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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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A FORÇA DO ATO CRIADOR

 

Eric Rohmer: Objetividade, Espaço, Verdade e Beleza, e Unidade.


No livro Eric Rohmer de Carlos F. Heredero e Antonio Santamarina (1991) lê-se que o cinema de Rohmer se descreve se acordo com quatro fatores fundamentais: ObjetividadeEspaçoVerdade e Beleza e Unidade.


Para Rohmer, através do cinema, é possível a objetividade de espaço e de tempo. O cinema deve ser mais objetivo que o olho – o filme deve estar ao inteiro serviço de um lugar, de modo a apresentá-lo, a mostrá-lo e a valorizá-lo a partir de diversos fragmentos. A coisa filmada é de maior importância, a interpretação deve ser posta de parte. Os filmes devem ajudar a ver o mundo banal como nunca antes visto. O cinema deve ser, por isso, a imagem do mundo exterior. Deve reproduzir a realidade em imagens e tentar ir mais além, mostrando o invisível através do visível.


O espaço fílmico, para Rohmer, é um espaço-tempo virtual que se reconstitui, no espírito do espectador, através da ajuda de fragmentos, que aparecem no filme. O realizador é um organizador de espaço, e o filme é a materialização, através de imagens, de um modo de ver o mundo.


Eric Rohmer deseja reproduzir exatamente a realidade e captar imagens que melhor nos conduzam a descobrir a verdade e a revelar a beleza do mundo.  O cinema, para Rohmer, é uma reprodução exata das coisas, com as suas cores, filmado à altura do olho humano e sem mediadores – porque a poesia, a ordem cósmica e a presença divina surgem ao respeitar-se escrupulosamente a realidade.


Rohmer procura sempre uma unidade de estilo em contraposição a uma qualquer amálgama de imagens e de cores. A unidade permite colar todas as peças do filme e da história. Apesar da aparente naturalidade, todos os filmes são construídos minuciosamente, revelando um controlo formal muito detalhado.


Os filmes de Rohmer são um meio para aceder à verdade e à beleza do mundo, são um instrumento de revelação de um todo que, de outra forma, nos poderia escapar. Permitem que sejamos de novo sensíveis ao esplendor da realidade quotidiana (todo o espaço físico que nos rodeia fica de novo acessível). Nos seus filmes, Rohmer preocupa-se com quatro formas de ocupar o espaço: a grande cidade (Paris), os subúrbios (Villes Nouvelles), a pequena cidade (na província) e o campo (e o mundo rural). Os seus filmes têm a capacidade de transcender o contraste paradigmático entre a cidade e o campo – são uma reflexão importante e necessária acerca da coexistência e da interligação, que deve ser permanente, entre o mundo urbano e o mundo rural. São a prova viva da existência de um território poroso e em movimento constante.


Nos filmes de Rohmer, o espaço urbano é o espaço que, por excelência, através do seu movimento incessante, permite o encontro entre pessoas e é até uma força exterior capaz de mudar uma vida. O subúrbio representa a promessa de uma vida nova. O fácil acesso à natureza permite o contacto com o cosmos e com fenómenos maravilhosos, tal como o raio verde e a hora azul.


«I think I prefer the country, but I like to live in the city!», Rohmer (Baecque e Herpe 2014, 380)

 

Ana Ruepp