CRÓNICAS PLURICULTURAIS
127. A CONSCIÊNCIA DO BEM E DO MAL EM TEMPOS DE ESCURIDÃO
Para além da disciplina, há a consciência em cada ser humano.
Quando entram em conflito, cada um de nós tem liberdade de escolha.
O que é determinante em tempos de trevas, ao ignorar ou ser indiferente à anulação da capacidade de autoquestionamento, alienando a liberdade.
Em favor da tese da disciplina, há o argumento da obediência burocrática, segundo o qual aos funcionários integrados numa estrutura administrativa baseada nos princípios da autoridade absoluta, hierarquização rígida e da dependência acrítica, apenas lhes resta obedecer, retirando-lhes a sua capacidade de livre arbítrio, sendo o burocrata exemplar a primeira vítima, reduzido a uma peça burocrática que facilmente se transforma num instrumento do mal. Para Hannah Arendt: “Um funcionário, quando não é nada mais que um funcionário, é alguém muito perigoso”.
Recorre ao argumento de defesa de Eichmann, no seu julgamento, em Jerusalém, em 1961, quando acusado pelo encaminhamento para a morte de centenas de milhares de judeus, onde foi culpado e condenado.
A ideia de que há pessoas que em circunstâncias excecionais foram obrigadas a ter um estatuto sub-humano, transformando-as em monstros e negando-lhes a sua condição moral, legitimando a sua participação em atos criminosos, não é aceitável se estivermos cientes que são seres conscientes, que distinguem entre o bem e o mal, não podendo invocar a sua fuga e morte moral como justificação, por maioria de razão em crimes contra a humanidade.
Pondo de lado questões pendentes e não resolvidas sobre a ação moral, o juízo e o pensar, qual o pensamento que pode e não pode impedir catástrofes e malefícios quando pensamos, se há algo no pensamento que pode impedir as pessoas de fazer o mal (e incitá-las para o bem), a relação intrínseca que há entre capacidade de pensar e mal (e bem), chegamos a uma encruzilhada em que nos interpelamos: como se comportaria cada um de nós se tivesse vivido naquela época e naquelas circunstâncias?
Mesmo tendo presente, em permanência, que as sociedades se regem pela lei e não pela moral (da época), sendo a norma legal mais redutora, mesmo que se defenda que quem mata outras pessoas tende a estar consciente de que é errado.
É uma temática que ultrapassa o totalitarismo nazi (e soviético, entre outros), interpelando toda a Humanidade, incluindo saber se o Holocausto (e outros crimes ao longo da História) é fruto de uma elite e bando de psicopatas arianos ou também da cumplicidade e indiferença de milhões de seres humanos normais e indispensáveis.
Excluindo a teoria da culpa coletiva, que não aceitamos e é excessiva, sempre houve honrosas e louváveis pessoas que, naquela época e circunstâncias de tempos sombrios e de escuridão, souberam distinguir o bem do mal, sem se agarrarem a ideologias, recusando-se a obedecer a comandos que implicavam a negação da dignidade humana e o direcionamento para a morte dos mais expostos e muitos inocentes.
25.11.22
Joaquim M. M. Patrício