Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!
Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!
Chegados ao dia 31, devemos invocar o grande escritor português do mês de Agosto – que é Manuel Teixeira Gomes.
Agosto Azul – é uma referência inesquecível, que invoca o Algarve, o Sul, o Sol, o Mediterrâneo. Sim, porque Portugal é fruto do casamento marítimo do Mediterrâneo com o Atlântico. Daí o Promontório Sagrado, que une as duas extraordinárias vocações e influências. E de Teixeira Gomes, o algarvio que foi Embaixador, escritor, Presidente da República, referência cívica devemos lembrar um pequeno retrato que nos deixou:
«Fiz-me negociante, ganhei bastante dinheiro e durante quase vinte anos (1890-1910) viajei, passando em Portugal poucos meses. Montei a vida de forma que na região compreendida pelo norte da França, a Bélgica e a Holanda, onde vendia os produtos do Algarve, levava quatro ou cinco meses, ia a casa liquidar contas, e depois nos cinco meses restantes, livre e despreocupado, metia-me no Mediterrâneo, cujas costas visitei por assim dizer passo a passo».
De tal modo foi apaixonado do Mediterrâneo que acabou seus dias em Bougie, lembrando no azul-cobalto do mar o seu Algarve de sempre… E a Norberto Lopes, confessará como é o seu dia. E descobrimos como são diferentes os hábitos desse tempo. E a vida frugal do escritor impressiona-nos…
«Levanto-me às quatro da manhã. Preparo eu mesmo, no quarto, o meu almoço. São as melhores horas do dia, aquelas em que ainda posso fazer alguma coisa: ler, escrever. Ao meio-dia, janto. Às duas e meia, saio para ir ao correio. Às quatro, tomo um chá de tília – e em seguida recolho-me. Creio que é, em parte, devido a este regime alimentar que me vou aguentando. Além disso, tenho as cartas, os artigos, os livros, é isto que me prende à vida».
Ah! Como se lembra a sociedade rural de antanho – o almoço ao alvorecer, a janta ao meio-dia, e, por fim, a merenda e a ceia… Como mudou tudo, por causa da eletricidade e da possibilidade de termos luz durante mais tempo e não apenas dependente do irmão sol…
Os ulmeiros frondosos vão-se despedindo aos poucos da estação das alegrias. Habituaram-se que o Verão fosse breve como breve a felicidade, e que o Outono lhes fazia sentir que a queda das folhas exprimia a solidão dos campos, os dolorosos versos do entendimento das separações.
No Inverno as arvores perdem os espectadores, perdem-lhes a companhia e a capacidade de a encantar, e é como se vivessem para dentro um tempo desastrosamente melancólico e frio. E cismam, cismam com o prémio da saudade como devaneio doce e não dor.
Os ulmeiros, dizem, entram em descrença por deixarem de acreditar numa reabilitação primaveril que já tarda. São pais de família e desconhecem o que dizer aos filhos que lhes não perturbe a profundidade do antever do futuro de afastar a ideia de um abismo ou a perceção das lágrimas no rosto de quem passa.
E eis que escutam um chilrear alegre de quem chega de uma viagem. São as andorinhas, são os trovadores portugueses. Começa-se a notar um certo movimento auspicioso como prenúncio de uma lenda que acontece. E os ulmeiros, de qualquer natureza que eles sejam, entendem que a grande arte da vida vai ter enfim, uma outra estação de glória que a precede, e que afinal de nenhuma, a queixa se escreve em cadernos de alma, antes são tempos que também se fazem do interior exclusivo de fenómenos, e, sempre a seu benefício. De todos os ângulos sempre e unicamente Vida.
- Hoje não sei se é da minha idade, mas o que mais me separa dos outros é a natureza das suas aspirações. Eles não querem nada do que eu quero. Mas devo dizer-te que isso já não me preocupa muito. Aliás, já poucas coisas me preocupam nem mesmo a maneira de encarar a morte. Mas por outro lado sinto que os outros fazem parte da minha condição terrena.
António Alçada Baptista, in “O Tecido do outono” 1999, ed. Presença
António Alçada Baptista, a ternura, a delicadeza num projeto de vida diferente em permanente respeito pelo misterioso. Este meu padrinho de casamento, este meu padrinho DE MUNDO, bem me ensinou a acenar SEMPRE àquela natureza que era a única chave de entrada e de saída AO CERNE DO SER.