A FORÇA DO ATO CRIADOR
Acerca dos Departamentos de Engenharia Eletrotécnica e de Engenharia Informática da Universidade de Coimbra, de Gonçalo Byrne.
Os Departamentos de Engenharia Eletrotécnica e de Engenharia Informática (1989-1992), situados no Pólo II da Universidade de Coimbra, foram desenhados pelo atelier de Gonçalo Byrne que, já instalado na Rua da Escola Politécnica, em Lisboa, contava então com a colaboração dos jovens arquitetos Manuel e Francisco Aires de Mateus.
A criação de um novo campus da Universidade de Coimbra tornou-se inevitável, pelo contínuo crescimento da população universitária, pela possibilidade de oferta de espaço e pelo melhor funcionamento das faculdades, do estacionamento e da mobilidade na alta de Coimbra.
O novo Pólo está implantado na encosta de um pinhal, situado nos arredores da cidade, concretizando-se num conjunto de edifícios que promovem a continuidade, a unidade urbana e a ligação com o meio em que se inserem. O território é a peça fundadora desta nova parte da cidade. A inclinação muito acentuada possibilita a intensa relação com o vale curvo do Rio Mondego. O plano retoma a referência à tradição tipológica dos colégios da antiga Universidade de Coimbra, favorecendo o desenho do espaço público, as relações visuais entre os diversos edifícios e a paisagem natural envolvente. Gonçalo Byrne através do desenho do conjunto dos Departamentos de Engenharia Eletrotécnica e Informática concebe uma geografia arquitetónica. O conjunto é cortado em dois edifícios e de modo a reforçar a sua integração urbana é atravessado por uma escada pública já prevista no Plano de Pormenor do Campus. Cada edifício divide-se em quatro corpos perpendiculares à pendente, de topo virados a sul, que tiram partido da luz, possibilitam vistas e estabelecem uma relação privilegiada com a paisagem. A situação geográfica é passível de ser observada em diferentes enquadramentos, sendo mesmo visível a partir do arruamento superior.
A utilização do branco monocromático, a rigidez, o rigor, as simetrias e a repetição com a disposição hierarquizada do programa e a abertura criteriosa e cuidada dos vãos sintetiza o universo formal e dá continuidade e integridade ao espaço vazio e aos volumes.
O funcionamento interno é claro e hierarquizado. O programa está distribuído pelos dois edifícios de maneira idêntica. O projeto é determinado por uma evidente delimitação do edifício, por uma matriz global de continuidade distributiva e por uma adaptação à topografia e aos contornos do terreno. Byrne estabeleceu ligações entre os dois edifícios ao nível dos átrios principais e ao nível das bibliotecas por debaixo da escadaria, mas garantindo ao mesmo tempo a sua autonomia. Existe um corredor central que faz a distribuição para as salas viradas a nascente e a poente. Existe um outro corredor aberto à paisagem e paralelo ao Rio que atravessa e liga os diversos corpos. Privilegia-se a circulação longitudinal em dois níveis, superior e inferior, onde se concentram os acessos verticais principais e cuja organização permite a separação vertical entre a área dos professores e a dos estudantes. À cota inferior encontram-se a entrada principal, as salas dos professores e os serviços administrativos. A cota superior é a do piso térreo e permite o acesso aos corpos que contém as salas de aula, anfiteatros, laboratórios e biblioteca. Este piso conta ainda com, ao longo de todo o percurso, uma vista para o vale, favorecido pela inclusão de pátios ajardinados. É o programa dos auditórios que introduz variações ao conjunto repetitivamente estabelecido – uma torção num dos corpos e uma forma cilíndrica provocam a exceção.
Gonçalo Byrne sempre esteve empenhado em encontrar significado para a arquitetura através do desenho urbano. Desenvolve atividade própria desde final dos anos sessenta, tendo apresentado desde cedo uma obra abertamente referenciada ao desenho urbano e ao contexto em que se insere. Byrne procura acentuar a ideia de que a arquitetura é uma disciplina de rigor, e por isso, deseja através do seu trabalho qualificar o papel do arquiteto. E privilegia assim um processo de relação e de responsabilização com o real construído e com a realidade coletiva.
O projeto é, para Byrne, uma coisa mental, porque parte sempre de uma ideia que é fruto da reação com o sítio, com o programa e com o tempo. Segundo Gonçalo Byrne cabe ao arquiteto constituir uma estrutura consistente para que a obra tenha vida longa e própria, sobrevivendo ao uso e à cidade, que é um organismo complexo.
E talvez assim se possa afirmar que a cidade, a paisagem, a ordem e o fragmento sejam a sequência chave que caracteriza o desenho do conjunto dos Departamentos de Engenharia Eletrotécnica e de Engenharia Informática, em Coimbra.
Ana Ruepp