CRÓNICA DA CULTURA – O INÍCIO…
E quase gritava o convidado da conferência a que assisti há alguns (poucos) anos:
Quem não está no Facebook não existe! Definitivamente ainda não começou a ser nada neste novo mundo onde todos nós nos conhecemos para felicidade nossa. Evoluir é isto. O Twitter também faz parte intrínseca e indispensável do nosso percurso.
(e por aí adiante, continuou)
Ora bem. Eu não estou no Twitter, nem no Facebook; nem penso que se estivesse em ambos ou num só, estaria ergo sum. Sei que há quem entenda poder julgar-me pelo que acabo de dizer, contudo eu não os julgo, nem mudo nada por assim ser, nem me atormento por esse facto.
Vivem-se tempos – fora e dentro do Twitter, do Facebook ou de outras “novidades” similares - em que a maioria diz uma coisa e seu contrário, e, nem mesmo assim, tudo junto, exprime uma minúscula ideia que seja. Cada vez mais, tudo se consome logo ali, na tagarelice que muito leva a que se vote por opiniões expressas por outro, tendo chegado a este outro por vias de um éter com força de ordem e ADN desconhecido.
E esta realidade leva-me a pensar na privacidade; num universo oposto ao Big Brother. Uma privacidade enquanto “local” onde se gera um raciocínio tranquilo, pesando pós e contras, oposto à chamada sociedade liquida sem pontos de referência e na qual o projeto é fazer-se ver.
Deixou de existir a ideia - que entendemos necessária - de que exista uma construção higiénica do pensar. Nela haverá sempre rebelião, transgressão, equilíbrio, inocência primordial, enfim tudo o que caracteriza a circunstância humana e que é meio de gerar uma possibilidade.
Li em Zygmunt Bauman, que nos tempos atuais, as relações entre os indivíduos são cada vez menos frequentes e menos duradouras. O amor é mero acumular de experiências e o sentido da união foi empalado pela insegurança e vai surgindo a «sociedade confessional» como sendo a que que promove a exposição pública dos espiões e dos espiados, conduzindo a que todos se identifiquem por uma soma, que, resultará num número que faz parte do conhecimento inútil, recordando aqui Jean François Revel. Esta a sociedade que afinal o conferencista que ouvi, entendia por quase-perfeita.
É assim, a vírgula passou a adenda e o ponto de interrogação perdeu a razão de oxigenar. As acrobacias são miméticas e o meu rio, esse, no seu modo, insiste e vai até ao mar conhecer o seu início.
Teresa Bracinha Vieira
Janeiro 2017