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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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AS ARTES E O PROCESSO CRIATIVO

 

XII - PINTURA METAFÍSICA

 

Escola de pintura fundada em Ferrara, Itália (1917/21), resultante do encontro de Giorgio De Chirico, Alberto Savinio, Carlo Carrá e de De F. Pisis, a que se juntou G. Morandi.

 

Inspirada na cultura greco-romana e na filosofia europeia, a pintura metafísica recusa a arte abstrata e contrapõe-se ao cubismo e futurismo, retomando a tradição de um certo regresso à figuração e ao simbolismo, representando realidades que transcendem a experiência do sensível, refugiando-se na mitologia, no onírico, no absurdo e no sonho. A contemplação e quietude que nela sobressaem têm semelhanças com mestres da pintura italiana, como Giotto. Também sobressai o insólito, figuras humanas que parecem estátuas, por vezes andrógenas. Pretende, em termos atuais, enquadrar estátuas do mundo antigo (anacronismo).

 

Giorgio De Chirico foi a figura emblemática, marcante e líder deste movimento, fundando a revista Pintura Metafísica, em 1920.

 

De Chirico, grego de nascimento e de formação alemã, apresenta-nos construções geométricas e pinturas enigmáticas, misteriosas, em que elementos e objetos não se relacionam entre si, pinturas melancólicas e nostálgicas com referências à arquitetura e escultura greco-romana. Há a criação de situações absurdas, incomunicáveis, anacrónicas, que inspiram a admiração e a observação contemplativa. O resultado é uma pintura em telas de atmosfera mágica, misteriosa, inexplicável, sigilosa e silenciosa, em que a paz, repouso e tranquilidade se aliam ao inusitado, incomum e excentricamente original.

 

No reportório arqueológico de Chirico, destaca-se Canto de Amor, de 1914, em que uma cabeça da antiguidade clássica grega e uma luva vermelha de borracha dos nossos dias, um muro de cimento e claustros antigos, o azul do dia e o negro da noite, se apresentam extremamente imóveis, hesitando entre o passado e o presente, numa estrutura visual metafórica apelativa, contemplativa e meditativa. Obcecantemente estranha e metafísica, com imagens estilizadas, ilógicas, incoerentes, incongruentes, austeras, misteriosas, coabitando no mesmo espaço e lugar, em associações desconcertantes e não usuais. Uma misteriosa solidão, um lugar deserto, em que uma bola e um comboio sugerem atividade humana, mas onde não há pessoas. Esta magia pré-surrealista carateriza as obras da fase de maior maturidade de De Chirico, como os manequins de As Musas Inquietantes (1916), interiores habitados por objetos quotidianos, a série dos Arqueólogos, os Gladiadores e os Móveis no Vale.

 

Fixando-se em figurações representativas com referências à arte clássica, Chirico, como Carlo Carrá, preferenciam a representação de edifícios e espaços urbanos misteriosos, praças vazias povoadas por estátuas, manequins, figuras, coisas indesvendáveis e nebulosas, onde impera e impressiona a imensidão, solidão é sinónimo de imobilidade, com influências de Nietzsche, Kant, Shopenhauer e Weininger.

 

O esvaziamento do futurismo, com a recusa da expressão do movimento e afastamento da estética industrial ligada à máquina, conduziram Carrá à Poética das Coisas Vulgares (1914/21) e à pesquisa da integridade do objeto em O ídolo hermafrodita (1917). Refira-se ainda a Musa Metafísica, de 1917.

 

Com as suas metamorfoses zoomórficas, há em Savinio uma surpresa ambígua provocada pela radicalidade associada aos seus objetos.

 

Morandi, por sua vez, atingiu a pintura metafísica seguindo uma lógica interna de pesquisa pessoal, formal e plástica, via utilização nas naturezas mortas de um manequim, uma esfera e um esquadro, numa geometria de composição de caraterísticas meditativas.

 

A pintura metafísica foi um dos movimentos precursores do surrealismo, nomeadamente com o contributo de imagens anormalmente excêntricas de Giorgio De Chirico.  

 

13.06.2017
Joaquim Miguel De Morgado Patrício