A FORÇA DO ATO CRIADOR
O purismo cúbico do Instituto Superior Técnico de Porfírio Pardal Monteiro.
Primeiro campus universitário em Portugal e primeira obra pública modernista construída no novo regime ditatorial que se foi assumindo fascizante desde 1926.
O Instituto Superior Técnico (1927-41) foi construído na periferia de Lisboa numa franja elevada e privilegiada do novíssimo plano das Avenidas Novas, a Sul do ainda não concluído Bairro Social do Arco do Cego, a obra está deliberadamente virada para futura zona de expansão, ainda rural de costas viradas para a cidade. Peça funcionalista, declaradamente excecional e urbana, é fundamental para expansão de Lisboa a nordeste que cose e une (através da Alameda D. Afonso Henriques) o eixo Avenida da Liberdade / Avenida Fontes Pereira de Melo / Avenida da República ao eixo Rua Nova da Palma / Avenida D. Amélia (atual Avenida Almirante Reis) / e futura Avenida do Aeroporto (atual Gago Coutinho).
A construção foi conduzida por Duarte Pacheco, então Ministro e Diretor do Instituto Superior Técnico (IST). Porfírio Pardal Monteiro, assistente da cadeira de Arquitetura no Instituto, é um dos arquitetos da mais estreita confiança de Duarte Pacheco pela capacidade e determinação em ambiente politico ainda incerto.
A obra é espelho da primeira geração moderna portuguesa definida nos anos 20 e 30. Determinada por um movimento não organizado, uma linguagem comum, não interiorizado e não teorizado, a geração distancia-se das preocupações sociais que estão na origem da obra de autores como Gropius ou Le Corbusier. Baseia os seus conhecimentos do internacionalismo através de escassos periódicos dedicados à disciplina e breves estadas em França, Alemanha, Holanda ou apenas Espanha.
O Instituto Superior Técnico racional e funcionalista pretendia revelar o espírito do tempo ao introduzir um ‘universal’ gosto urbano associado a formas, programas, materiais e técnicas novas (e.g. betão armado).
A persuasão moderna da obra conseguiu contaminar formalmente um contexto ainda indefinido – o Instituto Nacional de Estatística (também de Pardal Monteiro); as moradias destinadas a professores dispostas a Norte do campus e que bordejam o Bairro do Arco do Cego; a Casa da Moeda; e o Liceu Filipa de Lencastre.
O vocabulário depurado utilizado é de grande impacto no lugar e rompe com a linguagem figurativa. As formas agora puras e cúbicas são como que trazidas de outro contexto. As arestas são vivas, os volumes lêem-se como um todo, o entendimento das caixas pelo exterior revela o funcionamento dos espaços internos, o betão é armado, o reboco integral, uma só cor, as fachadas são livres permitindo os grandes envidraçados metálicos retangulares e a cobertura é plana.
Os serviços da direção, administração, o curso geral e de engenharia civil concentram-se no pavilhão principal. Pelos pavilhões mais afastados e mais puristas distribuem-se os cursos especiais de engenharia de Máquinas, Eletricidade, Química e Minas, as oficinas e as instalações desportivas.
Pardal Monteiro, tal como outros arquitetos da sua geração, encontra no modernismo um simples registo expressivo formal que se vem acrescentar às expressões historicistas, revivalistas, ecléticas e regionalistas.
O Instituto Superior Técnico aposta numa renovação linguística de mais um estilo disponível recorrendo ainda a certos apontamentos que denunciam a formação beaux-arts do autor, tais como:
* O plano de urbanização da Alameda, Instituto Superior Técnico e Instituto Nacional de Estatística, firmado por Cristino da Silva fixava determinante a implantação do conjunto segundo regras de axialidade, de simetria e de hierarquização.
* A obra é pública e por isso monumental. Afirma-se a escala de um regime acabado de se instalar e o seu posicionamento como se de uma acrópole se tratasse.
* O pavilhão central impõe-se claramente no cimo da alameda dispondo hierarquicamente os seus volumes e as suas entradas. O seu volume central determina-se o mais importante e mais elevado revelando a presença de um átrio nobre.
* A importância ‘decorativa’ da frente do pavilhão central desenhada para a Alameda – os detalhes, ainda que geométricos dos envidraçados metálicos e dos grandes elementos verticais (pilastras). A decoração já abstrata é desenhada sobre painéis ainda à maneira art déco.
O modelo modernista, declaradamente adequado à instituição, deixou os primeiros traços durante os primeiros dez anos do regime, porém a aproximação cada vez maior dos arquitetos ao poder, querendo expressar nacionalismo terminou com vanguardismos.
Ana Ruepp