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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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MEDITANDO E PENSANDO PORTUGAL

 

12. O PESSIMISMO NACIONAL EM MANUEL LARANJEIRA (I)

 

O pequeno livro tem um título chamativo - O Pessimismo Nacional (Frenesi, Lisboa, MMIX). O autor, Manuel Laranjeira, é um protótipo do pessimismo instintivo, a que não é alheio o seu suicídio. Ao “deprimir e denegrir a pátria”, como “hábito inato”, tenta-se incutir a toda a sua obra uma desfiguração que se justifica por vezes corrigir. É o caso dos artigos sobre O Pessimismo Nacional[1], comummente não os referindo como o que na realidade são, no geral interpretados como apologia dum pessimismo estruturalmente português.   

 

Esse artifício interpretativo sobressai no interior da contracapa, onde se escreve a impossibilidade atual de subscrever “(…) com iguais ilusões o otimismo generoso de que o seu Autor parecia possuído quando os publicou”, rematando: “Aliás, a morte que Manuel Laranjeira a si próprio deu, pouco depois, não significará que foi ele o primeiro a desesperar? E não chegaria essa antecipação definidora para justificar o nosso presente pessimismo, tão negro e tão magoado como o que o levou, numa hora triste, àquele seu gesto de renúncia final?”  

 

Este desfigurar do texto a partir do seu título, corrobora o culto de um pessimismo doentio, estrutural e permanente, conducente a um fim fatal, que vive, entre nós, nalguma intelectualidade e imprensa, tentando fazê-lo corresponder a um pessimismo ainda maior, que o que advém da análise dum fenómeno epocal em que se defendia a regeneração da vontade coletiva e o suprimento das disfunções e injustiças na nossa sociedade através dum otimismo esperançoso, embora amargo.

 

O pessimismo de Laranjeira não é “(…) a manifestação clara, iniludível, dum esgotamento senil, degenerativo, doloroso, (…) o estado desesperadamente agónico dum povo como entidade coletiva”, uma degeneração “orgânica” do tipo Crepúsculo dos Povos (à Max Nordau), antes sim uma dificuldade adaptativa passageira, de génese normal, antes sim, nas palavras do autor, “(…) uma perturbação de crise evolutiva, significando apenas que os povos se transformam e progridem, embora penosamente” (ibidem, pg.ª 20), não nos vendo como um povo irremediavelmente perdido. 

 

Ao invés do pessimista degenerado, que o é por vício constitucional e defeito estrutural, derivado de insuficiência congénita imodificável, Laranjeira vê o pessimismo nacional como uma deficiência momentânea, a que o português, ou qualquer outro ser humano normal, temporariamente se adapta, sinal de que Portugal tem futuro.

 

Indicia-se a negação da permanência de estruturas de longa duração relacionadas com características comuns e inalteráveis dos portugueses, podendo-se alterar se as condições estruturais de natureza cultural, económica e social se modificarem.

 

E escreve: “Submeta-se esse desgraçado povo, criminosamente desprezado e levianamente caluniado, à prova decisiva: eduquem-no, intensivamente, tenazmente, sem desfalecimento, e vê-lo-ão florescer e progredir como os povos cheios de saúde” (ibidem, pg.ª 37)   

 

Bastará uma retrospetiva da nossa História para refutarmos o pessimismo mórbido de tendência degenerativa e esgotamento agónico, dado que não somos um povo corroído de senescência. Nem basta dizê-lo, é imperioso prová-lo, não se podendo concluir de imediato, em face duma crise, sermos um povo irrefutavelmente perdido. Aceitá-lo seria negar a excelente adaptação dos portugueses a qualquer meio-ambiente e em qualquer tempo e lugar, o seu grande ativo de aptidão para lidar com outras culturas, a nossa longevidade histórica de mais de 800 anos.

 

O que também prova que não há uma psicologia indiscutível dos povos, apesar da História estar a perder impacto sobre as crenças imediatistas do presente além de, nos nossos dias, um pessimismo mais catastrofista ser fomentado fortemente pelos media.  

      

05.02.2019
Joaquim Miguel de Morgado Patrício

 


[1] Saíram pela primeira vez no jornal O Norte, diário republicano da manhã, do Porto, em 24 e 31/12/1907 e 07/01 e 14/01/1908.