CRÓNICAS PLURICULTURAIS
103. GUERRA E PAZ E A REPETIÇÃO DA HISTÓRIA
O pacifismo, ao defender a paz como bem supremo, faz o seu percurso ideológico e político desenvolvendo-se, no seu sentido mais restrito, ao recusar o uso de meios violentos contra toda a criação ou a espécie humana (ecologistas), quer no mais amplo, ao incluir as doutrinas defensoras da conciliação internacional, na base de organizações e de políticas como a SDN, a ONU, a DUDH, a Ostpolitik e o desanuviamento.
Baseia-se numa antropologia tida essencialmente como otimista, onde predomina a paz, tendo como base filosófica a Paz Perpétua de Kant e a ideia de que o homem é naturalmente bom.
É uma ideia culturalmente e espiritualmente revolucionária em termos civilizacionais, que não tem qualquer tipo de reflexo de uma ordem natural das coisas, o que é demonstrado pela repetição da História ao longo dos tempos, não justificando o otimismo excessivo do pacifismo.
Com efeito, ao lado do aprofundamento da globalização, integração regional e aumento da cooperação, materialização e positivação do conceito de complementaridade de ação das organizações internacionais, reapareceram violentas e agressivas afirmações de nacionalismos e violações dos direitos humanos. Algumas das mais recentes nos Balcãs (ex-Jugoslávia), no Ruanda-Burundi e Síria. E, atualmente, com a invasão da Ucrânia, após duas guerras mundiais com epicentro europeu, contrariando quem tinha tal factualidade como uma regressão improvável.
É a antropologia pessimista que tem por fundamento filosófico a teoria de Thomas Hobbes de que o Homem é mau, é um lobo para o Homem, defendida pelos belicistas, dada a inevitabilidade da guerra que acompanha, em permanência, o ser humano, adaptada pelos realistas para quem o Estado é o único ator internacional válido relacionando-se com os outros (Estados) movido pelo interesse nacional, maximizando o poder, se necessário o militar, através da guerra, sendo esta boa se for um meio para atingir os fins.
Tem havido sempre uma repetição da História, quanto a guerra e paz.
O desejável seria nunca haver repetição da guerra, havendo sempre paz.
Movimentos generalizados da opinião pública a favor da paz são louváveis, mas há obstáculos à sua realização, como o terrorismo, tensões religiosas, intolerâncias étnicas, xenofobia, racismo, supremacias imperialistas ou outras, fazendo esquecer os esforços da paz, sem excluir o poder como fim ilimitado, sustentado pelo puro domínio e ganância do poder pelo poder.
É a guerra e paz e a repetição da História.
O que não justifica que nos conformemos com a repetição da guerra, pois a paz é decorrência inelutável do progresso espiritual da Humanidade, árdua tarefa, que vem de há muito, não sendo, para muitos, uma mera utopia.
29.04.22
Joaquim Miguel de Morgado Patrício