ATORES, ENCENADORES - LXVIII
EVOCAÇÃO DE NICOLAU BREYNER
Uma breve nota pessoal, a propósito da morte inesperada de Nicolau Breyner, para evocar o início da carreira deste brilhante e talentoso homem de espetáculo: e isto no sentido mais abrangente do termo, na medida em que Nicolau representa um paradigma brilhante da geração de artistas portugueses que iniciaram a transição do teatro- espetáculo direto para o espetáculo televisivo.
Mas sem por isso deixar de ser destacado ator de teatro, com um historial muito relevante na carreira própria e na carreira dos outros artistas intervenientes, e também no historial da própria televisão portuguesa. Aí, como bem sabemos, Nicolau não se limitou a ser o grande ator que efetivamente foi: a sua intervenção e criação televisiva – e recordo, a propósito, o referencial Senhor Contente e Senhor Feliz, e recordo a renovação qualificada da novela – marcaram uma época iniciática.
E sobretudo, evoco aqui a sua passagem pelo então Conservatório Nacional, onde iniciou a formação de ator a partir de 1958. Ora, como já tenho escrito, foi por essa altura que eu próprio passei a frequentar, quase diariamente, alem das aulas da Faculdade de e Direito, as aulas da então chamada Secção de Teatro do Conservatório Nacional, como aluno da cadeira de Filosofia do Teatro dirigida e ministrada exemplarmente por Fernando Amado.
Eramos na altura um grupo de cerca de 20 estudantes, a rondar os 17-18 anos. Posso recordar, e tenho-o aqui feito, nomes que prosseguiram as carreiras: desde logo Nicolau Breyner, mas também Irene Cruz, Henriqueta Maia, Florbela Queiroz, Rui Matos, Fernanda Figueiredo, Vítor Ribeiro, Clara Rocha, Benjamim Falcão, Natércia Gonzaga e outros.
Ora, nesse mesmo ano letivo de 1958 -1959, a Escola passou por uma transição: a disciplina então chamada Arte de Representar e Encenação foi ministrada durante toda a temporada escolar por Fernando Amado, isto pela aposentação do anterior titular, o ator Samuel Dinis, e antes da posse de Álvaro Benamor como novo titular da cadeira.
E já aqui tenho recordado a qualidade do ensino e dos repertórios que, no quadro de uma escola nos anos 50/60, Fernando Amado selecionou: para além dos clássicos em interpretações e encenações modernas de Gil Vicente e dos outros clássicos portugueses e europeus, o Conservatório apresentou em público, por vezes pela primeira vez em Portugal, autores como Thorton Wilder, Federico Garcia Lorca, Eugene O’Neill e outros mais – além de peças de Fernando Amado, de notável qualidade.
Ora o que importa aqui lembrar é que o aluno Nicolau Breyner desde logo marcou pelo talento. E de tal forma que surge pela mesma época e em temporadas teatrais seguintes, em grandes companhias profissionais, como o Teatro Nacional Popular – TNP de Francisco Ribeiro- Ribeirinho e em outras, e tanto em papeis dramáticos como em papeis cómicos – “ator cómico de notáveis recursos histriónicos” escreveu Luís Francisco Rebello.
Nicolau Breyner fez uma longa e brilhante carreira inovadora em tantos aspetos da arte de espetáculo, com mais de 40 filmes desde 1961 (“Raça” de Augusto Fraga) e na televisão, desde 1966 até este mês.
Amplamente se justifica esta evocação.
DUARTE IVO CRUZ