CRÓNICAS PLURICULTURAIS
47. DO UTILITARISMO À JUSTIÇA DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS
Para Jeremy Bentham, há um princípio moral essencial: o da utilidade.
Sempre que haja a possibilidade de escolha entre ações ou políticas sociais alternativas, há que escolher aquela que, no seu todo, se apresente mais satisfatória para todos os interessados.
John Stuart Mill, discípulo de Bentham, expôs as suas ideias no livro Utilitarismo, em que defende que ao decidir o que fazer, devemos perguntar qual o curso da ação que irá promover a maior felicidade para todos os que serão afetados pelos nossos atos.
Para os utilitaristas o bem é o que trouxer maior felicidade global.
A boa ação é que tiver maior exequibilidade de trazer a maior felicidade nas circunstâncias em causa.
Uma objeção feita ao utilitarismo é que pode justificar muitas ações que, usualmente, são tidas imorais. Exemplificando: se pudesse provar-se que enforcar publicamente um inocente teria o efeito benéfico e imediato de reduzir os crimes violentos, por atuar como um fator de dissuasão, causando assim, no cálculo geral, mais prazer que dor, um utilitarista seria obrigado a aceitar que enforcar um inocente é a atitude moralmente mais correta a tomar.
Generalizando, o princípio da utilidade ou utilitarista implica a maximização do bem-estar de todos os envolvidos, tendo também em conta os recursos disponíveis.
As medidas a tomar devem ser as que geram maior utilidade, maior bem-estar agregado, incluindo aqui, por exemplo, o doente em causa, outros doentes no mesmo contexto e com as mesmas necessidades, e a sociedade em geral.
Defende-se um economicismo, poupança ou contenção dos custos que tem de ter lugar em função da maximização do bem-estar geral.
Tem de ser medido pela utilidade máxima geradora para a sociedade no seu todo, pouco ou nada relevando o direito das pessoas, das minorias, marginalizados ou mais vulneráveis, desde que o conjunto beneficie maioritariamente com o sacrifício delas ou de alguns.
A natureza ou eficácia deste princípio decorre de produzir ou não resultados positivos, tendo como admissíveis todos os meios para atingir os fins.
Em oposição, temos o princípio da justiça ligada à defesa e promoção dos direitos humanos.
Sendo a pessoa, todo o ser humano, um fim em si mesmo, é inadmissível sacrificar direitos humanos de uma pessoa para salvar um maior número de outras pessoas.
Contra o consequencialismo utilitarista, adota-se uma conceção deontológica, assegurando uma justiça unida à defesa e promoção dos direitos humanos, enumerando determinadas coisas que podem ser sempre feitas, ou que nunca podem ou devem ser feitas ainda que isso levasse a um maior bem-estar da sociedade em geral.
As restrições serão sempre ditadas pelos direitos humanos.
A racionalização dos custos não pode ser feita em função do bem-estar geral, mas no sentido de proteger, do melhor modo possível, por exemplo, o direito à saúde dos doentes, ou doente, em causa.
Aqui o padrão ético e moral é mais elevado, estando indisponível para cortes cegos ou negociações, disponibilizando-se apenas para adaptações e tão só como último recurso, ao invés do utilitarismo que se adapta imediatamente em função da maior ou menor pressão dos recursos disponíveis.
O pior e mais condenável é várias dimensões humanas entrarem em choque e conflito, desde logo a ética e a ciência, porque esta também tem limites, não tendo respostas para tudo.
Esta introdução teórica questiona-nos sobre os critérios de preferência a adotar, na prática, em termos de sobrevivência da espécie humana, nos tempos que agora vivemos, face à pandemia do coronavírus (do COVID 19) para a humanidade, que iremos abordar.
17.04.2020
Joaquim Miguel de Morgado Patrício