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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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CRÓNICA DA CULTURA

 

Reflexão à verdade

 

A ciência começa com a observação, ou começa quando se não verificam as expectativas que aguardávamos? Como todos sabem, existem variadíssimas opiniões sobre este assunto. Ainda assim se pode dizer que uma teoria que se depara com dificuldades, essa teoria frusta expectativas e levanta problemas para os quais tentamos soluções. Estas soluções, por muito certas que sejam darão azo a novos problemas, a críticas mais engenhosas que as colocarão em causa. Acreditamos que desta forma o nosso conhecimento aumenta à medida que as nossas expectativas são refutadas, à medida que enfrentamos problemas.

 

E que fazer ao que até nós entrou pelos sentidos? Que fazer à nossa tábua rasa preenchida por estes? E que fazer ao que nos chega através de hipóteses ou seja pelo conhecimento hipotético? E como não ter em conta que existe conhecimento inato à partida? Certo é que correções e modificações do conhecimento anterior conduzem ao aumento do conhecimento, tendo por base as expectativas e hipóteses. Todavia, para observarmos temos de ter uma questão concreta em mente que seja resolvida pela própria observação, e aqui, recordo Darwin e o pouco que sei do seu conhecimento imenso, mas lembro que ele escreveu “Como é estranho que alguém não veja que toda a observação deve ser a favor ou contra uma opinião qualquer…”. Assim será que a observação vem depois da expectativa ou da hipótese e os problemas da perceção deveremos remete-los à filosofia ou, mais precisamente à epistemologia?

 

Colocando aqui ainda a base que virá de um problema teórico ou prático, temos sempre de nos familiarizar com ele, fazê-lo suportar soluções inadequadas para as criticarmos, trabalharmos o problema, sabermos das suas ramificações e as suas relações com outros problemas, aprender determinando os erros cometidos.

 

Diga-se que tudo o que tentei dizer esteve ligado ao abordar da verdade, pensamento com o qual iniciei este texto. Ora, bem creio que a poesia não aborda a verdade, mas bem creio que chega mais próximo da verdade que outra qualquer forma de literatura, e esta realidade que afirmo não é desprovida de significado, se porventura não nos esquecermos de a tentar melhorar com o rigor e a exigência da palavra que exprime o sentir que mais corresponda a uma aproximação da verdade.

 

A poesia tem em si uma metodologia sólida que não deve colocar em causa o modelo da transmissão do sentir da realidade apreendida e sempre posta em análise, e só assim pela reflexão de algo anterior que nos surge, chega o aproximar do real conhecimento do poeta em busca do princípio sagrado do dizer.

 

Teresa Bracinha Vieira
 

(1) (v. More Letters of Charles Darwin, organizado por Francis Darwine A. C. Seward Appleton, Nova Iorque, 1903, volume I, p, 195)
(2) (Cf. G. Polya, How to Solve it, Princeton University Press, Princeton, NJ, 1948.

BALADA

 

Querida irmã,

 

Fui ao palácio dos limões de ouro e pedi um para ti. Responderam-me que ainda não estavam maduros e que quando amadurecessem me dariam um. Aguardei. Voltei ao caminho real e trouxe-te o limão que aqui tenho para te dar.

 

Irmã minha, sei que estás doente, sei que estás de cama, mas vem à janela da sala e como sou eu, abre-me a porta e vem buscar este tempo dos limões de ouro maduro. Quando o tiveres na mão, vai abrir-se ao meio o tal caminho real, irás por ele até ao colo quente da mãe que tem para ti uma garça, e voltarás para tua casa com ela, mensageira de tanto.

 

O teu destino, irmã, vai bem cedo deixar-te os olhos sem medo e a resposta à pergunta vais tê-la no cesto onde guardas as memórias do teu coração.

 

Sei eu, e a mãe também, que, o ofício de ir ao cesto, nasce secreto para cada uma, e na torre da nossa linhagem, assim se concebe um filho ou não tivesses recebido por marido a notícia que mais querias.

 

Querida irmã, que tenho este limão de ouro para ti e uma arca de mil ducados e se levares a saia rodada, vai pela mão do nosso irmão, e diz-lhe que tenho um outro limão para ele e nossa mãe uma outra garça. Diz-lhe também que o pai lhe envia um beijo com formato de candeia e a carta, essa mesma que ele espera de pequenino. 

 

Teresa Bracinha Vieira