CRÓNICAS PLURICULTURAIS
73. LARRY FLYNT E A LIBERDADE DE EXPRESSÃO
“Não estou a ver se os convenço a gostar do que Larry Flynt faz. Eu não gosto do que ele faz. Mas do que eu gosto é de viver num país onde podemos ser nós a tomar essa decisão. Gosto de pegar na Hustler e lê-la, ou deitá-la no lixo, se quiser. Ou de exercer a minha opinião e não a comprar. Gosto desse direito. Os senhores também devem gostar. A sério.
Vivemos num país livre. Esquecemos o que isso significa, por isso escutem de novo: vivemos num país livre. Mas essa liberdade tem um preço. Temos de tolerar coisas de que não gostamos. Se erguemos muros contra o que alguns pensam ser obsceno, pedem surgir muros em lugares onde nunca esperámos. E isso não é liberdade”.
São palavras do advogado de defesa de Larry Flyn (LF), em tribunal, no filme de Milos Forman, sobre o processo judicial que na década de 80 do século anterior o opôs ao evangelista Jerry Falwell.
LF foi um polémico self made man norte americano, que ousou desafiar o sistema como magnata e dono do império de revistas humoristas, satíricas e pornográficas Hustler, atacado por conservadores e progressistas, que lutou arduamente pela liberdade de expressão, tendo o Supremo Tribunal de Justiça decidido que poder expressar o que se pensa é um aspeto da liberdade, essencial para a busca da verdade, protegido pela Primeira Emenda, mesmo que em apreciação assuntos públicos lamentáveis.
“Eu só sou culpado de ter mau gosto.
Este país também é meu. Não é obrigado a ler a Hustler.
O que é mais obsceno?
O sexo ou a guerra?
A guerra!
A verdadeira obscenidade é educar os jovens fazendo-lhes crer que o sexo é mau e sujo, e que é heroico derramar sangue em nome da humanidade”.
Afirmações atribuídas a LF, que admite que o podem culpar de mau gosto, não de crime ou ilegalidade, e sendo supérfluo o questionamento sobre gostos, também o é se uma pessoa razoável, tida como normal, não acreditar que o que foi dito, escrito ou publicado não corresponde à verdade, porque uma caricatura ou paródia humorística, satírica ou sarcástica, criticando, escarnecendo ou ridicularizando.
Para dizer bem, não se justifica a liberdade de expressão, uma vez que, quando assim é, não somos contrariados, colocados em ridículo, incomodados ou perseguidos, o que é agudizado pelo facto de tal direito se justificar quando gerador de discussão e do exercício do contraditório, tendo como limites a ausência de verdade e afirmações dolosas ou maledicentes.
A liberdade de expressão, nas sociedades democrática, é um valor estruturante, a que acresce o seu valor pessoal, como garantia e forma do desenvolvimento da personalidade de cada pessoa.
Para a sua aceitação contribuiu LF, falecido este ano, com um caso tido, à data, por escandaloso e ultrapassando todos os limites.
07.05.2012
Joaquim Miguel de Morgado Patrício