CRÓNICAS PLURICULTURAIS
123. O ENCONTRO COM NÓS PRÓPRIOS
Desgostosos de nós próprios, há a procura de diversas formas de evasão. Onde o escapismo excede as necessidades vitais em condições normais de saúde física e psíquica, desde a alucinação da velocidade, ao álcool e droga, uma excessiva busca de novidades na alimentação, vestuário, compras, num permanente acompanhamento da moda e do ritmo que nos rodeiam, rumo a uma ilusória compensação.
Num mundo de coisas em que o homem está “coisificado”, também o tempo é uma coisa, dado ser usual dizer que é dinheiro.
E há a fadiga, que se puramente física ou intelectual tem o seu remédio no sono, sendo perigosa se interferir com o repouso, pelo que há que demandar um equilíbrio entre a necessidade premente de travar o andamento impetuoso da vida moderna e a impossibilidade de remar contra a corrente da história.
E o aborrecimento como desejo frustrado de aventuras ou, pelo menos, de incidentes que permitam às vítimas do tédio distinguir um dia dos outros, sendo o seu oposto a agitação.
Sem esquecer o espírito de competição que concebe a existência como uma luta, onde é devido respeito ao vencedor, sendo o trabalho pervertido pelos ideais exaltantes do eclipse dos concorrentes, em que os ócios o são na mesma medida, chegando a ser um aborrecimento o repouso que acalma, restabelece e restaura.
Há que achar o equilíbrio adequado para tornar realizáveis na prática os nossos objetivos, fixando prioridades sem perder o sentido do que é fundamental, que deverá ser o encontro com nós próprios, vencendo o aborrecimento, a fadiga, a monotonia, o tédio, um excessivo e impulsivo espírito de competição.
Interessa o entusiamo silencioso (não o ruidoso e fanático) que nos projeta com alegria para o trabalho, promove a criatividade, o progresso material e espiritual, em contra corrente com o cansaço repetitivo da mesma tarefa, pois uma geração incapaz de suportar e superar o aborrecimento, a monotonia, o tédio, entre outras causas de infelicidade, é um grupo de pessoas medíocres, desligadas do gradual progresso da natureza e da humanidade, que abandonaram os prazeres mais tranquilos da vida em favor da expressão derrotista “matar o tempo” em vez de o viver.
28.10.22
Joaquim M. M. Patrício