CRÓNICA DA CULTURA
De quem é a culpa? A culpa é nossa.
Continuamos a ver e a interpretar as notícias do burgo e do mundo como se não dessemos conta que, o que ao de cima vem, é o espetáculo do acessório ou nem isso. A lista das futilidades noticiosas mistura-se na dose e sequência de alinhamento propício ao não desvendar daquilo que é verdadeiramente o cerne de uma lista terrífica e que não acaba, e que devia escandalizar-nos de tanto sofrimento e miséria humana, tudo neste século que, afinal, arrasta consigo os plexos de interesses ocultos, depois de nos ter promovido honoris causa ao indiferentismo mais total.
O delírio sem vergonha dos “velhos do Restelo” que nunca pensaram ser críticos também do reverso de si próprios, é pródigo na evidência da fraude do perguntar e premonitoriamente não conseguem melhor do que criticar supostamente antes de um acontecer de matizes nos espelhos, ou, quando já é muito evidente que 2+2= 4. Acresce que se sentem muito estrangeiros no meio dos homens que eles próprios vão regando não vá existir pior num outro mundo. Em tão patética paródia tudo se torna num sem contorno ao qual se afeiçoa a insídia.
Depois os comentadores -pretexto, nova e promissora profissão que os catapulta para capítulos de vida que lhes assegura bem-estar na hora e na velhice, e, não são estes paralisados pelo que se despreza, como se imaginaria, antes fazem parte da natureza da austeridade das regras-que-eu-sou-bom ou boa e tenho poder, principalmente na ilusão da não vaidade que projeto de o não ter. Eu sou a resistência ao sistema à outrance, creiam, eu defendo país e mundo gritando as reformas para nos salvarem, e que cada um não trate de si aproveitando a desordem, não senhora, só se as coisas derem mesmo para o torto, mas nessa altura criarei um novo cânone e dele vos farei saber seguir.
Também os acima dos muitos nos chamam constantemente a atenção para a igualdade de direitos dos cidadãos perante a lei, conhecendo a metamorfose desta, na radical desigualdade perante os cidadãos. E assim vamos, sendo filas de lixo destinados ao lixo, adulando lixo na excelência de espirito de quem não o vê nem reconhece como tal.
Destes e de muitos outros modos se conquistam terras limpas aos espíritos dos homens quebrando a vida e impondo o fim que devora seres e sua alteridade humana.
As supostas elites por se terem como tal, orientam-se bem na absurdidade irresistível a que vão desde cedo aderindo, tudo cortando enfim, em troços idênticos que, por óbvio, não escapam à uniformização, ela mesma disponível no mercado, num otimismo ao qual a paixão lhe não faz frente de há muito.
Insensível este mundo não submete em muitas circunstâncias: faz pior, suprime e nenhuma vítima o apazigua, afinal.
Numa montanha: logo se imaginam os minérios a extrair; num segredo megalítico: um íman para turistas; num animal: sua pele; numa tese: seu eventual estatuto de sapiência, e, todos estes sentires estão reunidos nos campos de concentração de hoje; nos campos de refugiados ou nos mares dos botes que despejam gente à morte, esta de boca ávida e aberta face a tanta constância que lhe é oferecida.
O grande empório da absurdidade roda à escala planetária e a degenerescência do seu senso já não é há muito a espuma da onda que se entrega na areia da praia. O grande empório, na sua excitação, só conhece um ponto onde a cada noite atraca: o inóspito mundo que resta.
E de quem é a culpa? A culpa é nossa.
Mentira e mundo já não logram libertar-se. As termiteiras informáticas reúnem uma cognição sem chama, mas que opera sem falha na destruição de tudo o que não entende.
Pergunta-se: e se doravante insubmisso o espaço literário germinasse de tanta inquietação?
Teresa Bracinha Vieira