A LÍNGUA PORTUGUESA NO MUNDO
LII - NÃO AO COMPLEXO DE INFERIORIDADE LINGUÍSTICO (V)
Exemplos mais recentes podem exemplificar esta indiferença ou omissão linguística que tantas vezes implementamos.
Em agosto de 2013, na National Gallery de Dublin, Irlanda, tentaram disponibilizar-me um áudio-expositivo, em castelhano, dada a minha nacionalidade e a ausência em português, com a observação: “Sir, please, but we have spanish!”[1]. Optei pelo inglês, lamentei a omissão, expus as minhas razões, reclamei por escrito, com a anuência e colaboração duma interlocutora irlandesa.
No dia anterior, no início da visita à “Guiness Storehouse”, foi o “espanhol”, uma vez mais, o idioma aconselhado, num opcional roteiro em grupo, por falta de guias em português, o que educadamente (eu e família) recusámos, não deixando de argumentar que a omissão da nossa língua não é suprida pela sugerida, nem dela dependente ou seu dialeto, por muito respeito que nos mereça. Fizemos a visita com a vantagem de nos ter sido dado na bilheteira um mapa informativo do percurso em português. Versões em português existiam ainda na Catedral da Igreja de Cristo (Christ Church Cathedral) e de São Patrício (St Patrick`s Cathedral).
Todavia, em Abril de 2014, em Copenhaga, Dinamarca, nos passeios turísticos de autocarro e barco, as informações eram em dinamarquês, inglês, alemão, castelhano, italiano, polaco, sueco, russo, japonês e chinês. Nunca em português.
Observam-se progressos, como na gala da Fifa, em Zurique, Suiça, em Janeiro de 2014, onde Cristiano Ronaldo falou e agradeceu em português, ao ser tido como o melhor futebolista do mundo de 2013 recebendo, pela segunda vez, a Bola de Ouro (Pelé, ao receber a Bola de Ouro de Honra, pela sua carreira, falou inglês), ao invés de 2008, em Paris, onde se expressou em inglês, ao receber, pela primeira vez, o mesmo troféu. Acrescente-se a abertura em português de um sítio na net pela Fifa e o acesso à biblioteca digital mundial, em sete línguas (árabe, chinês, inglês, francês, castelhano, russo e português), usando o critério do número global de falantes à escala planetária. Para quando esclarecimentos e legendas em português em CD e DVD de música clássica e ópera?
Merece referência o testemunho de Carlos do Carmo quando recebeu um Grammy Latino de Carreira, em 19.11.2014, em Las Vegas, onde decidiu falar em português, após observar algo que era embaraçoso para ele: todos falavam em espanhol. E acrescenta: “Fiquei até dececionado com um artista que admiro muito, o Ney Matogrosso, que de repente pega num papel, começa a ler e… fala em espanhol. Porquê, se ele vem de um país onde 200 milhões de pessoas falam português? O português é uma das quatro ou cinco línguas mais faladas no mundo, porque é que vou estar aqui encolhido a falar uma língua que não é minha, mesmo que a consiga dominar?”.
Progressos pontuais que não justificam o conformismo e indiferença de muitos portugueses e outros lusófonos, sejam emigrantes ou turistas, menos ainda quando no nosso próprio país.
16.07.2019
Joaquim Miguel de Morgado Patrício
[1] “Senhor, por favor, mas temos em espanhol!”.