A LÍNGUA PORTUGUESA NO MUNDO
LXXVII - UMA SÍNTESE EVOLUTIVA (X)
Quanto a críticas, ficou patente que uma das maiores que se nos oferece fazer à lusofonia e à CPLP é o culto de subalternização, tantas vezes difundido, voluntária ou inconscientemente, pelos próprios lusófonos, como que inerente a uma inevitabilidade e vergonha associadas ao seu pretenso estatuto secundário a nível mundial. Em tal contexto, a subalternação a que tem sido votada a língua portuguesa é um bom exemplo, pela negativa, sem fundamento e a necessitar de ser ultrapassado.
Além da inoperacionalidade prática do desativado e até hoje gorado IILP, dos problemas infindáveis para a consensualização de um acordo ortográfico, aludiram-se outros exemplos, alguns da responsabilidade de cada um de nós, como uma espécie de fatalidade, crítica ou indiferença resignada a que tantos portugueses e outros lusófonos se agarram, a que não é alheia uma autoflagelação, miserabilismo e pessimismo de que se faz eco, entre nós, uma certa filosofia e imprensa portuguesa onde, no essencial, se faz o culto de tudo o que nos inferioriza, com um especial gosto de nos fazer sobressair no que há de pior na Europa ou a nível mundial, sem direito a sabermos o que temos de bom ou melhor. Isso prova, quanto a nós, portugueses, que não é só o “ferrete” dos antigos emigrantes analfabetos, incultos e pobres que deu causa à referida inferiorização, a começar pela língua.
Há que erradicar este culto doentio e obsessivo de um discurso catastrofista, interessado em só nos diminuir, apetecendo concluir, a ser assim, que a termos tanto queixume, por maioria de razão o devem ter quase a totalidade dos outros, porque excluídos das sociedades 15% mais ricas do mundo, onde nos incluímos.
Há que combater uma certa visão “egocêntrica negativa” de quem se acha pobre por se comparar com os mais ricos, de um povo que regressou ao ponto de partida após longas viagens, acabado o império e superada a depressão.
Com o fim do império e integração na UE, cabe também contrariar essa natureza pessimista de um certo caráter nacional, começando pelo língua e lusofonia, a enriquecer e crioulizar com novos termos e vocábulos, onde na música e artes plásticas em geral tal presença já é notória entre nós: Sara Tavares, Mariza, os Da Wiesel, Lura, Terrakota, Kalaf, Roberto Chichorro, Kiki Lima, entre outros. Quanto à literatura indicia-se ser o romance que mais se tem destacado na literatura lusófona. Sobretudo de África, em que o espaço português tem funcionado como principal mercado, onde autores como Pepetela, Mia Couto, Germano Almeida, Agualusa e Ondjaki mantêm ligações e consequente consagração, enriquecimento e “dependência”, possibilitando uma relação de proximidade e de pertença lusófona. À semelhança do que acontece em antigas potências coloniais como a Inglaterra, França, Holanda e Espanha.
Sinal evolutivo de que as arte e cultura atual dos países ex-colonizadores têm cada vez mais como protagonistas nomes oriundos das ex-colónias.
12.03.2021
Joaquim Miguel de Morgado Patrício