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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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NOVA EVOCAÇÃO/TRANSCRIÇÃO DE HERCULANO

 

A cronologia mais justifica esta alternância, que aqui temos exercido, entre textos atuais e evocações históricas. E hoje, precisamente, faremos eco tardio mas atual de uma referência histórica, a saber, a realização de uma auto levado à cena em 1401 no Mosteiro da Batalha para de certo modo assinalar a sagração respetiva.

E nesse contexto, novamente transcreveremos a descrição do espetáculo, evocado por Alexandre Herculano nas “Lendas e Narrativas” e que aqui se cita.

O que se segue é pois a transcrição do texto de Herculano:

“Pela mesma porta da sacristia saíram logo as primeiras figuras do auto, as quais, descendo ao longo da nave, subiram ao cadafalso (…) Estas primeiras figuras eram seis, formando uma espécie de prólogo ao auto. (…) Feitas as vénias a El-Rei, a Idolatria começou o seu arrazoado contra a Fé, queixando-se de que ela a pretendia esbulhar da antiga posse em que estava de receber cultos de todo o género humano, a o que a Fé acudia com dizer que estava apontado o dia em que o império dos ídolos devia acabar e que elas Fé não era culpada de ter chegado tão azinha esse dia.

Então o Diabo vinha, lamentando-se de que a esperança começasse a entrar no coração dos homens, que ele Diabo tinha juz antiquíssimo de desesperar toda a gente; que se dava ao demo por ver as perrarias que a Esperança lhe fazia; e, com isto, careteava com tais momos e trejeitos, que o povo ria a rebentar o mais devotamente que era possível”…

E a seguir transcrevo a fala que Baltazar Dias declama perante o Presépio:

“Santo filho de /Divinal/Salvador de triste raça /Humana,/ que desceste lá do assento/Celestial/ Vós da glória imperador/ Eternal/ Aceita este ofertório/ Não real/ Si. É quanto posso:/ Não há al”…

E transcrevo ainda um comentário do próprio Herculano, publicado em 1837 e posteriormente recolhido nos “Opúsculos”.

Aí escreve:

“Em Portugal é provável começassem as representações cénicas pelo mesmo tampo em que principiaram na Espanha: mas nenhum vestígio restam desse teatro primitivo”…

Assim mesmo!

E acrescente-se que Alexandre Herculano situou a partir de Garrett a renovação do teatro português, que ele próprio não praticou como dramaturgo mas fê-lo como analista. Interessa pois recordar aspetos da análise que Herculano faz do próprio historial da renovação do teatro em Portugal.

Remeto pois, a propósito, para referências a escritos hoje históricos de Herculano sobre o teatro em Portugal. E vem então a propósito recordar a visão histórica que Herculano aplicava também ao teatro.

Luis Francisco Rebello cita-o com frequência na “Breve História do Teatro Português” remetendo ações de renovação sobretudo a partir de Garrett mas não só: e isto, numa perspetiva que não deixava esquecer a própria renovação historial.

E tanto como dramaturgo como historiador.

Vale pois a pena recordar designadamente o que Rebello escreveu sobre a abordagem global da renovação do teatro: “Herculano, num artigo publicado em 1835 no Repositório Literário em que se fazia eco das teorias do romantismo, exortava os autores portugueses a (e cita) “aproveitarem os nossos tempos históricos mais belos que os dos antigos”, assim mesmo.

E cita Herculano como romancista, mas destacando designadamente alguns títulos de teatro com destaque para “O Fronteiro de Africa” e “Os Infantes de Ceuta” que classifica como “drama lírico”.

E é de assinalar ainda que Rebello cita amplamente Alexandre Herculano como dramaturgo sem dúvida mas ainda como autor de “avisado conselho” (e em diversas intervenções) na analise histórica do teatro português. E a propósito da dramaturgia portuguesa da época transmite um “avisado conselho” (sic) de Herculano a propósito dos dramaturgos da época:

“Não seria melhor que estudassem o mundo que os rodeia e que vestissem os filhos da sua imaginação com os trajes da atualidade?”

Não seria melhor?

 

DUARTE IVO CRUZ