CRÓNICA DA CULTURA
OBSERVATÓRIO
Era final de setembro. As palavras aconchegavam-se à nova estação e com as mãos no queixo de cada uma, espreitavam a oficina do dentro de onde nasciam.
Logo pela manhã levantara-se um motim fustigado por teimas.
- Eu acabei e tu estás viva! ó palavra que não foi por tua audácia que brilhaste! Antes, insensata, chagaste à tua grande casa e não tinhas criada que te ajudasse na lida, e ainda querias descansos domingueiros e que o teu sétimo dia fosse o teu sétimo céu! Tu que ainda desconheces a tua terra natal! Minha querida palavra, não esqueças que eu acabei, mas sou a tua psique!
- A que ilusão te pegas, palavra abandonada? Julgas que me importa que possas viver rugindo para dentro de mim como um leão em jaula? Não, não me importa, eu, a nova palavra, sou absolutamente surda como o gelo e só me interessam as palavras em que sou compreendida na minha língua. Tu, tu és do século passado, e eu de todos os séculos serei!
- Pois te digo que tudo pode ter passado, que em minha vida já não se ache marca de minha nascença, que todas as casas me sejam alheias e que os templos me não acolham mais, o que me importa? se é setembro e todas seremos uma alameda de folhas caídas, pátria antiga de quando as estações ainda eram o que tu julgas que nelas serás. Eu acabei, sim, mas pobre és tu, que ainda ontem te lavavas em lágrimas de esquecida, e não entendes hoje, que um dia, te cairá a vida como uma antiga moeda.
Era final de setembro. As palavras aconchegavam-se à nova estação, e, com as mãos no queixo de cada uma, espreitavam a oficina do dentro de onde nasciam.
- Amadas minhas, que vos falo de um olimpo, conciliem-se!
Somos todas amantes de onde e aonde o amor se retira e se achega. Somos filhas de reis e cantoras de rua, divinas e vulgares, mas sempre escolhidas umas para as outras.
Olhai que só todas nós, conhecemos o ponto mais profundo quando o ponto se faz ponto e o verso se solta num sorriso,
devagar.
Teresa Bracinha Vieira