Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

A FORÇA DO ATO CRIADOR

 

O espaço de uma casa.

 

'We have to describe and to explain a building the upper story of which was erected in the nineteenth century; the ground-floor dates from the sixteenth century, and a careful examination of the masonry discloses  the fact that it was reconstructed from a dwelling-tower of the eleventh century. In the cellar we discover Roman foundation walls, and under the cellar a filled-in cave, in the floor of which stone tools are found and remnants of glacial fauna in the layers below. That would be a sort of picture of our mental structure.' , C. G. Jung

 

Os espaços, habitados pelo homem, transportam memórias e despoletam a imaginação. Gaston Bachelard no livro 'The Poetics of Space', escreve que a imaginação está constantemente a imaginar e a enriquecer-se incessantemente com novas imagens. E o homem é um ser que se desenvolve e valoriza ao imaginar. 

 

Bachelard explora o espaço da casa, como sendo aquele que gera as imagens mais primárias e que despoleta o conhecimento do ser mais profundo do homem. A casa, para Bachelard, funciona como um instrumento capaz de analisar a alma humana. 

 

'The house images are in us as much as we are in them.', G. Bachelard

 

A casa, segundo Bachelard, é uma entidade fenomenológica privilegiada - é um espaço que acolhe e protege e é capaz de integrar e unificar todos os valores mais complexos, de um espaço interior. A casa é, para o homem, fonte inesgotável de imagens dispersas e concentradas. No espaço poético da casa, todo o homem se revela na sua essência assim que se dispõe a sonhar. 

 

'All really inhabited space bears the essence of the notion of home.', Bachelard

 

Os limites de uma casa, são determinados por quem a habita. O homem experiencia a casa na sua totalidade através dos seus pensamentos e sonhos.

 

Para Bachelard, as memórias do mundo exterior nunca terão a totalidade das memórias que pertencem a uma casa. E o homem ao evocar essas memórias enriquece os seus sonhos e a sua imaginação - segundo Bachelard, é a imaginação que faz aumentar a importância de uma determinada realidade espacial. 

 

Uma casa abriga e protege mas sobretudo concede e possibilita a criação de sonhos, de memórias e de todos os pensamentos do homem.

 

Os sonhos, as memórias, os pensamentos são imóveis mas quanto mais fixos e mais ligados a um espaço, mais vivas e reais se tornam

 

'Thought and experience are not the only things that sanction human values. The values that belong to daydreaming mark humanity in its depths. Daydreaming even has a privilege of autovalorization. Therefore the places in which we have experienced daydreaming reconstitute themselves in a new daydream.',

Bachelard

 

O homem estabiliza e conhece-se melhor a si próprio ao fixar-se espacialmente. A casa permite ao homem existir como um ser unificado e não um ser disperso. Acolhe-o em todos momentos da sua vida. É uma extensão do seu corpo e do seu espírito. É o seu primeiro mundo. A imobilidade de uma casa permite a aproximação entre a vida exterior e a vida interior. O espaço da casa está inscrito fisicamente no homem. E por isso, Bachelard acredita que o homem é o espaço onde habita e a casa o espaço, por excelência, do ser.

 

'Suddenly, a room with its lamp appeared to me, was the almost palpable in me.'

Rilke em 'My life without me'

 

Ana Ruepp