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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

COMO VOLTAR À TONA DE ÁGUA…

 

A retoma da economia depois da pandemia do covid-19 vai demorar. E vai ocorrer gradualmente, consoante as atividades económicas e os países. A prevenção contra a pandemia vai ter de continuar, até porque vai haver grandes assimetrias na superação da doença. A livre circulação das pessoas será afetada e o tema fundamental vai ser o do combate ao desemprego e o da criação de valor. Começando pelas lições de 2008, importa recusar a ilusão monetária e financeira. O endividamento e o mero aumento da circulação monetária não criam riqueza. Temos de lembrar a regra de ouro das Finanças Públicas – só pode haver dívida pública para financiar despesa de investimento reprodutiva. Não basta lançar dinheiro sobre os problemas. E se aumentam as desigualdades, importa garantir a justiça distributiva – horizontal, com salários e impostos justos que garantam uma partilha de riqueza e a criação de valor; e a vertical, pela equidade intergeracional, reduzindo o endividamento.

 

Depois da crise, a prioridade terá de estar nas políticas de emprego, orientadas para a satisfação das necessidades fundamentais, o combate ao desperdício, a promoção de poupanças virtuosas e a melhoria da qualidade de vida, para que o desenvolvimento se oriente para as pessoas. Mas o tema do emprego obriga a repensar o tempo de trabalho. A situação atual de confinamento e de teletrabalho, e a política gradual de retoma, ensinam-nos que os horários de trabalho presencial terão de ser repensados. O grave problema demográfico dos países ricos obriga a criar políticas de conciliação familiar com horários flexíveis. As licenças de paternidade para marido e mulher e os horários flexíveis para os pais tem permitido melhorar as taxas de natalidade nos países nórdicos, sem esquecer o cuidado dos mais velhos.

 

Terão de ser considerados, assim, “bancos de tempo” com flexibilidade, em vez de uma lógica de horários rígidos. Isto, para conciliar as necessidades, a disponibilidade individual e o melhor aproveitamento das capacidades disponíveis. Os “bancos do tempo” permitirão acorrer a uma multiplicidade de tarefas sociais que têm de ser asseguradas por todos. Não devemos esquecer que a inovação vai obrigar à ligação das políticas do Estado, do mercado e das iniciativas privada, social e pública não estatal. Por iniciativa pública não estatal entendemos a das instituições sociais, culturais, académicas e científicas de utilidade pública ou natureza cooperativa. As políticas públicas têm de ser consideradas como catalisadores económicos e sociais. A inovação científica obriga a que a lógica do lucro não impeça a difusão do conhecimento. A criação de valor dependerá da articulação do Estado e da sociedade. A lógica Silicon Valley tem de ser completada com planeamento estratégico global e com redes coordenadas de informação e conhecimento.

 

Mas não haverá inovação sem aprendizagem. Daí uma atenção necessária à educação e à formação ao longo da vida. Uma parte dos “bancos do tempo” tem de ser ocupada com formação contínua relevante, afinada individualmente. Por outro lado, o ensino profissional terá de articular os níveis secundário e superior, com atenção à cooperação entre Universidades e Politécnicos. Não deve haver becos sem saída, nem canais rígidos e não comunicáveis entre si. Prosseguimento de estudos, vida ativa, mobilidade e cooperação internacional (Erasmus) têm de se articular.

 

Numa palavra, a prioridade é a promoção de valor e de um desenvolvimento justo e sustentável. O “doce comércio” de Montesquieu tem de se completar pela subsidiariedade. Urge tornar a informação conhecimento, e o conhecimento sabedoria. Para contrariar os egoísmos, temos de favorecer a solidariedade e o cuidado. Com instituições mediadoras, participadas e representativas, atentas a uma justiça complexa e equitativa, que favoreça a coesão e a sustentabilidade, é a democracia das pessoas, pelas pessoas e para as pessoas que está em causa. 

 

Guilherme d'Oliveira Martins
in Jornal Expresso | 18 de abril de 2020

ATORES E ESPAÇOS TEATRAIS NO SÉCULO XVII EM LISBOA

 

Em publicações e evocações diversas, temos referido um documento do Município de Lisboa, datado de 21 de novembro de 1622, que relata a situação e atividade dos edifícios, pátios e espaços teatrais diversos na cidade.

 

 A relevância decorre efetivamente de dois aspetos determinantes: de um lado, a intervenção direta da autoridade municipal no que respeita à regulamentação da atividade de produção de espetáculos teatrais, em si mesmo considerada, e tendo em conta as implicações sociais e pessoais que a mesma envolve; e simultaneamente, a própria regulamentação da atividade laboral e artística dos comediantes envolvidos.

 

E tenha-se presente que a situação portuguesa, no contexto da época, era afetada pela dominação filipina então em curso (estamos, repita-se, em 1622) o que no ponto de vista cultural envolvia óbvias ambiguidades; designadamente pela preponderância crescente da intervenção castelhana - e estamos a 18 anos da Restauração, com todas as implicações políticas e culturais inerentes.

 

E importa ainda recordar que na época o espetáculo teatral fazia-se em espaços muito variados, designadamente em Lisboa, onde a coexistência de Teatro-edifícios com a tradição histórica dos Pátios ainda dominava a produção teatral. De tal forma que se definiu uma tradição de continuidade desses espaços de espetáculo, desde os Pátios aos Teatros.

 

Ora em 1888, Eduardo Freire de Oliveira divulgou um documento do Município de Lisboa, datado de 21 de novembro de 1622, que procede à regulamentação da atividade de espetáculo. 

 

Trata-se de um vastíssimo documento, que aqui em parte transcrevemos, procedendo à devida atualização ortográfica.

 

Diz então o documento:

 

“(...) Deem despacho aos comediantes, para que  representem no pátio em que agora o fazem, enquanto não houver outro concertado, capaz de se poder representar nele,  ao que se satisfaz com dizer de palavra ao autor que fosse continuando a representar aonde o fazia, até se lhe ordenar cousa: porém, pareceu significar (...) o grande dano que resulta do pejamento da rua das Arcas donde estão oficiais arruados e não podem trabalhar em seus ofícios nem vender e dar expediente às suas obras o dia que ali se representa de mais de estar a rua impedida, que com dificuldade pode uma pessoa passar a cavalos por elas além das brigas que por estes respeitos são causadas”...

 

E cita então o Pátio das Fangas da Farinha e o Pátio da Rua das Arcas como dois espaços determinantes da atividade cénica na época.

 

 

E acrescente-se que em 1771 sendo Presidente do Senado de Lisboa o Conde de Oeiras, filho do Marquês de Pombal, é criado por Decreto de 30 de maio daquele ano uma chamada Sociedade para a Subsistência dos Teatros Públicos da Corte, a qual antecedeu em séculos as infindáveis entidades públicas de apoio à atividade de teatros, numa “tradição” que dura até hoje!...

 

 

 

 

 

 

DUARTE IVO CRUZ