CRÓNICAS PLURICULTURAIS
60. NADA DE NOVO DEBAIXO DO SOL?
“Os ribeiros vão para o mar; e contudo o mar não se enche.
Não há nada de novo debaixo do Sol.
Não há lembranças das coisas primitivas.
Aborreci todo o meu trabalho que trabalhei debaixo do Sol, visto que eu havia de deixá-lo ao homem que viesse depois de mim.”
Neste excerto do Eclesiastes sobressai uma visão pessimista, em que nada perdura, embora o futuro e o presente não sejam diferentes do passado. Os ribeiros e os rios correm sempre para o mar, mas as suas águas não enchem o oceano, não ficam lá, num interminável movimento cíclico de nascimento, vida e morte, em que todas as coisas nascem e morrem numa permanente e sucessiva repetição, sem um resultado aperfeiçoado e estável, dia, mês e ano após ano.
Este estado de alma ou de espírito descrente de que haja algo de novo e de interesse neste mundo, faz lembrar pessoas que geralmente não têm problemas a não ser aqueles que elas mesmas criam, que se têm como superiores por compreenderem a futilidade da vida, tantas vezes por satisfazerem os seus desejos sem esforço.
Daí, ao que parece, não haja nada de novo debaixo do sol.
Tem-se como um entendimento simplista das coisas, usando uma quantidade limitada de elementos que constituem o modelo-padrão da natureza e da vivência humana, não tendo presente que a perfeição e a sabedoria plena não são o destino do universo.
Não podemos ter o preconceito ou a presunção inilidível de que já somos portadores da compreensão de toda a história e só precisamos de confirmar a nossa teoria, a nossa experiência ou estados de alma.
Como é que, há tantos e após tantos séculos, se pode afirmar que “Não há nada de novo debaixo do Sol”?
Que sabia e sabe quem o diz sobre os avanços atuais na conquista do espaço, aviões, meios de comunicação social, rádio, televisão, informática, eletrónica, robótica, o bosão de Higgs, o vácuo, os drones, a inteligência artificial e outras portentosas invenções da humanidade?
Não há nada de novo ou há coisas a mais debaixo do sol?
Como reagir à sua ausência e presença?
Com desespero e pessimismo?
Hoje, apesar do progresso, 95% do universo é desconhecido, segundo os especialistas. Ainda não compreendemos, por exemplo, a energia e a matéria escura.
O que nos dá a medida da nossa ignorância.
Se assim é, ainda há muito por descobrir debaixo do sol, numa maravilhosa aventura de imperfeição e querer ir sempre mais além, sabendo que nunca saberemos tudo.
09.10.2020
Joaquim Miguel de Morgado Patrício