “Octávio” (1916) “notável entre a multidão nula das peças modernas”… E talvez por isso, ou certamente não apenas por isso, Jacinto do Prado Coelho escreverá no “Dicionário das Literaturas Portuguesa, Galega e Brasileira” que “na corrente modernista enfileira(m) também (…) Vitoriano Braga”.
Ora justamente, neste primeiro número da revista, Vitoriano publicou uma curiosa análise da expressão dramatúrgica e da arte do teatro em geral:
“Um autor dramático tem em regra uma maneira de ver o teatro muito pessoal e por conseguinte é lógico que seja de uma grande intolerância por aqueles que tenham uma orientação diferente da sua. Mas consciente desse perigo, que me poderia levar muitas vezes a ser injusto, desde já prometo que procurarei sempre, o mais que possa, basear em argumentos as minhas apreciações, e assim todos poderem sobre elas formar o seu juízo”.
Também é interessante recordar que a revista publicava regularmente referências aos espetáculos em cena, sobretudo em Lisboa, mas também no Porto e em Espanha e França.
E para terminar, uma curiosidade: em novembro de 1925, a “De Teatro” incluiu um destacado artigo intitulado “A Última Palavra em Aviação – O avião gigante continua a deslumbrar Lisboa com os seus vôos”, ilustrado com a fotografia de um monomotor: e lá se diz que “desde que chegou de Madrid o gigantesco avião sueco Junker tem sido o assunto de todas as conversas”!...
Mais de vinte anos depois da conversa, em que me perguntou se eu seria sua biógrafa, é-me difícil fazer uma reflexão objetiva sobre a personalidade, o mérito, o percurso da mulher notável que é Maria Barroso. Na sua personalidade, vejo a liberdade como princípio de vida, a família como força e estrutura de carácter, a política como disciplina de comportamento, a fé como misteriosa e firme revelação em idade madura.
O que acrescentar que sobre ela não se saiba ou não tenha sido dito?
Mais do que factos da vida pública, são agora desejados os detalhes sobre a sua vida privada. Se discretamente atenuou a sua própria expressão, para mais ser conhecida por primeira-dama e mulher de Mário Soares. Se foi essa a sua vontade, em vez de se distinguir pela sua intervenção e ação nas causas em que se tem envolvido, desde sempre. Perguntam-me como é a organização dos seus dias. Se é uma mulher independente. Se determina os rituais da casa e da família. Se tem uma relação próxima com os netos. Se tem uma agenda própria. E mais e mais. Parecem ser mais importantes estas minúcias do que o seu percurso de vida. O ambiente em que nasceu, os estudos, os amigos, o teatro, o amor, a política.
Talvez sejam menos conhecidos os seus concretos gestos de atenção aos outros, mais ainda aos mais simples, aos anónimos cidadãos que chegam perto, a dar-lhe uma palavra, a ouvir-lhe a voz. Poderão ser lembrados os seus tons de feminilidade, a sua maneira clássica de vestir, a determinação no estilo, a harmonia nas cores, a escolha do pequeno enfeite que sempre usa, a combinar com as variadas circunstâncias em que está presente. Na sua expressão pública, Maria Barroso diz a importância da família, na ordenação da sociedade. E na vida privada fala da casa dos pais, das brincadeiras com os irmãos. Lembra cenários de juventude à roda da mesa de jantar, repartidas então as fases difíceis de todos e de cada um. Forte e claro é o discurso amoroso constante, sempre que fala do seu amor. As prisões, os exílios, as separações, os medos. A coragem, o atrevimento, são nela justos motivos de orgulho.
Não tem temperamento para silêncio ou omissão, nas questões políticas e sociais de atualidade ela afirma-se. Quando tem uma causa a defender, fala o quanto pode, debate, imagina, propõe ideias, dá sugestões, defende opiniões, abre hipóteses de solução. Sabe que os problemas que apresenta pertencem, preocupam e dizem respeito a todos e a todas. Podendo ser intolerante e até radical quando discorda, ela sente a compaixão, pratica a solidariedade, a doçura. É reconhecido o seu estilo, o seu jeito, a sua maneira de ser na fantástica capacidade de comunicação que mantém com as instituições, os poderes, os cidadãos.
Na sua postura, vejo a marca de formação que recebeu como atriz nos anos 1940 da sua juventude, quando no Teatro Nacional pertenceu à Companhia Amélia Rey Colaço-Robles Monteiro, surpreendendo pelo talento que a poderia ter consagrado como uma das notáveis da sua geração. Aplaudida então pelo público e pela crítica, para sempre lhe ficou a clareza na maneira de falar, a certa medida das frases, a colocação de pausas e pontos finais, o momento justo da respiração. As costas direitas, o olhar determinado, a expressão dos olhos a confirmar o que diz e como diz.
