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Blogue do Centro Nacional de Cultura

Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

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Um espaço de encontro e de diálogo, em defesa de uma cultura livre e pluridisciplinar. Estamos certos de que o Centro Nacional de Cultura continuará, como há sete décadas, a dizer que a cultura em Portugal vale a pena!

ACARTE: UM PROJETO PIONEIRO…


Passa no dia 28 de abril o centenário do nascimento de Madalena Perdigão (1923-1989), personalidade marcante quer na Fundação Gulbenkian (desde 1958 no serviço de música), quer nas propostas que fez de valorização do Ensino Artístico e de promoção de uma cultura moderna e aberta. Com uma ação notável, refiro em especial o desafio a que correspondeu brilhantemente no Serviço de Animação, Criação Artística e Educação pela Arte (ACARTE), no Centro de Arte Moderna da Gulbenkian (1984-1989), iniciativa de excecional valor, que correspondeu a um projeto original e ambicioso, baseado na inovação e na interdisciplinaridade, na aproximação entre práticas culturais eruditas e populares, na abertura às artes não ocidentais, no reconhecimento de percursos não académicos de aquisição de competências, na ligação entre teoria e criação artística contemporânea, na aposta em novos olhares críticos, e em novas abordagens da mediação cultural e da educação artística. Para Madalena Perdigão, a Arte é essencial à vida e uma forma imperativa de Educação. Não deve haver, assim, preferências de escolas e correntes estéticas, mas sim abertura e itinerância no país e no exterior, sem preconceitos quanto a géneros artísticos, preenchendo lacunas e recusando duplicações. Tratava-se de agir no Teatro, na Dança, no Cinema, na Música, na Literatura, nas Artes Plásticas e Arquitetura.  Segundo a sua criadora, o objetivo seria dar aos portugueses a visão mais atualizada possível do que se passava em outros países no campo da Arte. Mas, além da informação, cumpriria estimular a criação artís­tica e “animar” os espaços do Cen­tro de Arte Moderna.


A política cultural do ACARTE baseou-se em critérios de qualidade, reclamando-se da possibilidade de correr riscos e de os fazer correr aos seus colaboradores. Era uma política de carácter cosmopolita, capaz de estimular a criatividade dos artistas portugueses. Haveria produções próprias e colaboração com companhias portuguesas ou estrangeiras, promoção de jovens autores e de projetos de pesquisa e de vanguarda. No cinema, referia-se a apresentação de filmes de arte, sessões para crianças e de animação, “ciclos do novíssimo cinema”, além de formação de realizadores de filmes de animação, em colaboração com o Royal College of Art, de Londres. Na Música previam-se concertos informais à hora de almoço para apresentação de jovens intérpretes, concertos de Jazz na Sala Polivalente e no Anfiteatro ao ar livre, séries de concertos de Música Contemporânea, além de bandas e música popular e promoção de jovens compositores. Na Literatura, havia projetos interdisciplinares, palestras, testemunhos de escritores a falar da sua obra, leituras comentadas e exposições biobibliográficas. E nas Artes Plásticas e Arquitetura previa-se a promoção de jovens artistas, projetos interdisciplinares, exposições temáticas e didáticas, manifestações de arte contemporânea e resultados de pesquisas atuais. Deste modo, em coerência com a lição de vida de Calouste Gulbenkian dizia-se: “A Arte não é um produto estável da criação do homem; pelo contrário, a história ensina-nos que a Arte é uma atividade em constante evolução ou transformação e nisso está um dos motivos do seu grande interesse”. Como se disse na última edição dos Encontros ACARTE em vida de Madalena (1989): “Ser-se europeu quer dizer respeitar os direitos da pessoa humana, respeitar e lutar pela democracia, a qual, como sublinha Edgar Morin, se tornou o caráter político comum e distintivo da Europa”. Assim, “a nova consciência europeia reside na consciência de uma comunidade de destino (…). Ninguém pretende uma Europa cinzenta, igualizada, mas sim um continente plurifacetado, rico da diversidade das culturas dos seus vários países, que cruzarão experiências e as confrontarão, como meios de se enriquecerem reciprocamente através das suas próprias diferenças”. Inesquecível exemplo de coragem e pioneirismo!


GOM