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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

TEATROS HISTÓRICOS NO BRASIL

  


Nesta sucessão de evocações e descrições de teatros atuais e teatros históricos de tradição cultural e arquitetónica, recorremos em primeiro lugar a um livro de Luis Norton, editado em 1936, sobre “A Corte de Portugal no Brasil”, assim mesmo denominado.


Trata-se efetivamente de um denso e vasto estudo histórico, amplamente fundamentado em numerosos documentos inéditos, designadamente do Arquivo Histórico do Ministério das Relações Exteriores brasileiro, aí incluindo ou complementando-o com vasta correspondência diplomática relativa às negociações do casamento da Arquiduquesa Dona Leopoldina com D. Pedro de Bragança, como bem sabemos futuro Imperador do Brasil e Rei de Portugal.


Para além do interesse histórico-diplomático em si, o estudo evoca e descreve a realidade cultural do Rio de Janeiro na época, vista tanto no ponto de vista de criatividade, como de atividades diversas e ainda pelo património subjacente. E é extremamente interessante, na perspetiva cultural e de infraestrutura, a referência vasta e devidamente documentada aos teatros e espetáculos, bem como da vida da corte e da cidade.


E mais: quando a Família Real ainda se encontrava no Palácio denominado Real Quinta da Boa Vista, o próprio D. Pedro cantou uma área de ópera, dirigido por Marcos Portugal, a quem se deveu a revisão de musica original ali executada para a Corte. Sobre Marcos Portugal esclarece Luis Norton que “o Rei e toda a Família Real apadrinharam o novo maestro que passara a ser um elemento indispensável na orquestração musical da nova Corte brasileira” (pág. 93).


E mais acrescenta que D. Pedro foi ele próprio compositor de mérito, com obras que se destacaram na época e ainda hoje se destacam: cita designadamente “o Te Deum que foi composto para as suas segundas núpcias, uma ópera em português executada em 1832 no Teatro Italiano de Paris, uma sinfonia para grande orquestra, as músicas para o hino constitucional português e para o hino da independência brasileira” (pág. 95).  


No que respeita a teatros-espaços/edifícios, temos no livro de Luís Norton a descrição detalhada dos festejos da aclamação de D. João VI como Rei de Portugal, ocorridos na Corte então sediada no Palácio do Rio de Janeiro, em fevereiro de 1819. E nesse contexto, o autor refere o Real Teatro do Rio de Janeiro, citando e descrevendo um “painel monumental”, em que figurava a Rainha D. Carlota Joaquina.


E transcreve um curioso documento da época, que se refere a D. Carlota Joaquina “com dois génios coroando-a de louro e sustentando outras tantas coroas de louro, quantas são as Augustas Princesas com que Sua Majestade tem esmaltado o Trono português e que fazem hoje as delícias de duas nações poderosas”, assim mesmo! (pág. 79).


A bibliografia sobre este tema é vastíssima.


Acrescente-se ainda que J. Galante de Sousa refere a existência de mais seis teatros no Rio de Janeiro e mais 11 espalhados pelo imenso território brasileiro, isto ao longo da primeira metade do século XIX. (cfr. “O Teatro no Brasil” ed. Ministério da Educação e Cultura” Rio de Janeiro 1960).


E finalmente, remete-se para o vasto estudo sobre a “História do Teatro Brasileiro”, dirigido por João Roberto Faria, e que precisamente assinala e descreve uma vasta atividade de teatro e de teatros, nesta época, e ao longo da vastíssima extensão do Brasil! (ed. SESCSP e Perspetiva - São Paulo 2012).


E muito mais haveria a dizer sobre este tema!

 

DUARTE IVO CRUZ

 

Obs: Reposição de texto publicado em 22.09.18 neste blogue.

POEMS FROM THE PORTUGUESE

POEMA DE BERNARDO PINTO DE ALMEIDA

  


Teoria Estética

Se pouso a mão sobre a tua pele,
imediatos acidentes acontecem: flores
brotam, inesperadas, terramotos,
incêndios, talvez revoluções,
vertiginosas mudanças do clima, atrasos
nos horários dos transportes, gente
urgente de beijar-se nas ruas. Isso
já vimos: o explodir solar das coisas
certas, a estrada abrir-se ao coração
de tudo no princípio. Isso é a tua pele,
que a mão apenas pousa sente táctil
de paisagem de carne jamais vistas. Por elas
são os teus olhos que regressam, dois
lagos fundos, dois faróis febris
cortando a noite, por muito que Adorno
tenha dito que a poesia lírica já não cabe
no mundo. Se Adorno, ele mesmo,
tivesse tocado na tua pele, desceria
da funda convicção e pediria aos poetas
que dissessem uma outra vez o mundo
tal qual nela recomeça. Árvores nascendo
do milagre tímido do seu estremecer,
rios que correm da fonte assim
teus olhos se levantam. A imensidão
tangente ao mar quando te moves
lenta, ou hesitas, distraída do teu passo. E
uma lua a erguer-se quando falas,
um pouco mais de noite quando partes. Se
pudesse habitar-te, como no declive
de um monte se erguem casas,
ou junto a uma praia sossegada,
um pescador absorto observa o mar,
se soubesse cingir-te tal o orvalho à flor,
pela manhã, ou ao fruto a mão
de uma criança, eu iria por caminhos
apressados, e fazia de ti o meu país. A
terra prometida onde voltar e onde
erguer com tempo a minha casa. Mas
eu olho. Olho em volta e vejo
que não estás. Tudo era só sonhar-te
e despertar é compreender em mim
abrupta a ilusão da fantasia. Levanto
a mão inconvicta para o lado, à procura
na estante sempre fixa da Teoria
Estética. E folheio-a distraído
no mais lírico desgosto de existir.


in Negócios em Ítaca, 2011


Aesthetic Theory

If my hand touches your skin,
instant accidents happen: unexpected
flowers bloom, earthquakes,
fires, revolutions perhaps,
sudden climate changes, delays
in train times, people
urgently kissing in the streets. We’ve
witnessed it: the solar explosion
of precise things, the road opening to the heart
of all beginnings. This is your skin
where my hand, barely touching
it, will feel unknown landscapes of flesh and
from where your eyes come back, two deep
lakes, two restless headlights slicing
the night, regardless of how often Adorno
may have said that lyrical poetry no longer
befits the world. If Adorno himself
had ever touched your skin, he would have climbed down
from his entrenched conviction and asked poets
to tell, once again, the world
that begins in your skin. Trees grow close
to the timid miracle of its tremor,
rivers run from a spring
as you lift your eyes. An immensity
so like the sea when you slowly move, or
when you hesitate, distracted in your pacing. A
moon rises when you speak, and the night
slightly darkens when you leave. If I could
inhabit you like a house perched
on a mountain slope or like a thoughtful
fisherman watching the sea from a quiet shore,
if I knew how to keep you in the morning, as
the flower keeps the dew, or hold you
as a fruit is held in a child’s hand, I would
set off through the hurried ways and settle
in you as in my homeland. The promised
land to which I could return, and where
at length I’d build my house. But I
look. I look around and see
you are not there. It was only the dream of you
and, waking, I realise the abrupt
illusion of fantasy. I raise
my unconvinced hand towards the ever-
lasting bookcase looking for Aesthetic
Theory. I leaf through it, distractedly,
feeling the most lyrical sorrow of being.


© Translated by Ana Hudson, 2010
in Poems from the Portuguese