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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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175 ANOS DE RENOVAÇÃO DOS TEATROS EM LISBOA

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A cronologia envolve uma referenciação de períodos e datas em si mesmas assinaláveis na perspetiva histórica.

Teremos, pois, presente que este ano de 2021 justifica a referência aos exatos 175 anos de inauguração de dois teatros em Lisboa - o Teatro Nacional D. Maria II, inaugurado em 13 de abril de 1846 com um drama esquecido, “O Magriço ou os Doze de Inglaterra” de um autor também esquecido, Jacinto de Aguiar Loureiro; e também, no mesmo ano, o então denominado Theatro do Gymnásio, este tendo herdado o nome de uma “companhia de cavalinhos”, como então se dizia.

Já temos obviamente aqui referido sobretudo o Teatro Nacional D. Maria II, mas também já aqui assinalamos a tradição memorial do Teatro do Ginásio, sendo certo que o D. Maria II sobreviveu, e o Ginásio como tal desapareceu.

Do Teatro Nacional D. Maria II temos largamente feito referências. Mas vale a pena agora novamente evocar o velho Teatro do Ginásio, que há anos aqui também referimos na perspetiva da sua muitíssimo menor projeção histórica e arquitetónica.

Com efeito, não se podem comparar e, no entanto, registam-se sucessivos Theatro(s) do Gymnasio ou pelo menos, iniciativas de espetáculo sobretudo circense a partir da tradição dispersa de espetáculos chamados à época “de cavalinhos” pelo recurso a intervenções diversas. E nesse aspeto, novamente referimos que em 1846 o Theatro do Gymnasio abre portas ao público, a partir de uma chamada “companhia de cavalinhos” no então designado “Novo Gymnsasio Lisbonense”, assim mesmo, não obstante o insólito da designação!

Já aqui recordámos as opiniões de Júlio César Machado que à época referiu o Ginásio como “um Teatrinho de cartas”. Outro interesse terá, entretanto, a descrição vasta e entusiasta que faz Sousa Bastos no “Diccionario do Theatro Portuguez” (ed. 1908) onde dedica ao “Theatro do Gymnasio” um dos maiores artigos da vastíssima referência a “Theatros e Outras casas de Espetáculos Antigas e Modernas”.

Trata-se efetivamente de um vasto texto de cerca de 4 páginas numa edição que aos teatros-edifícios dedica 98 páginas, num total de 380!

Sousa Bastos cita ainda um Theatro do Gymnasio Vilafranquense (de Vila Franca de Xira), inaugurado em 1907 “por um grupo de artistas do Theatro do Gymnasio de Lisboa de que faziam parte Bárbara Cardoso, Palmyra Torres, Telmo, Julianna Santos e outros, que representaram a comédia “O Papalegoas”, assim mesmo!

Para este Teatro Ginásio Vilafranquense temos 15 linhas, correspondendo a menos de metade de uma das duas colunas da edição, e para o Teatro do Ginásio de Lisboa temos 7 colunas e uma fotografia...

E mais: Sousa Bastos cita ainda um Novo Gymnasio Lisbonense que descreve como “um barracão de madeira que em 1853 existiu no Largo do Poço do Borratem, no local onde depois existia uma estância de madeira. Aos espetáculos compunham-se de bailados, quadros vivos, etc. O preço da superior e galerias era de 160 reis e a geral 120 reis. O Novo Gymnasio Lisbonense pouco durou”...

Finalmente, como já escrevemos, José Manuel Fernandes, no livro “Cinemas de Portugal” (ed. INAPA 1996), destaca “uma fantástica maquinaria que permitiria à plateia dividida em sucessivas placas (de betão?), móveis e transversais, rodar sobre si mesma e inverter as cadeiras fixas para se transformar em lisa sala de baile!”

Assim mesmo!

DUARTE IVO CRUZ

 

CRÓNICAS PLURICULTURAIS

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69. A DUPLA FACE DE JANO

Segundo a lenda, Saturno teria dado a Jano o dom da dupla ciência, a do passado e a do futuro, representando-o os romanos com duas faces voltadas em sentido contrário.

Jano tornou-se o deus do início de todas as coisas, entre elas o início do ano, o 1.º de janeiro, “a porta que abre o ano”.

Responsável pela abertura das portas ao ano que se iniciava, era o guardião das portas, tendo presente que toda a porta olha para dois lados, com duas faces, uma contendo o ano velho que findou e outra o ano novo com os seus mistérios e segredos futuros.

Jano mostra-nos que tudo tem duas faces, que tudo tem em si princípio e fim, daí ser representado por duas faces contrapostas e opostas: uma envelhecida (passado) e outra jovem (futuro).

Há sempre o ano velho e o novo, no sentido de que tudo tem, pelo menos, duas faces, nada sendo imutável e permanente.

Mas nem tudo é a preto e branco, bom e mau, numa dualidade constante, com referência a uma pretensa analogia com as duas faces do ser humano.

Jano também simbolizava o deus das metamorfoses, das transformações, da mudança, da sabedoria, podendo ser representado com uma face masculina e feminina, ou outras dualidades, como guerra e paz, sol e lua.

Para Ovídio a face dupla de Jano exercia o seu poder sobre a terra e sobre os céus.

E de deus que presidia aos começos, do início de todas as coisas, como o início do ano (januarius significa janeiro), tornou-se no deus das quatro estações possuindo, então, quatro cabeças, em vez de duas.

Para os romanos, o primeiro mês do ano era dedicado a Jano, celebrando-se as januárias, no início de janeiro, em sua honra, por analogia com as atuais celebrações de ano novo, num renascer permanente ano a ano, querendo descartar o passado (ano velho) e viver o futuro (ano novo), numa afirmação e formulação anual de rituais, balanços, expetativas e desejos que no essencial se repetem e que marcam a natureza transitória da nossa passagem no mundo que conhecemos.

No final e início do ano há sempre promessas e juras de metamorfoses em que acreditamos ou teatralizamos acreditar.

Há o passado (ano velho) e o futuro (ano novo) que, para Santo Agostinho, são figuras de linguagem de um tempo que já foi ou que virá a ser, mas que não é, em que a realidade existe apenas no presente, que é o tempo em movimento.

Um melhor e mais auspicioso 2021.

 

01.01.2021
Joaquim Miguel de Morgado Patrício

 

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