CRÓNICA DA CULTURA
Em setembro podem surgir maios em bouquet de rosas que adocicam o chão onde poisam as folhas caídas que já criam alterações sensíveis nos sentimentos e nos costumes dos olhos.
Hoje mesmo, um trovador de Veneza, sentado à margem das árvores que já cumprem os ritos da estação que chegará, puxou de sua lira e dela um hino de louvor de abrigo ao mundo, abriu os braços a quem passava.
E por entre quem passava podia-se escutar Steiner a dizer
«(…) noventa por cento dos seres humanos não contribuem nada para o avanço do conhecimento, para as conquistas estéticas ou científicas e para o legado das coisas extraordinárias, de que a nossa civilização depende.»
E setembro acrescenta
«Existe uma espécie de lepra, num mundo que permite a coexistência de crianças esfomeadas mental e fisicamente e de outras de ambientes super protegidos e rodeados de livros e vestimentas da bourgeoisie a fim de que futuramente possam parir um mundo igual em conteúdo de lepras e no eclodir de catástrofes.»
Desconheço toda a força do bouquet dos maios, digo, e também a de setembro no enfrentar a insignificante e poderosa escala dos forjadores da infelicidade dos tempos.
Os mexericos por eles usados para diagnosticarem se a dose dos seus processos resulta, são o único meio de, como ratos que são, continuarem a viver uma vida de terceira ou 14º ordem que esqueça, inclusive, aqueles que padecem da fragilidade física da doença, da idade ou da ausência de ternura e de amor de desempenho superior.
E é setembro! E mais outra vez o mal é a ausência do bem ou a ausência de tudo. Outono e Inverno mesclam-se de mãos para protegerem o bouquet dos maios. O trovador das estações dirige-se ao Verão numa filiação de esperança, mas sabendo que o credo continua a caracterizar a circunstância humana. Sabendo que o credo continua a perguntar-se à beira-mar. E a resposta.
Teresa Bracinha Vieira
Setembro 2017