Se és fogo, como passas tão brando?
El oficio de Cupido, Los Siete Pecados Capitales, Las Siete Virtudes, Los amores de los dioses y Cinco sentidos numa sumptuosa edição da TASCHEN, editora alemã cuja minucia da edição perfeita sempre nos surpreende e surpreenderá.
A recompilação das 143 magníficas gravuras dos princípios do séc. XVII que ilustram o amor em suas alegorias, os provérbios que envolvem a carga erótica latente, a mitologia, as breves frases de amor ardente que elucidam a cor da criatividade dos desenhos e o seu significado, encontram-se neste livro de rara e extraordinária qualidade e beleza.
Permite-nos esta obra viver e entender um mundo da era do Barroco, e, bem usa as figuras de linguagem para reforçar a tentativa de apreender a realidade por meio dos sentidos.
Nomeadamente despertam-nos pedaços soltos do poder do sentir
N’acusons point l’Amour mais notre ame indiscrete
Ou
Because I Have fettered myself
Perch’io stesso mi strinsi
Let us not accuse Cupid, but our own imprudent soul
A arte Barroca foi impactante, expressou as ideias e os sentimentos do artista do século XVII. Gerou encantamento e apelo visual e soube combinar realidades para expressar uma nova conceção de mundo.
O homem culto conhece o espanto que nos provoca a Editora TASCHEN, neste brio de publicação que não descuida a brilhante escolha de Carsten-Peter Warncke, autor nascido em Hamburg em 1947 e que estudou história de arte, arqueologia clássica e literatura, tendo-se doutorado em Hamburgo em 1975 e na Universidade de Gottingen e ser atualmente catedrático de história de arte; autor, aliás conhecido também pelos seus estudos sobre Pablo Picasso.
E porque o que farei na vida do meu pensar terá sempre um relacionar firme e fixo ao que pretendo exprimir, aqui recordo, terra e fogo, ar e agua na intersecção com a peça que sem estabilidade ou suporte que não a da alquimia do dizer, vi na Bastilha com Laure Mathis (Doreen Keir) e David Geselson (André Gorz), na peça “Doreen” em março de 2017.
Confessa um homem, à sua muito amada mulher, todo o seu imenso amor, em jeito de desculpa.
Não se fende a pedra filosofal, mas a sua invisível fratura consolidou-se na matéria-prima do coração e leva-o mesmo à corajosa decisão de ser.
Assim se rompeu a simetria e assim se volveu amor como ser-que-conhece o instante em que se perde e se reencontra, e, só depois se pode em rigor dizer que se conhece a distância e se compreende o ar que o separou respirando-o, respirando o amor que parecia consumido, mas que do longe nos vem, nos torna e tudo ousa. E assim o disse quase em segredo este homem à sua mulher de sempre. Esculpidos numa chama, ela no ouvir, ele no dizer, fez-se assim sentir a cor do carmim.
E baixinho, mas sólido, deste livro nos chega para que adormeçamos em paz
I have been fishing all night; I must dry my little net
E na gravura de oiro as mãos dele secam-lhe o corpo em certezas absolutas, certeiras e incansáveis, e os dois, no tal amor grande como o sono, afinal como o sono quando é gentil.
Teresa Bracinha Vieira