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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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A FORÇA DO ATO CRIADOR

 

 

Uma breve introdução ao primeiro modernismo em Portugal. 

 

O movimento moderno teve a sua primeira expressão em Portugal, nos anos 20, coincidindo com a emergência da ditadura militar e dominando a construção das cidades portuguesas durante duas décadas. 

 

O primeiro modernismo envolve duas vertentes muitas vezes complementares: os exemplos 'Art Déco' (em meados dos anos vinte) desenvolvem-se depois da Exposição das Artes Decorativas de Paris de 1925, afirmando uma atenção ao pormenor não funcional, com reminiscências geométricas somadas a linguagens de cariz africano e primitivo; os exemplos construídos em volumes lisos e puros, coincidem com a introdução de novos materiais de construção como o betão, o aço e as grandes superfícies de vidro.

 

Os arquitetos que marcam esta época são Cristino da Silva, Pardal Monteiro, Carlos Ramos, Cottinnelli Telmo, Cassiano Branco e Jorge Segurado. Para alguns, decisiva foi a passagem pelo atelier de Ventura Terra, que lhes abriu perspetivas sobre o mundo exterior, transmitindo uma visão de certo modo racional. Igualmente determinante foi a divulgação de revistas estrangeiras e a realização de viagens ocasionais que cimentaram a nova ideologia.

 

Conhecia-se então, mas de modo superficial, obras de Gropius, de Mies, de Corbusier, dando-se mais importância ao modernismo não vanguardista de Mallet-Stevens. Estas novas conceções realizavam-se no plano formal considerando os aspetos funcionais e construtivos, mas sem o impulso teórico e ideológico que assinalava a mudança social.

 

Os responsáveis do sector cultural do regime estavam interessados em exteriorizar uma imagem de renovação e tolerância. O primeiro edifício que manifesta estas propostas modernas é o Cine-Teatro Capitólio, projetado em 1925 e inaugurado em 1931, de Cristino da Silva. É este arquiteto que tem na Escola de Belas Artes de Lisboa um papel preponderante - orientando a aprendizagem para a obtenção de uma linguagem racionalista conjugada com conceitos monumentalistas. Cristino da Silva, a título de exemplo, acentua, com grande rigor e simplicidade, no edifício do Liceu Nacional de Beja, os elementos essenciais da composição - reduzindo assim a mensagem arquitetónica à sua expressão mais simples. Pardal Monteiro, ao contrário de Cristino, nunca abdicou do sistema modernista funcional a favor da arquitetura do regime. O seu léxico é de fácil aceitação e compreensão. Da sua autoria são o Instituto Superior Técnico, as Gares Marítimas de Alcântara e da Rocha do Conde de Óbidos, o Instituto Nacional de Estatística, a Igreja de Nossa Senhora de Fátima, a Cidade Universitária (Reitoria e Faculdades de Letras e Direito) e a Biblioteca Nacional. Carlos Ramos deixou-nos obra reduzida - o Pavilhão do Rádio do IPO acentua relações volumétricas com citações implícitas à obra de Gropius - o exterior acusa totalmente as funções internas. Foi professor da Escola de Arquitetura do Porto e defensor da aplicação dos princípios modernos no caso português. Arredado das encomendas oficiais, por razões de ordem política, Cassiano Branco situou-se como personalidade mais original e mais consciente dos valores estéticos do modernismo (J.A. França, 1979).

 

Foi este arquiteto que influenciou a arquitetura corrente da cidade, porém não consegue apagar o seu ecletismo em certas obras. Jorge Segurado contribuiu para esta nova linguagem com a Casa da Moeda. Cottinnelli Telmo é um artista multiforme, tendo sido arquiteto chefe da Exposição do Mundo Português, participou assim no termo simbólico do primeiro modernismo português. 

 

Afinal, não devemos esquecer o clima de exaltação nacionalista da Exposição e a cedência a valores estéticos tradicionais e rústicos que procuravam ilustrar a ideologia do regime - no entanto não deixam de se fazer sentir no discurso arquitetónico fundamental da iniciativa, as convicções modernistas mais profundas.

 

Ana Ruepp