LONDON LETTERS
The post-factual politics, 2016
Tenho por mim que, ao fim do dia, quanto sobrevém é a vera natureza humana de cada qual. Daí a indispensável ironia para gerir o choque entre pontos de vista e mensurar as diferenças entre as potenciais consequências. A campanha referendária sobre a permanência ou saída do reino da European Union está oficialmente etiquetada como a lying game. — Chérie.
Qui n'a point argent en bourse ait miel en la bouche. A transformação de um ato capaz de moldar muitas vidas num baile de máscaras tem implacável relatório da House of Commons. O cross-party Treasury Committee não deixa pedra sobre pedra nos argumentários de Bremainers e Brexitters, a uns e outros acusando de desinformar os eleitores com arrazoados fantasiosos. — Yep! A good man out of the good treasure of heart brings forth good things, an evil man out of the evil treasure brings forth evil things. O G7 grifa o alerta de catástrofe por retirada continental e Monsieur Jean-Claude Juncker adverte os Leavers com represálias de Brussels. O English Channel é a nova fronteira marítima na crise dos migrantes. Turkey aprova lei das imunidades parlamentares e o President R Erdogan engendra uma arma política contra os deputados curdos. Na never ending global tour, Mr Barack Obama abraça os sobreviventes da nuclearizada Hiroshima.
A mild weather with a few showers em London. Uns belos 20 graus e harmonioso Chelsea Flower Show na retina contrastam com o circo político que roda pelo país nos berrantes autocarros da batalha referendária e balde de água gelada lançado do Palace of Westminster sobre os artistas. Se o Great Spring Garden leva à final doze orgulhosos hortelões e dúzia de admiráveis obras florais, já o debate europeu antes apresenta um ramalhete de personagens cada vez mais a esgrimir razões a little bit silly. Mas vamos por etapas, quando o purdah impede HM Government (e o par Civil Service) de intervenção em matérias eleitorais e a guerra civil nos Tories entoa cânticos de desafio à liderança do Premier David Cameron. A exposição da Royal Horticultural Society repete o sucesso anual a que a todos habituou, desde que, em 1912, abre portas à criativa excentricidade dos +/- amadores jardineiros locais. Health, Happiness & Horticulture é lema a pontuar o tema de 2016: “to champion the benefits of greening-up our grey spaces,” sob benção da Queen Elizabeth II e no âmbito da Greening Grey Britain Campaign. Nesta linha de amenidades também Downing St serena os fogos a lavrar entre os mineiros da Tata Steel (em acelerada operação de venda, sob o espetro do desemprego) e os Juniors Doctors (em expedito compromisso de novo acordo laboral, após cinco inéditas greves no NHService).
As espécies na mostra de Chelsea contêm muitas perennials, aquelas plantas e flores that come back year-after.year-after.year. A contar os dias para o Chilcot Inquiry sobre a Iraq War, lemos, ouvimos e vemos Mr Tony Blair aqui, ali e acolá. Em destaque nas Sunday Politics, qual true garden-lover insuscetível de libertar obra prima, o ex primeiro ministro trabalhista acaba a escalpelizar a paisagem política onde renasce o New Old Labour. E surpresa, surpresa! O padrinho da Third Way adverte que, entre outros demagogos, o sucessor RH Jeremy Corbyn é (1) "a result of the way the world works these days," (2) "a big challenge for the centre;" e (3) "a very dangerous experiment for a major western country to get gripped by this type of populist policy making, left or right." Mais, em estilo daquelas peonies que oferecem todas as cores except the blue: "I do think the centre ground needs to work out how it recovers its... gets its mojo back, and gets the initiative back in the political debate because otherwise... these guys aren't providing answers, not on the economy, not on foreign policy."
Que a salada de ideias no Labour Party é assaz pitoresca, na conjuntura, confirmam múltiplas sondagens onde o Right Honourable ‘Comrade’ Jez Corbyn não descola face a agastado PM publicamente desafiado por ministers & backbenchers aborrecidos com súbita e feroz eurofilia. O commentariat espelha o caos e os efeitos do Project Fear brotado do Number 10. Regressado à primeira linha pública com a eleição do Mayor of London e a defesa da integração europeia, até o has been RH Ed Miliband anima o Tweetminster com a quimera de estar routing back to the Labour leadership. Misterioso? Não, de todo. Com os reds envoltos no anyone but Corbyn, os blues persistem no fog in the Channel. Avulta aqui o quem, o quê e o como do documento do prestigiado Treasury Select Committee. Atendendo ao quem-é-quem nas fileiras In/Out do euroreferendo, o dedo em riste dos MPs é grave. Respetivamente lideradas pelo Prime Minister Dave Cameron e o Chancellor George Osborne vs RHs Boris Johnson e Michael Gove, a composição do TSC diz do lato desagrado face às campanhas em curso: seis Conservatives, quatro Labourites e um SNP. A censura? Logo na abertura do relatório "The economic and financial costs and benefits of the UK’s EU membership," o Chairman Andrew Tyrie é seco: "The arms race of ever more lurid claims and counter-claims made by both the leave and remain sides is not just confusing the public. It is impoverishing political debate.” A reguada do Con MP por Chichester gera glosa polifónica. Um só exemplo, pois que a isto chamo caçar um bando de perdizes com um só tiro de caçadeira. Escrevendo na Spectator, Mr Peter Oborne reflete o estado de espírito da crescente ala crítica governamental: “The Chancellor and PM are trying every dirty trick in the Blairite book to win a Remain vote.” Em causa estão dolosas artes de plantação ficional em… dodgy dossiers. Nos trilhos do empoeirado voto de 23rd June: Only 23 days to go…
Em dias históricos tão densos quanto os que assinalam as terríveis batalhas de Verdun (France, na I World War) e Jutland (North Sea, na I WW), entre adornos de flores e elites de pinóquios, há ainda um número oficial a assombrar Britain. O censo é fresco e denota a metamorfose observável no berço da mais velha democracia ocidental e na coroa de defensora da fé – o que é mais que as letras na pound coin que escoltam a imagem da Queen’s head com a frase ELIZABETH II D.G.REG.F.D. para significar “Elizabeth II Dei Gratia Regina Fidei Defensor.” Pois o reino de Elizabeth II, by the Grace of God, Queen, Defender of the Faith está a perder os laços com o altar. Em cada 100 bretões, 44 declaram-se cristãos e 8 afirmam professar outras religiões mas 48 dizem não ter fé alguma. — Well! Do remember Master Will in “Richard II:” The love of wicked men converts to fear, that fear to hate, and hate turns one or both to worthy danger and deserved death.
St James, 30th May
Very sincerely yours,
V.