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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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ALDIR BLANC: ATÉ SEMPRE!

 

A noite de 26 de abril foi a mais dolorosa desde o seu internamento com Covid 19.

 

E assim foi chegando o seu momento do tempo final do mundo. Que enfim, receba este nosso adeus, num até sempre!

 

Aldir, compositor, escritor, formado em Medicina, consagrou-se como “ourives do palavreado” por Dorival Caymmi. É também um dos compositores mais gravados por Elis Regina.

 

Em 2006 publicou o livro "Rua dos Artistas e transversais" pela chancela da Agir. Neste livro reuniram-se todas as suas inúmeras crónicas.

 

Aldir Blanc foi um homem à frente do seu tempo, corajoso, tudo denunciando, procurando ater-se ao significado da linguagem das ruas. Nunca viveu à sombra do medo de colocar o dedo nas feridas, mesmo sob condições muito adversas. Agora com as novas ameaças à democracia no país de Aldir Blanc, quando ele fez 70 anos disse, numa entrevista:

 

Eu vivo de adiantamentos, empréstimos e tal. Mas há muito canalha com casa em Búzios construída com os meus direitos de autor."

 

E noutra altura:

 

Quando uma escola de samba vence subvencionada pela mais antiga ditadura africana, o esquema todo está podre. Pode ser que a rua ajude, mas desconfio que não será fácil porque, como se viu recentemente em política, tudo é manipulado.

 

Amante do jazz, os seus favoritos, Duke Ellington, Coltrane e Mingus, nunca serão esquecidos nas horas de compor. Autor de tantos clássicos como “Mestre-sala dos Mares” ou “O Bêbado e o Equilibrista” Aldir está para sempre entre nós!

 

Aldir Blanc, verdadeiro património brasileiro, aos 73 anos, tem vivido num profundo e sabido desconforto material. Aldir, sempre tão lúcido, lembremos que o lema dele tem sido "colocar no mesmo barco realidade e poesia, rindo da própria agonia".

 

Lê-se que os seus amigos e familiares “fizeram uma vaquinha” para o ajudar nestes tempos de doença a fim de poder ser transferido para um outro hospital mais preparado para Covid 19. Solicitavam qualquer doação de qualquer quantia que junta a outra o pudessem ajudar.

 

Ouvi na TSF que há tempos, ele teria sublinhado deste modo, o facto de ter feito medicina e de se ter especializado em psiquiatria:

 

"Eu talvez tenha feito boa psiquiatria na época porque eu era, antes, músico, percussionista e letrista".

 

E se não como explicar a letra “Resposta ao Tempo” de Aldir Blanc?

 

"Resposta ao Tempo"

Batidas na porta da frente
É o tempo
Eu bebo um pouquinho pra ter
Argumento
Mas fico sem jeito, calado
Ele ri
Ele zomba do quanto eu chorei
Porque sabe passar

E eu não sei

Num dia azul de verão sinto vento
Há folhas no meu coração é o tempo
Recordo um amor que eu perdi
Ele ri
Diz que somos iguais
Se eu notei
Pois não sabe ficar
E eu também não sei

E gira em volta de mim
Sussurra que apaga os caminhos
Que amores terminam no escuro
Sozinhos

Respondo que ele aprisiona
Eu liberto
Que ele adormece as paixões
E eu desperto
E o tempo se rói com inveja
De mim
Me vigia querendo aprender
Como eu morro de amor
Pra tentar reviver

No fundo é uma eterna criança
Que não soube amadurecer
Eu posso, ele não vai poder
Me esquecer

 

“Resposta ao tempo”, um clássico, nunca não parou de atrair grandes vozes, como Milton NascimentoLeila PinheiroSimone e Fafá de Belém.

 

E eis um mundo que muitos conhecem:

Um mundo mesmo

 

Cristovão Bastos / Chico Buarque / Paulo César Pinheiro /
Paulinho da Viola / Abel Silva / Elton Medeiros

 

Edu Lobo ou Paulinho da Viola atrevo-me a dizer, que todos em força de espírito pediriam aos deuses que o apelo fosse até à sua cama de hospital e a canção fosse

Me Dá A Penúltima

Eu gosto quando alvorece
Porque parece que está anoitecendo
E gost quando anoitece,que só vendo
Porque penso que alvorece
E então parece que eu pude
Mais uma vez,outra noite,
Reviver a juventude (…)

 

 

Aldir, que contigo também aprendi o quanto sempre estive atraída por um ponto distante, íman à Bossa Nova também no Canecão.

Teresa Bracinha Vieira