Sem desânimo nem pausas ou ausências, Maria Barroso tem tido perto de duzentas intervenções públicas em média, por ano. Umas largas dezenas de idas e vindas entre Lisboa e as mais variadas geografias do país não a cansam. Uma vintena de viagens anuais, acrescentando aos destinos europeus as mais variadas rotas de longa distância estimulam-na. Para que a solidariedade cresça no seu curso para a transformação dos males deste mundo, faz conferências nas escolas secundárias e nas universidades, promove debates e congressos, anima causas e ações. A violência na televisão e na imprensa, em especial, tem sido motivo de textos e pronunciamentos. Assim como a família, a educação, a violência, a assistência aos flagelados, às vítimas de seca ou de chuva, têm sido suas razões de ser. Pela defesa dos direitos humanos e pela cooperação inspira-se para campanhas a lançar, cresce em energias, tem disponibilidade absoluta. Sempre que procura ajudas, apoios, parcerias, raramente recebe recusas, porque a urgência de realizar é total e as soluções possíveis existem.
Nestes dias sombrios, releio o que Maria Barroso me disse e escrevi, no último capítulo da sua história: "O meu reencontro com a fé deu-me uma serenidade muito grande para olhar todo o percurso da minha vida, despedir-me deste mundo sem receio nem angústia."
É Oxi, Nein, Não, No. Os gregos rejeitam os termos do novo resgate financeiro em referendo histórico que diz da tragédia helénica e ainda da farsa europeia. Andamos nisto há cinco anos.
A moderada reação da City à ruína do South confirma o detalhe político no plano de sanitarização em torno da rebelde Athens. Mas o cerco tem vítimas além do risco da Grexit crescer e as bolsas tremerem. O dano maior consiste no facto de a ideia do pós-guerra de uma collaborative Europe estar a morrer em mãos insensatas. Pior: com esta cairá um dos dois pilares da NATO e da segurança ocidental! — Chérie, il n'est pire aveugle que celui qui ne veut pas voir! Passam 10 anos sobre o London 7/7 em reino sob alerta crítico de ameaça terrorista. O Chancellor George Osborne apresenta o 2015 Tory Budget em Westminster, com atenções centradas nos novos cortes no assistencialismo e nos impostos. — Hmm. Two wrongs don't make a right. Batalha de titãs também em Wimbledon, com Mr Andy Murray a disputar a segunda semana dos jogos. Sandringham acolhe o batismo da Princess Charlotte of Cambridge.
Summertime within paradoxical hectic days. Uma volta pelos jornais europeus e percebe-se o quanto as elites estão incomodadas com o desesperado «não mais» da Hellenic Republic. Não por acaso temem o contágio político; não o seu risco monetário. O tom comum da Press é que os gregos desafiam Die Deutsch Europa. Mesmo os céus quase votam neste jogo de alto risco e Berlin vive a lightening stormy night, escrevem nas diversas línguas da neo Babel. Ora, a decisão 61,3-38,7% no #Greferendum tem o seu quê perigoso. A lembrar uma frase do bósnio que acende o rastilho da First World War – Antes morrer de pé que viver de joelhos. A memória histórica pesa pouco, todavia, na Merkellande de que os eurocéticos de todas as cores atestam agora não temerem sair. Afinal, invocando a pena fina de Mr William Hazlitt, que significado terão Verdun-sur-Meuse, Passchendaele ou Somme para os nossos doutos eurodecisores de hoje!?
Caso o senso regresse a Brussels e a Athens talvez, quiçá, tais ilustres e ilustrados possam realizar real negociations. Caso contrário, vacilante na bússola, a Eurozone progredirá na terra incognita de que amiúde fala Mr Mario Draghi no European Central Bank. Por outras palavras, lavrando an impossible situation. Se por cá se questionam sobretudo os modos de uma cada vez mais provável Grexit.it, a par dos efeitos numa eventual Brexit.irl, pergunto-me o porquê desta fuga do futuro nas chancelarias continentais. Qualquer que seja o cenário para o qual tendam o/as senhores/as do Euro, aquém Channel, tomam-se previdências cautelares na City e arredores. Justamente quando aos pés das Balkans, na sensível encruzilhada entre Europe, Asia e Africa, o fogoso Mr Yanis Varoufakis apresenta a sua demissão de ministro das finanças do país que um jornal berlinense hoje mesmo rotula como Das zerissene Land.
Provando a distraídos que as bandeiras possuem a deep symbolism, os US envolvem os (perdi-lhes-a-conta) candidatos à White House numa vivíssima discussão sobre se o estandarte da Confederacy deve estar, ou não, num museu, decorridos 150 anos sobre a American Civil War ganha pelas forças nortistas do republicano President Abraham Lincoln. Na green and pleasant land de Blake, o fio dos dias é outro. Em vésperas do sempre colorido debate orçamental na House of Commons, um sorridente casal passeia com os filhos em Sandringham até St Mary Magdalene. A igreja recebe uma cerimónia privada, com 21 official guests que incluem a Queen e os Prince Philip, Charles, William e George entre outros. Todos, discretamente, celebram o batismo da 9-week old Princess Charlotte Elizabeth Diana of Cambridge. — Well! Method is essential for knowledge and for life.