POSTAL
Sim, querida Inês, este breve postal apenas para responder ao teu e te dizer que sinto também que a morte ronda, mas sinto-o desde muito cedo. Desde o dia em que subi o monte a correr e a mão que segura a vida não estava lá, estava em mim, estava dentro deste viver para chegar à morte. Agora há uma outra morte que ronda. Como sabes a morte também conhece metamorfoses. Esta é um tanto cínica, apanha-me as gentes que ao longo da vida abriram a mão, e agora é a minha que vai ficando aberta, não para eles…e disso tenho temor, confesso. Até tenho o temor da inutilidade em que fica uma mão aberta: dependurada no nada.
Mas Inês, também não é absolutamente isto ou aquilo que é tudo. O que temos e o que nos falta, no seu somatório é que é tudo. Planeemos as mãos e a morte rondará mais longe, menos percebida.
Estou aqui.
Beijo
Teresa
P.S. Ontem, aqui em Roma, ao entrar numa rua, vi palavras dependuradas que conversavam sem peso, mas cumprindo o amor jurado quando se desloca. Roma é assim: uma cerimónia botticelliana, uma vida que se gasta em várias almas.
Teresa Bracinha Vieira