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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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A FORÇA DO ATO CRIADOR

  


O Team 10 defende o direito a ser vago.


No texto “Intersecções oblíquas entre o Team 10, a cultura arquitetónica portuguesa e o cinema”, de Pedro Baía (Urbano 2013, 21-39) lê-se que o Team 10 (os participantes mais ativos do grupo foram Peter Smithson, Alison Smithson, Aldo van Eyck, Jaap Bakema, George Candilis, Shadrach Woods, Giancarlo De Carlo) não pretendeu apresentar uma alternativa à Carta de Atenas pelo contrário, mostrou sempre uma aversão a dogmas, a qualquer tipo de doutrinas e a programas de atuação explícitos. Para Pedro Baía, o Team 10 defende o direito a ser vago.


O que significa ser vago para o Team 10?


Vago significa conciliar polaridades em conflito, através de um debate plural, franco e aberto (entre o velho e o novo, entre a vanguarda e a tradição, entre a pequena escala e a grande dimensão, entre a rua fechada e a praça aberta). Vago significa planear alternativas que travem a desumanização e a consequente fragmentação de uma cidade, recuperando necessidades sócio-psicológicas relacionadas com identidade, vizinhança e pertença. Através da definição de clusters - que são modelos orgânicos de crescimento de comunidades - a casa, a rua, o distrito e a cidade poderão ser pensados como um todo. A cidade será assim, para o Team 10, uma teia concreta e aberta, capaz de receber variações e que privilegia a relação, a ligação e o encontro. A mobilidade será o elemento-chave que mantem viva e unida a cidade e que permite a criação de vários centros.


Para o Team 10, uma arquitetura vaga terá o constante interesse em acomodar-se e adaptar-se às experiências e aos desejos reais das pessoas. Sem esquecer a herança moderna, é uma arquitetura composta por uma infinidade de referências e fatores. E por isso evita uma só direção e uma definição muito limitada - afirma-se sempre na pequena escala, na privacidade labiríntica e na imaginação.


Vago significa igualmente, alertar para as questões relacionadas com o contexto, a história, o quotidiano, o vernacular, o espontâneo, a padrões de formas coletivas construídas, o processo participativo, o direito à cidade e a ligação a um lugar específico. O termo ‘ideia’, que substitui ‘norma’ ou ‘diretriz’, remete para algo mais inclusivo, mais apropriável, aberto a interpretações e a derivações.


As ideias do Team 10 são vagas, porque se definem através de programas não escritos, determinam-se através de palavras soltas que gravitam em torno de um centro indefinido. Os processos são privilegiados em detrimento das formas predeterminadas. O espontâneo permite a construção de soluções que recusam a abstração racionalista: “Team 10 is Utopian, but Utopian about the present. Thus their aim is not to theorize but to build, for only through construction can a Utopia of the present be realized”, Alison Smithson, 1968


Vago significa também que as mudanças que o Team 10 propõem não são revolucionárias nem desejam cortar com o estabelecido. Desejam trabalhar com o que existe e ser concebidas em continuidade, numa realidade concreta e específica. O Team 10 anseia por uma arquitetura capaz de despoletar o encontro e o cruzamento espontâneo de pessoas. Uma arquitetura vaga, tal como sugeriu Aldo Van Eyck, cuja noção de tempo e de espaço seja substituída pela ideia de lugar e de momento.


As fotografias das crianças a brincar na rua, utilizadas pelo Team 10 para acompanhar a Urban Re-Identification Grid (apresentada no CIAM IX) é, para Pedro Baía, o melhor exemplo possível para representar relações humanas intangíveis, imprevisíveis e inusitadas. (Urbano 2013, 34) Ora, Aldo van eyck e os seus projetos de parques infantis e o conjunto de fotografias que Nigel Henderson tirou em Bethnal Green, reclamam uma apropriação mais intuitiva da cidade. A perspetiva e a presença da criança na cidade faz acreditar num mundo novo, num mundo inventado, improvisado, mais sociável e flexível. Faz crer numa vida diferente e vaga que se afirma na existência de espaços vazios que recebem diversos significados. A forma destes lugares - vagos, que têm um uso mais ativo, que estão entre, que permitem uma interpretação mais aberta e que se podem até definir em torno da soleira de uma porta - é assim determinada por quem os utiliza. A rua é, por isso, o lugar por excelência do Team 10. A rua representa o real, a vida e o quotidiano. É o elemento da cidade que liga, que une, que permite o contacto e que se deixa apropriar. É a rua que transforma o individual em coletivo, a permanência em mudança, o físico em espiritual, o interior em exterior e a parte no todo.

Ana Ruepp