TÓSSAN IMPAGÁVEL…
TU CÁ TU LÁ
COM O PATRIMÓNIO
Diário de Agosto * Número 3
O grande António Aleixo imortalizado por Tóssan.
Tóssan (1918-1991) era algarvio – de Vila Real de Santo António. Era António Fernando dos Santos, mas nunca lhe associamos esse nome. Conheci-o no tempo das tertúlias, das caricaturas e dos poemas. Em Albufeira encontrava a sua família e muitos amigos. Não havia antigo estudante de Coimbra que não lhe prestasse o seu genuíno culto. Tóssan era apenas Tóssan – que, com o ar mais sério do mundo, via o mundo sempre a sorrir e em ceroulas. Para ele, o Património cultural era a vida, a ironia, a boa piada, o belo trocadilho… E estou a ouvi-lo. Palavra por palavra – com o júbilo de quantos o ouviam, para quem as lágrimas que vinham aos olhos eram salgadas e doces. Era a alegria de rir a bom rir e a saudade triste, sempre – alimentada por este inesquecível poeta. E era a Briosa que sempre se recordava…
Oiçamo-lo na Ode ao Futebol, nesse exercício supremo de irmos às lágrimas. E quanta distância do tempo em que se dava tudo pela camisola…
“Retângulo verde, meio de sombra meio de sol
Vinte e dois em cuecas jogando futebol
Correndo, saltando, ziguezagueando ao som dum apito
Um homem magrito, também em cuecas
E mais dois carecas com uma bandeira
De cá para lá, de lá para cá
Bola ao centro, bola fora.
Fora o árbitro!
E a multidão, lá do peão
Gritava, berrava, gesticulava
E a bola coitada, rolava no verde
Rolava no pé, de cabeça em cabeça
A bola não perde, um minuto sequer
Zumbindo no ar como um besoiro,
Toda redonda, toda bonita
Vestida de coiro.
O árbitro corre, o árbitro apita
O público grita
Gooooolllllooooo!
Bola nas redes
Laranjadas, pirolitos,
Asneiras, palavrões
Damas frenéticas, gordas esqueléticas
esganiçadas aos gritos.
Todos à uma, todos ao um
Ao árbitro roubam o apito
Entra a guarda, entra a polícia
Os cavalos a correr, os senhores a esconder
Uma cabeça aqui, um pé acolá
Ancas, coxas, pernas, pé,
Cabeças no chão, cabeças de cavalo,
Cavalos sem cabeça, com os pés no ar
Fez-se em montão multidão.
E uma dama excitada, que era casada
Com um marinheiro distraído,
No meio da bancada que estava à cunha,
Tirou-lhe um olho, com a própria unha!
À unha, à unha!
Ânimos ao alto!
E no fim,
perdeu-se o campeonato!”
Agostinho de Morais
A rubrica TU CÁ TU LÁ COM O PATRIMÓNIO foi elaborada no âmbito do
Ano Europeu do Património Cultural, que se celebra pela primeira vez em 2018
#europeforculture