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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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A FORÇA DO ATO CRIADOR

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O Centro de Arte Britânica de Yale e o Kimbell Art Museum na obra de Louis I. Kahn.

Em 1951, logo após regressar de Roma, Louis Isadore Kahn (1902-1974) inicia um novo período fértil, só terminado no ano da sua morte, em1974. Kahn revê o moderno para expressar vontades institucionais e comunitárias. Reclama o olhar para o monumento e propõe o uso de meios técnicos adequados e o conhecimento aprofundado de uma geometria arquetípica – só assim as formas construídas podem ser muito mais que uma vontade escultural. Kahn traz de novo as formas do passado evocando os valores eternos materializados pela textura, cor, luz.

A partir dos anos 60, Kahn desenvolve um discurso cada vez mais poético. A arquitetura passa a definir-se de modo ainda mais espiritual pelo silêncio e pela luz natural (que dá vida!). O Silêncio é o elemento da arquitetura que permite evidenciar a essência das coisas (o espanto, o maravilhoso, a revelação). A Luz, relacionando-se com a existência e o fazer, é um utensílio de expressão intimamente ligado à ordem estrutural, modular e à escolha dos materiais. Kahn entende assim que cada espaço tem uma existência própria. E todas as formas para existirem, obedecem a uma lei física e universal que apela à ordem.

Acerca do Yale Center for British Art

O processo de construção do Centro de Arte Britânica estava mesmo a terminar quando Louis I. Kahn, em 1974, morre na Estação de Penn. Tal como o Kimbell Art Museum, o Centro de Arte Britânica de Yale (New Haven, Connecticut,1969-74) foi desenvolvido, segundo um sistema de espaços modulares (‘Le carré des neuf carrés’, Kahn, 1961) e um sistema de coberturas estruturais que permitem a entrada da luz natural. Na mesma rua do Centro de Arte Britânica encontra-se a Galeria de Arte de Yale (1951-54) – primeiro projecto que Kahn realiza segundo os propósitos do seu texto ‘Monumentality’ (1944). É através da Galeria de Arte de Yale que Kahn inicia o seu período fértil e assim em 1954, estabeleceram-se os parâmetros da arquitetura monumental do pós-guerra.

O Centro de Arte Britânica de Yale é um edifício decididamente urbano, com uma clara analogia histórica às residências da Itália renascentista. Estes palácios urbanos, evocados por Kahn nos primeiros estudos para o Centro de Arte, tinham ocupação comercial no piso térreo, e estavam organizados em torno de um pátio central, num sistema que integrava em simultâneo massa e espaço, estrutura e luz.

Kahn pretende soltar o edifício do solo, tornando-o mais leve, integrando atividades diversas no contacto com a rua – opção estrutural utilizada foi a viga de Vierendeel. A viga de Vierendeel é uma viga de cintagem que absorve cargas dos pilares e as transporta para os apoios. Esta solução permite a redução do número de ligações e a existência de maiores áreas livres de formato retangular no plano da estrutura (região entre os montantes), permitindo a fácil colocação de vidros (por exemplo) ou de outros revestimentos. O Centro de Arte Britânica apresenta uma solene geometria paralelepipédica (Kahn explora módulos de 6X6m) contida em betão, vidro e aço.

Com uma linguagem muito depurada Kahn procura espaços interiores hierarquizados (com distinção formal clara entre espaços servidos e servidores), compactos e simétricos. Os pátios são os elementos, que cobertos, proporcionam a iluminação natural de toda a coleção.

Acerca de Kimbell Art Museum

O Kimbell Art Museum (1966-72) edifica-se no quarteirão dos museus em Fort Worth, no Texas. O museu apresenta uma estrutura unitária evidente no seu exterior e interior (porque para Kahn ‘um espaço não é espaço a menos que se possa ver como foi construído’) – pela sucessão de abóbadas de canhão geradas pela deslocação sucessiva e regular da ciclóide. Na procura pelas formas arquetípicas, Kahn afirma em Kimbell a importância da geometria pela ciclóide. A ciclóide é uma curva gerada por um ponto fixo da circunferência que roda sobre uma linha horizontal. Apresenta características cíclicas.

Kahn deseja criar em Kimbell uma arquitetura baseada na escala humana, com espaços que existem através do meio físico da luz. Desde logo, os seus primeiros desenhos denunciam uma suave cobertura curva, interrompida por um refletor de luz. Kahn estabelece um sistema de abóbadas independentes, abertas longitudinalmente para permitir o trespassar da luz.

À semelhança de Anton Tedesko, Kahn explora a utilização estruturas de casca fina em betão, na cobertura do museu. Através dos diversos e longos tambores (de 30 m de comprimento) a cobertura pode ficar mais leve. A carga da ciclóide encontra apoio nas lajes horizontais, situadas entre as abóbadas, que contêm as infra-estruturas mecânicas necessárias. Kahn reconhece neste sistema a vantagem de alinhar todos os serviços do edifício com a estrutura. E assim, as delicadas curvas fazem corresponder-se aos espaços servidos e os espaços de cobertura plana aos servidores.

E Kahn explora, aqui mais uma vez, o tema de hierarquização do espaço, diferenciando através da importância, do uso, da flexibilidade e dos materiais na sua verdade aparente – no museu evidencia-se a pedra (o exterior está revestido por travertino, material de herança clássica), o betão (na cobertura muito fina), o vidro e a madeira.

Ora, Kahn ao usar repetida e obsessivamente o tema da abóbada e do arco, trouxe de novo para o seu discurso construído o tema da história (o predomínio do clássico) e da sua importância na determinação das formas que criam comunidades.

Ana Ruepp