TEATROS HISTÓRICOS EM LISBOA: TEATRO DAS FANGAS DA FARINHA
Temos aqui referido o património histórico dos teatros-edifícios construídos e/ou adaptados ao longo do país, em sucessivas fases da História do Espetáculo, e aí cobrindo, desde as realizações iniciais, aos tempos atuais: e sempre tendo em vista a própria realidade do teatro como expressão de um texto que é apresentado ao publico de acordo com os hábitos culturais e as técnicas de cada época.
E de tal forma assim é, que não nos podemos vincular à arquitetura específica e à técnica correspondente de cada expressão de espetáculo cénico.
Por isso aqui temos evocado sucessivos espaços de espetáculo teatral, desde as primeiras manifestações até à geração mais recente, e isto no ponto de vista dos autores, dos arquitetos e do público: pois teatro é espetáculo e sem público – nem que seja um único espetador – não há espetáculo!...
E isto vem a propósito, precisamente, de uma efeméride teatral que neste ano de 2019 completa exatos 5 séculos: a saber, a estreia em 1619 de um espaço teatral, o chamado Pátio das Fangas da Farinha, no que é hoje a Baixa lisboeta.
Vejamos então.
A partir de 1590, o empresário, diríamos hoje, Fernão Dias de la Torre, castelhano de origem e de cultura, organiza em Lisboa o que se pode considerar o primeiro espaço público de espetáculos, o chamado Pátio das Arcas, situado na zona que hoje corresponde mais ou menos à Rua Augusta. Para tal, obtém autorização do Hospital de Todos os Santos. E assim prossegue uma atividade de produção de espetáculos.
Ora o que é mais curioso é que a zona consagra pelo menos desde aí uma vocação, digamos assim, para a realização de espetáculos e de espaços musicais e teatrais. E assim, em 1619, portanto há exatos 400 anos, inicia atividade o chamado Pátio das Fangas da Farinha, próximo do que viria a ser o Tribunal da Boa Hora.
Em 21 de novembro de 1622 o Município de Lisboa emite um documento divulgado por Eduardo Freire de Oliveira em 1888 (in “Elementos para a História do Município de Lisboa”) que citamos na nossa “História do Teatro Português” e que aqui se evoca.
Transcreve então Freire de Oliveira:
“A Relação se meteu em perturbar a jurisdição da cidade, mandando derrubar o Pátio das Fangas da Farinha (...) e ora chegando à nossa notícia que o Pátio da Rua das Arcas estava em notável perigo de arruinar e cair com o peso da gente se ordenou ao vereador do pelouro das obras que com o arquiteto da cidade e mais ministros dela fosse ver a fábrica do dito Pátio da Rua das Arcas e por todos, debaixo de juramento, foi dito que a obra estava fraca e notável risco de vira abaixo com o peso da gente, o que acontecendo, o que Deus não permita, mataria e estropiaria muita gente (...) deem licença a este Senado que mande concertar o das Fangas da Farinha”...!
Quer dizer: já nessa altura os poderes públicos se envolviam em problemas de gestão da infraestrutura de espetáculos!...
DUARTE IVO CRUZ