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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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ATORES, ENCENADORES - LXVI

 

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RUI VILAR, ATOR E DOUTRINADOR DE TEATRO UNIVERSITÁRIO


Recordamos aqui que no passado dia 23 de Fevereiro, Emílio Rui Vilar foi o orador convidado do jantar debate no Grémio Literário, organizado pelo Centro Nacional de Cultura, pelo Clube Português de Imprensa e pelo próprio Grémio, com uma comunicação subordinada ao tema “Que Portugal Queremos Ser, que Portugal Vamos Ter”.

Ora, recuando mais de meio século, encontro numa revista especializada de teatro universitário a referência a Emílio Rui Vilar como membro ativo e atuante, na cena, na teoria e na direção cultural e de espetáculos, do Centro de Iniciação Teatral da Academia de Coimbra – CITAC, isto em 1961. Nesse mesmo ano se terá licenciado em Direito pela Universidade de Coimbra, mas no número 3 do Boletim de Teatro do CITAC (Outubro de 1961) surge como Diretor e Editor da revista: e aí se dá notícia da sua atuação como ator num espetáculo de importância e significado.

Trata-se da apresentação e representação, pela primeira vez em Portugal de um autor de vanguarda a nível europeu, Jean Tardieu, com a peça “Conversação Sinfonieta”, representada pelo CITAC em tradução de Luís de Lima e do próprio Rui Vilar. E o espetáculo em si a ambos se deve: Lima encenou e Rui Vilar interpretou o personagem “Tenor”.

Tenhamos presente que tudo isto ocorre em 1961, o que só por si indicia a modernidade e mesmo a independência cultural do próprio CITAC e de quem o dirigia. E vale a pena ainda recordar que, à época, o CITAC tinha já apresentado peças de Ionesco, Michel de Ghelderode, Francis Durrenmatt, Artur Adamov, Carel Capek, Frederico Garcia Lorca, Thornton Wilder, Paul Claudel e, entre os portugueses, Prista Monteiro, Egito Gonçalves, Alexandre Babo, Miguel Torga, Carlos Selvagem…

E em espetáculos do referido ano de 1961, encontramos Rui Vilar, como ator, como assistente de encenação e como diretor de cena. Cito novamente e especificamente a “Conversação Sinfonieta” de Tardieu, que constituiu estreia absoluta do autor em Portugal, e cito ainda por exemplo “A Rabeca” de Prista Monteiro, em que surge como diretor de cena e assistente de encenação.

E já agora se recorde que o encenador de ambos os espetáculos foi Luís de Lima, o qual colaborou com o CITAC de 1960 a 1962: e fica tudo dito quanto à qualidade das respetivas encenações.

No referido Boletim do CITAC, Rui Vilar dá notícia do III Ciclo de Teatro organizado no Teatro Avenida de Coimbra, com destaque para espetáculos de diversas companhias, mas sobretudo concentrados em autores então ainda vivos e até hoje representativos de estilos diversos de contemporaneidade. Vilar destaca designadamente Luís de Lima nas encenações de Beckett e Adamov, e ainda António Pedro na encenação do “Rinoceronte” de Ionesco: como vemos, um repertório que, nos anos 60 como hoje, marca pela indiscutível inovação.

E vou buscar ao citado Boletim de Teatro do CITAC uma análise de Rui Vilar sobre o III Ciclo de Teatro, realizado em Coimbra nesse ano de 1961, mas que mantem hoje plena atualidade (parêntesis meus):
«Foi no ciclo posto lado a lado teatro profissional e teatro universitário. Deste lado estiveram o CITAC e o GCFDL (Grupo Cénico da Faculdade de Direito de Lisboa): faltou este ano o TEUC (Teatro de Estudantes da Universidade de Coimbra) preocupado com a sua apresentação na VIII Delfíada. A lição da apresentação daqueles é de que amadores conscientes, orientados, ensinados, podem vir ao palco servindo conscientemente o teatro, atacando plenamente com a responsabilidade - que de responsabilidade se trata – da criação artística. Por outro lado a falta de orientação competente, tendo o valor de experiência, deve, no entanto, ficar na sala de ensaios e não vir ao palco.

Do lado profissional, parece-me que aos nossos atores falta ainda em muitos casos suficiente consciência profissional. Vimos e ouvimos no ciclo imperfeições inadmissíveis em quem faz do teatro único labor.

Mas a grande lição deste III Ciclo de Teatro é a de que o teatro é ainda arte apetecida e viva. A maneira como o público correspondeu deve dar a certeza a quem trabalha pelo teatro que não trabalha em vão ou em coisa morta. Mais: a palavra de ordem é continuar» (fim de citação).

Palavras de Rui Vilar em 1961. Mas na sua essência, e constatando que, nestes 55 anos, o meio teatral mudou muito e mudou para melhor, as palavras não deixam de conter ainda hoje grandes verdades!...

 

Duarte Ivo Cruz