Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

O PATRIMÓNIO DOS EDIFÍCIOS DE TEATRO E ESPETÁCULO EM GUIMARÃES


A tradição histórica e urbana concilia-se com a modernidade, desde que se harmonizem épocas e estilos arquitetónicos, dentro da malha urbana respetiva, e desde que se respeite a coexistência de estilos e funcionalidades. O que em rigor não é fácil e não é muito habitual. Mas quando ocorre valoriza a estética e a funcionalidade, desde que, repetimos, se atinja um ponto de equilíbrio estético e estilístico. Não faltam bons e maus exemplos.

 

E um desses exemplos, relacionado com a edificação/recuperação/reconstrução do património ligado à cultura e ao espetáculo, temo-lo em Guimarães com a harmonização arquitetónica e urbanística do palácio de Vila Flor e do centro cultural homónimo e próximo, marcando ambos  a continuidade histórica e urbanística da cidade: o Palácio vem do século XVII, o Centro Cultural foi inaugurado em 2005.

 

Vejamos o “histórico” de um e outro.

 

O palácio de Vila flor foi construído por iniciativa de D. Tadeu Luis Lopes da Fonseca, nascido em 1653, e que lá viria a falecer em 1759. Membro da Real Academia da História com a designação académica de Tagomelo Corinteo, fundou a chamada Academia Vimaranense, que muito evocaria em poemas hoje pouco relevantes.

 

Veja-se um exemplo:

 

“Pego na pena e vou poetizando/Del Rey o nome mais se imortaliza/Em Guimarães onde o soleniza/ Sua Alteza em ações tão notórias/ Que excedem o volume das histórias/ Será o real nome em culto fiel/ Mias imortal que a Torre de Babel”.

 

O poema é citado por Maria Adelaide Pereira de Morais que historiou o Palácio e a família, a qual lá se mantém até pelo menos 1829. Nessa data, o Palácio é vendido a um emigrante retornado do Brasil, de seu nome Lourenço de Arrochela Malheiro. A família é nobilitada em 1852, na pessoa de um magistrado de seu nome Nicolau Vieira de Almeida de Morais Pimentel, que naquele ano recebeu no palácio a rainha D. Maria II e o seu marido D. Fernando.  (cfr. Maria Adelaide Pereira de Morais “História do Palácio de Vila Flor e Cavalinho” in “Boletim de Trabalhos Históricos”- 2005).

 

Em 1881 o Palácio é adquirido por um Engenheiro, diríamos hoje, de seu nome António Soares Veloso. E é notável a opção: em 1884, é instalada em terrenos adjacente do palácio a estação de caminhos de ferro. E mais: no Palácio organiza-se uma Exposição industrial, o que é de facto notável para a época…

 

Até que em 1908 o palácio é adquirido por Bernardino Jordão. E a família Jordão surge mais tarde ligada à fundação de um dos primeiros Cine Teatros, precisamente denominado Cine Teatro Jordão, que há bem pouco tempo se mantinha em atividade. Alfredo Pimenta não poupa elogios a este vimaranense que muito fez pelo desenvolvimento da cidade. (in “Páginas Minhotas – Aquela Casa à Beira da Estrada”).

 

Mas importa agora referir o Centro Cultural de Vila Flor, este marcante na modernidade da sua traça: e moderna que seja e é, não colide com a tradição histórico-urbanística da cidade. Inaugurado em 2005 segundo projeto arquitetónico de Manuel Vilhena Roque e Seara de Sá, o edifício, de grande modernidade estilística, comporta três corpos que albergam dois auditórios de 800 e 2000 lugares.

 

Citamos, para terminar, a memória descritiva deste projeto, onde se esclarece que da “relação entre o jardim e a cidade decorreu a necessidade de fracionar os volumes e construções, estabelecendo também uma matriz organizacional onde o teatro fosse local de passagem e de permanência”.

 

Pois, como já escrevi em “Teatros de Portugal – Espaços e Arquitetura” (ed. CNC e Mediatexto) “o teatro não será tanto o conjunto das salas em si, mas sobretudo a valência cultural  e social no âmago da malha urbana”.

 

E nesse aspeto, como em tantos mais, Guimarães é exemplar!...

 

DUARTE IVO CRUZ